Nada como um “faria limer” diferente, zootecnista, que já calculou cotação do boi gordo em pequenas cidades do interior do Brasil para, agora, na gigante financeira XP, analisar o futuro das empresas do agro na bolsa.
Leonardo Alencar, hoje head de agro, alimentos e bebidas da XP, é um dos analistas mais respeitados pelos executivos das grandes empresas do agronegócio. Quando ele faz uma pergunta durante um encontro com investidores, é ouvido com atenção e respondido com o maior número de detalhes possível. Afinal, é o time dele que depois vai esmiuçar os números das companhias abertas e avaliar as perspectivas futuras para as ações das empresas, mas não apenas com simples cálculos que qualquer profissional da área financeira seria capaz de arriscar.
No caso de Alencar, ele sabe reconhecer uma pastagem de qualidade, percebe quando uma condição climática pode afetar mais ou menos a produtividade de uma lavoura, e assim é capaz de cruzar seu conhecimento na agropecuária "raiz” com o mundo financeiro do agro, que hoje faz parte do seu dia a dia.
"Eu sou um apaixonado pelo agro”, disse Alencar. Ele começou a carreira na Scot, uma consultoria que também gera indicadores de preços, principalmente para a pecuária. Passou por diferentes empresas e há 3 anos voltou para a XP. "Vim para cobrir alimentos e bebidas, mas logo começamos a olhar para o agro, a equipe assumiu um papel de liderança no setor, costumamos dizer que somos long eterno, eternamente comprados no agro”. Ele diz que se orgulha de ver o setor ganhando relevância no mercado de capitais.
Como o Ano Novo se aproxima, o AgFeed buscou saber quais são as expectativas de Leonardo Alencar para o segmento, considerando o cenário difícil do ano que termina e a boa dose de incertezas que costuma pairar sobre o campo, enquanto a colheita não ganha ritmo.
Nesta entrevista exclusiva, o head de Agro da XP se mostrou otimistas com 3 entre as 4 maiores empresas de proteína animal listadas na B3. Fez ressalvas sobre a Marfrig, porque está bastante preocupado com as operações nos Estados Unidos.
De outro lado, mostrou também um sinal amarelo para as empresas diretamente ligadas ao desempenho das safras de soja e milho, como SLC Agrícola e BrasilAgro.
Na opinião do analista, a safra realmente deve ser menor que o esperado, “mas o mercado não está levando em conta fatores como os altos estoques nesta virada".
Confira os principais trechos da entrevista de Leonardo Alencar, ao AgFeed.
Como você avalia a presença do setor agro na bolsa brasileira?
O agro fora da bolsa ainda é muito maior do que o agro na bolsa. No PIB brasileiro o setor representa quase 30%, mas na bolsa é 5% somente. Portanto, apesar de terem ocorrido diversos IPOs, de empresas de segmentos diferentes do agronegócio, o que é um ponto muito interessante, ainda assim é muito incipiente, esse processo deveria continuar por mais um tempo. Saiu de alguns produtores, como por exemplo, uma São Martinho, focada em etanol, SLC e BrasilAgro, focadas na parte de produção agrícola, para players que não são produtores, que são as vezes até mais sazonais, mas menos cíclicos.
Como assim?
Esse ciclo é algo que sempre foi mal visto pelo investidor. Tem épocas que ele olha para o agro, em outras não. Começamos a observar um certo amadurecimento do investidor do agro. Ele começa a ver que tirando as empresas produtoras, que são muito cíclicas, o restante é muito resiliente. Então, apesar do agro ser cíclico, a curva de adoção de tecnologia é uma coisa que continua. Essas empresas prestadoras de serviço ao agro, estão mostrando essa certa resiliência e diversos assets, inclusive, perceberam que ter uma exposição ao agro é um pouco mais defensivo do que parecia de início. Antes era visto como muito cíclico, sazonal, mas também é defensivo.
Por que?
