Roberto Motta mantém a calculadora ao alcance das mãos. E recorre a ela sempre que precisa buscar os números para apoiar as palavras. O presidente da Agro Amazônia, afinal, é um homem de negócios.
Um dado, porém, ele cita sem a ajuda do aparelho, de tantas vezes que já fez. “O mundo cresce na ordem líquida de 200 mil pessoas ao dia”, diz. “Já fiz essa conta, basta pegar a previsão de termos 10 bilhões de população em 2050 e dividir pelo tempo que falta até chegarmos até lá”.
O número lhe dá uma convicção: “O agronegócio não tem erro. Teremos de produzir alimentos para todos eles, não tem jeito de dar errado”.
E essa certeza se reflete nas decisões do executivo para a empresa, assim como nas dos sócios controladores da Agro Amazônia, os japoneses da Sumitomo Corporation, um conglomerado com mais de 900 empresas espalhadas pelo planeta. “Eles não olham para o hoje, mas para o futuro”, diz Motta.
Como isso se reflete no presente da Agro Amazônia, potência do setor de distribuição de insumos agropecuários com sede em Cuiabá (MT), 63 lojas em 9 estados e receita de R$ 5,6 bilhões em 2022?
Em mais investimento em um momento em que a maioria dos concorrentes, abalados pela uma combinação de retração de preços e negócios, coloca planos de expansão na geladeira.
“Não estamos parando nada”, sentencia Motta, calculadora à mão. Com a previsão de fechar 2023 –em que comemora os 40 anos de fundação – com faturamento de R$ 6 bilhões, projeta um crescimento de 7,1% em um ano em que o mercado de insumos, na melhor das hipóteses, vai andar de lado. E ainda acha pouco. “Não é tanto”, diz.
Justifica com mais contas. Em 2018, primeiro exercício integralmente sob controle da Sumitomo, a empresa vendeu R$ 1,32 bilhão. Assim, no “oceano azul” dos últimos quatro anos a empresa cresceu nada menos que 4,24 vezes.
A diferença de 2023 é que o crescimento virá de forma menos orgânica, ou “a fórceps”, como diz Motta. E começa a calcular. Com preços dos insumos agrícolas – principal fonte de receita da companhia – em queda brusca, aumentar as vendas significa ampliar ainda mais os volumes comercializados.
O campeão de vendas glifosato, por exemplo, hoje é negociado a um terço do valor do ano passado. “Ou seja, pra fazer o mesmo resultado temos de vender o triplo”. Fertilizantes tiveram queda de 40%. “Temos de vender pelo menos 40% a mais” em volume”.
E tudo isso em um período de produtores menos capitalizados e mais preocupados com as cotações em baixa das principais commodities agrícolas, assim como do boi gordo.
“Sabíamos que esse momento viria, mas chegou antes do que esperávamos”, diz o executivo. A previsão, diz, é que houvesse uma desaceleração lenta, sobretudo a partir de 2023, mas já no final de 2022 o mercado virou.
Renegociação e apoio japonês
Motta reconhece o cenário desfavorável, mas não se abala. Segundo ele, a exemplo do que aconteceu com outras empresas do setor, a Agro Amazônia sentiu a retração nas encomendas em um momento em que os estoques estavam abarrotados.
Mas agiu rápido, enquanto ainda havia alguma demanda, e foi agressivo nas negociações com fornecedores e clientes, reduzindo margens e conseguindo “desovar” o excedente. “Tínhamos gordura para queimar”, afirma.
Prova disso é que, mesmo diante desse aperto no último trimestre, a Agro Amazônia fechou o ano fiscal 2022 – que se encerrou em março de 2023 – como “o melhor da história”, segundo Motta.
Um dos trunfos da Agro Amazônia nos últimos anos tem sido o suporte da Sumitomo. Com recursos do grupo japonês, a empresa tem se diferenciado da concorrência ao adquirir à vista grande parte dos insumos que comercializa em suas lojas. Isso lhe traz melhores condições de negociação junto a fornecedores.
Na frente do crédito aos clientes, os parceiros mais fortes também vêm do Japão. A própria Sumitomo, através do banco SMBC, e o banco MUFG, ligado à Mitsubishi, lideram o financiamento das vendas.
O barter e a compra com grãos, feito em parceria com grandes tradings, respondem por apenas 15% dos negócios, um índice bem inferior ao dos concorrentes. “Queremos aumentar, até porque é uma forma de reduzir inadimplência”, diz Motta. “Mas queremos fazer com cuidado, porque também há riscos se houver excesso de grãos na nossa mão”.
Sinal amarelo
É justamente na inadimplência que a Agro Amazônia enxerga um “sinal amarelo” atualmente. Hoje, a taxa, que andava abaixo de 1% nos últimos anos, saltou para cerca de 7%.
Entra a calculadora em ação para demonstrar que a preocupação, embora exista, é moderada. Motta recorre aos custos de produção estimados pelo Instituto Matogrossense de economia Agropecuária (Imea) para indicar que o índice de hoje reflete o descasamento da safra passada, plantada com insumos em patamares altos e colhida com commodities em baixa.
Em 2022, o Imea indicava um custo de R$ 4,45 mil para o cultivo de um hectare de soja, que na ocasião era vendida por R$ 150 a saca. “Quem vendeu a esse preço, produziu a 30 sacas por hectare”, calcula Motta. “Mas quem esperou e está vendendo a R$ 110, terá gastado mais de 40 sacas por hectare. Quem