Em épocas que a economia começa a piorar e aí o câmbio desvaloriza, o fato de o agro brasileiro ser exportador, ele acaba melhorando essas condições. É a mesma coisa com os frigoríficos. Às vezes, em ano de crise, o poder de compra do brasileiro cai. Mas as empresas são exportadoras. Com a crise, o câmbio começa a desvalorizar, exporta mais, ele começa a arbitrar essa condição. Então acho que isso acabou ficando mais evidente nos últimos anos, que o agro, além de resiliente, ele acaba sendo defensivo em diversos momentos. Nessa loucura que teve de varejo, em outros setores como real state, tem muito setor que realmente foi uma loucura, né? E o agro teve como manter um pouco mais constante seus resultados.
Você acredita que o agro pode crescer na bolsa em 2024, levando em conta IPOs ou mesmo valorização das ações?
Em valorização, sim. A sinalização que temos, tirando os produtores de grãos como SLC e BrasilAgro, onde estamos um pouco mais conservadores na leitura, em todo o restante a gente acha que tem potencial de alta. Melhora o cenário para 3Tentos, para Boa Safra (Sementes), para a Vittia. O setor de açúcar e etanol está muito bem, então melhora o cenário para produtores de cana-de-açúcar. De maneira geral, o agro deve continuar a valorização para 2024 e ganhar valor na bolsa.
E os IPOs?
Quanto a ter IPO, acho que ainda precisamos de mais previsibilidade para pensar nisso. Não é só uma questão de apetite de investidor. Eles vão voltar a ter captação quando a economia se estabilizar, quando as pessoas voltarem a ter um pouco mais de de conforto e conseguir aportar mais valor para investimento. A curva de juros caindo é uma boa sinalização que começa a aliviar e incentivar a saída do dinheiro de renda fixa para ativos de perfil de risco um pouco maior, mais de renda variável. Aí começa a ter um pouco mais de aporte. As ações começam a receber mais dinheiro, começam a buscar novas oportunidades e aí sim, pode ser que apareça.
As condições estruturais estão adequadas?
Acho que ainda falta um pouco de previsibilidade. Teve a votação da reforma tributária. Mas o Brasil está num processo bem crítico de mudanças estruturais que precisam acontecer, mas que falta clareza. Fica difícil fazer conta. Nem as empresas têm 100% de clareza do impacto que isso vai ter. Isso acaba prejudicando qualquer sonho de IPO.
Será um processo demorado?
No caso da reforma tributária, são passos que vão demorar realmente dez anos de transição de uma medida para outra. Um esforço tão grande dentro da empresa que às vezes ela não vai continuar num esforço de abrir o capital, porque é um esforço grande também. Eu acho que sim, 2024 com certeza está mais próximo dessa janela de IPOs, mas não está claro, no primeiro semestre provavelmente não. Talvez no segundo semestre.
Que outros movimentos são esperados?
O que começa a acontecer esse ano são as operações no mercado de capitais que não sejam IPOs. O aumento de capital, por exemplo, teve diversos, mas por motivos diferentes. O aumento de capital de uma empresa que está muito positiva para investimentos, isso deve voltar. Varias empresas fizeram esse ano e deve continuar em 2024, assim como mais emissão de CRA. Essa construção dos fiagros acho que continua também, mas IPO, realmente, abertura de capital, é mais para o segundo semestre, com uma clareza.
Pode ser que outros setores então venham antes do agro?
Tem nomes bons de empresas que chegaram muito próximo de fazer IPO e estão preparadas. Mas concordo que tem outros setores que talvez estejam mais maduros, que não tem essa questão cíclica, não tem essa volatilidade toda. Agora, o agro tem bons nomes e costumam ser empresas sólidas, grandes, que só não é familiar ao mercado. É diferente. As vezes você tem empresas muito conhecidas do público consumidor, do varejo, por exemplo, mas são empresas menores. Já o agro tem empresas muito grandes que ninguém nunca ouviu falar.
Quando o cenário estiver mais tranquilo, quais setores você acredita que devem chegar primeiro?
Tem um player que é a São Salvador, que não fez o IPO, mas é uma empresa sólida, está no segmento de frango, que já é um segmento bastante conhecido, que está num processo de recuperação bem estrutural. Acho que São Salvador talvez seja interessante. Existem dois players de açúcar e etanol também muito bons que podem continuar o processo de IPO. E tem outras empresas do agro, como a Caramuru, que tem não só a marca para o varejo de alguns produtos, mas também exportação de farelo de alto valor proteico, com terminal fluvial, muita coisa na operação. Tem bastante coisa interessante.
Olhando para os subsetores do agro, queria que comentasse como está vendo o cenário em 2024, primeiramente, para o açúcar e etanol.
Estou enxergando um cenário positivo do lado do açúcar. O preço caiu bastante no início de dezembro, aparentemente um movimento muito mais especulativo. Essa notícia de que a Índia eventualmente vai deixar de estimular o etanol de cana por conta de uma preocupação com a produção de açúcar, mesmo tendo quebra de produtividade lá. Mas são efeitos muito de curtíssimo prazo, provavelmente o açúcar deve voltar a subir no começo de 2024, portanto, para o açúcar está muito positivo.
E o etanol?
O etanol ainda está frustrando muitas expectativas. A produção está indo muito bem, a produtividade está melhorando, isso ajuda bastante. E tem diminuição de custos com fertilizantes, além do diesel que também está mais baixo. Então a expectativa é que margens sejam melhores em 2024 do que em 2023. Isso conduziria, então, a performance das ações positivas.
Outro grupo importante do agro na bolsa são as empresas de proteína animal, como frigoríficos e indústrias de alimentos. Como deve ser o ano para elas?
Neste setor, temos que ver caso a caso. A Marfrig é a única que está com recomendação neutra (pela XP), as outas têm recomendação de compra. Acreditamos que os players que estão expostos nos Estados Unidos vão ter um ano de 2024 bem desafiador. Quem está exposto no Brasil ou América do Sul vai ter um ano bem melhor. Essa é uma leitura mais macro. Portanto, para a JBS, a operação de carne bovina nos Estados Unidos vai ser bem desafiadora em 2024 e também nos anos de 2025 e 2026. A área de suínos também vai ser desafiadora. Melhorou muito no curtíssimo prazo, mas ainda deve piorar a margem para frente de frango também. Tem aí alguns desafios grandes da América do Norte para a JBS. E, no caso da Marfrig, são desafios grandes na parte de carne bovina. Para a JBS, você tem melhora na Seara, melhora na JBS Brasil, na Austrália, o que compensa em grande parte. Achamos até que o saldo de 2024 é melhor que 2023, pela diversificação da JBS. Para a Marfrig, não, 2024 deve ser pior que 2023 por conta do peso da operação dos Estados Unidos. E vai ser uma operação com resultado pior do que 23. Essa é a nossa leitura.
E quanto a Minerva e BRF?
A Minerva, se a gente esquecer a compra das fábricas da Marfrig, ela deve entregar um 2024 melhor que 2023, porque a América do Sul está indo muito bem. O Paraguai deve melhorar um pouco mais, o Uruguai deve melhorar um pouco também pela virada de ciclo. Na Argentina, a desvalorização cambial tende a ser positiva. Mas principalmente por conta de Brasil, que está num ciclo pecuário favorável. Para considerar as fábricas da Marfrig que a Minerva quer comprar, aí depende um pouco do Cade, de quando ele vai aprovar, se ele vai aprovar a tempo da Minerva capturar o efeito do ciclo pecuário favorável de 2024. Mas ainda assim, 2024 vai ser um ano melhor do que 2023.
A BRF tem situação semelhante?
Na BRF, é onde estamos mais otimistas. A empresa teve um 2023 muito ruim. É um começo de ano ainda com resultado muito fraco. Ela praticamente entregou R$ 1,6 bilhão (de Ebitda) no primeiro semestre. No terceiro trimestre ficou R$ 1,2 bilhão. Ela precisa mostrar a diferença de resultado e deve entregar talvez R$ 1,7 ou R$ 1,8 bilhão no quarto trimestre. Já vai ter ganho no trimestre maior do que entregou no primeiro semestre inteiro. Ela está num processo de reconstrução e recuperação de resultados. A BRF é onde estamos mais otimistas hoje. Gostamos dos outros nomes, mas Minerva depende muito dessa questão do Cade aprovar e quando aprovar, de como vai ser o processo de operação nas fábricas da Marfrig. JBS muito em volta dessa questão dos Estados Unidos, mesmo que a diversificação ainda ajude, mas Marfrig estamos mais pessimistas. De fato, 2024 deve ser melhor que 23 para todas, menos para a Marfrig.
Esse ano também foi marcado pela preocupação com as revendas de insumos, como no caso da AgroGalaxy. O que esperar neste caso?
Sim, 2023 foi um ano bem crítico para as revendas agrícolas. Eu acho que a AgroGalaxy ficou muito no centro das atenções, porque antigamente muita coisa acontecia no setor de revendas que a gente nunca ficava sabendo. Agora tem CRA para todos os lados, tem Fiagro, enfim, o produtor tem mais acesso ao investidor, e se sabe de tudo o que estava acontecendo, isso causou muito ruído. Mas foi um ano desafiador. Um ano que começou com muitos estoques, tiveram que vender com margens negativas, em algumas linhas, renegociar com os fornecedores.
Em 2024 a situação estará equacionada?
O ano de 2024 com certeza vai ser um ano melhor do que 23 para as revendas agrícolas. Agora o problema é provavelmente essa condição de estoque vai continuar desafiadora até o final do primeiro semestre de 2024. A compra de insumos para plantio de soja já foi e frustrou um pouquinho as expectativas. A compra de insumos para o milho safrinha está muito atrasada. Se ela tivesse andando, talvez estivesse um pouco mais confortável com essa leitura de recuperação. Agora que o milho subiu um pouco mais e o produtor começou a comprar insumos para a safrinha, até começa a ficar um pouco mais confortável com essa leitura de que a situação deve se resolver até o final do primeiro semestre de 2024. Portanto, será um ano melhor que 2023, ainda assim não vai ser um ano excelente.
E há outras consequências?
O produtor vai manter investimento em tecnologia. Ele vai continuar comprando fertilizantes, químicos, sementes, mas talvez eles tenham que digerir uma inadimplência maior do que estão habituados, tanto em 23 quanto em 24. É um processo de consolidação no setor todo, então talvez apareçam boas oportunidades para quem quiser comprar. E aqui temos até uma crítica. Agente consolidador é aquele que consolida em qualquer ambiente. Estava com dinheiro em caixa, começou a comprar outros players, começou a subir um pouco múltiplo, eles pararam de comprar. Na hora que o mercado piorou, em que eles deveriam estar acelerando as compras, eles também estavam ruins, não conseguiam comprar. Então, não esperamos a abertura de lojas em 2024 da AgroGalaxy, especificamente. Sem a abertura de loja em 24, talvez não estejam com caixa para poder fazer aquisições. Vai ser um ano ainda para esperar um processo de reconstrução de margens na operação deles, o que demora um pouco mais.
Outra empresa que presta serviços ao agricultor, é a 3tentos. Como a XP está vendo o momento da empresa?
Como a 3tentos tem mais operações, o biodiesel, por exemplo, deve ajudar muito mais a empresa. As safras grandes ajudam bem na operação de grãos. Pode ser que a revenda agrícola, em função das operações do Sul, por conta da recuperação de safra no Sul, melhore o consolidado. Na comparação com a AgroGalaxy, ela está mais exposta ao Sul, por isso sofreu mais nos últimos anos. Mas ela é bem mais diversificada, então está numa condição melhor.
As ações da AgroGalaxy podem voltar aos patamares pré-crise?
Acho que ainda demora, 2024 é um ano ainda de olhar para dentro. Não sei se tanto mais em enxugar custos, mas ser muito criterioso no crescimento para o ano, para estar numa condição financeira confortável. Olhar para 25 e eventualmente voltar a falar de abrir lojas. Nem o Welles (Pascoal, CEO da AgroGalaxy) fala ainda de abertura de lojas para 2025, porque eles não têm essa clareza ainda.
Mas vocês consideram a empresa uma boa opção de investimento?
Nós temos uma recomendação de compra para a AgroGalaxy, porque quando a gente olha a operação, mesmo nesse cenário todo, enxergamos que ela está muito descontada. O mercado está precificando margens piores ou uma demora muito maior de reconstrução de margens do que a gente está esperando. E por que temos essa leitura? Tem upside no preço da AgroGalaxy. Mas não é o papel que temos a maior convicção para 2024.
Quais são as maiores convicções?
As nossas duas maiores convicções para 2024 por enquanto são BRF e São Martinho. A BRF é por todo esse cenário de grãos mais baratos, oferta de frango menor, o setor está bem mais racional na parte de produção de pintinhos, melhora na demanda de carne de frango. O quarto trimestre deve ser positivo. A queda na produção dos Estados Unidos vai ajudar bastante o Brasil. Estamos muito construtivos na operação de frango da BRF. Na São Martinho é por conta do açúcar e queda nos custos, com aumento de produtividade. Essas são as duas convicções maiores, as "top stock picks" como a gente fala.
E quais os destaques negativos?
Marfrig temos recomendação neutra. SLC e BrasilAgro também, que são dois produtores de grãos. Ainda que eles possam ter margens em 24 melhores do que as margens de 23, acho que muito disso está precificado e não dá para esperar uma melhora tão significativa assim dos papéis, porque é um ano ainda desafiador. A nossa leitura de grãos é um pouco mais baixista do que o mercado. Estamos escutando muito sobre replantio, quebra de produtividade e redução da área de safrinha. Mas a gente vai virar o ano com estoque. Acho que isso o mercado não está olhando.
O que precisa ser visto com mais atenção?
Quando se olha os números da Conab a conta não fecha, deveria ter até 3 milhões de toneladas a mais. Tem mais estoque, na verdade, na virada do ano, do que está sendo considerado. A cooperativa Coamo, por exemplo, soltou comunicados, está com muito mais estoque do que o habitual. As tradings para 2024 estão travando as vezes a logística, mas não estão comprando grãos porque sabem que vai vir grãos. Nesse cenário, por mais que as margens podem ser até um pouco melhores do que estavam sendo desenhadas, ainda não é um ano bom para produtor de grãos. Portanto, essas três empresas são as que tem recomendação neutra. Tem outros que a gente tem recomendação de compra, mas que têm perfil de risco maior.
Por exemplo?
Uma é a Raízen. Sem dúvida nenhuma tem upside no papel da Raízen, mas é um perfil de risco diferente. Tem açúcar e etanol de um lado, tem distribuições de combustíveis, do outro. Tem a segunda geração, é um case diferente. Então, nas convicções, BRF e São Martinho. No neutro, temos Marfrig, SLC e BrasilAgro. No meio disso tem bastante coisa para discutir.
Há outros setores do agro na bolsa como sementes e biológicos, o que pode nos dizer sobre estas empresas?
Sim, a Vittia e a Boa Safra são os dois papéis mais diferentes. A Vittia tem essa questão do processo de adoção da tecnologia de biológicos, que é um pouco diferente. Não é todo produtor que já entra nesse segmento. Ele tem que ter um nível de tecnologia um pouco mais alto. E ela andou frustrando as expectativas ao longo desse ano. Talvez porque o clima para o produtor foi um pouco mais desafiador. Ele atrasou algumas compras e 23 vai ser um ano que vai frustrar as expectativas para quem é investidor da Vittia. Eu acho que a performance do papel mostra um pouco disso. Em 2024, deve ser um ano melhor que 23, mas ainda estamos na expectativa de qual vai ser a velocidade dessa recuperação.
Boa Safra não sofre com a conjuntura de grãos como SLC e BrasilAgro?
No caso da Boa Safra, estamos bem otimistas. Foi uma surpresa esse ano. Esperávamos que a queda no preço da soja talvez puxasse para baixo também o preço da semente de soja. Mas o produtor não quis sacrificar essa ponta de tecnologia. Ele continuou comprando sementes de soja de alta tecnologia e o preço da semente se segurou num patamar muito interessante. Então foi uma surpresa positiva. Eles estão entregando um crescimento previsto, com margens razoáveis. No processo de adoção de tecnologia, a semente está indo muito bem, ocupando mais espaço, inclusive do bolso do produtor. Eles estão crescendo na parte de soja, fizeram aquela aquisição na área de milho também, então tem um crescimento muito interessante. Entraram emn feijão, trigo, em forrageira, entraram em sorgo, já são grandes em todas as culturas, São margens melhores nessas culturas do que na operação de soja. Estão indo muito bem, então a execução acaba sendo um ponto muito positivo. O crescimento que eles entregam, raramente visto na bolsa, é muito acelerado, com margens razoáveis. Não é uma margem de produtor, mas é uma margem um pouco melhor do que a do produtor. E não cíclico, a princípio.
Já ouvimos de grandes produtores rurais que a Faria Lima não sabe precificar bem o setor. Um exemplo seria a diferença entre o preço real das terras e aquele que é considerado na análise de empresas que possuem fazendas. Qual tua opinião?
Quando olhamos, por exemplo, o preço das terras vendidas pela BrasilAgro, acho que aquilo ali é uma leitura muito melhor do que é precificação de terra do que considerar inflação de terra. Acho que o grande problema de terra no Brasil é que a gente coloca inflação, mas toda vez que tem um evento de venda de terras, percebe que a inflação não é um bom indicador de preço de terra. Não temos um mapeamento muito bom de terras no Brasil, porque não é um mercado tão líquido e você fica muito nos indexadores, como o arrendamento, que é 16 sacas de soja, a venda de terra, são 300 sacas de soja. Foi o que aconteceu. A saca de soja subiu de R$ 100 para quase R$ 180 e aquelas 300 sacas jogaram o valor da terra na Lua. Quando caiu o preço da saca de soja, aí o produtor vem negociar, não em saca de soja, ele vem negociar em preço de terra. É um mercado que não é muito transparente e que não é nada líquido.
Por que isso acontece?
Temos poucas informações reais do que acontece. Se for pegar um arrendamento, é 3%, 4% ao ano, não foge muito disso, é o que os dados da Terra Santa, por exemplo, indicam. Então eu concordo que não é precificado da maneira correta, é difícil precificar da maneira correta porque não tem informação suficiente para poder fazer isso. Mas se a gente pegar a BrasilAgro como referência, que é um player que compra e vende terra e pegar os valores de terras que realmente tem entregues, é evidente que a inflação não é um indicador correto para precificação de terra. Quem sabe o preço é quem está com o pé no campo e sabe o valor agronômico daquela terra. Se é uma terra de soja, de algodão, de pecuária de baixa produtividade, pastagem degradada. São mundos muito diferentes. Agora tem também a questão ambiental, se tem licença ou não, quanto tempo leva. Mas não é o mercado financeiro, é o mercado todo que sofre com isso. Se a gente tivesse mais players de produtores na bolsa, teria mais informação confiável.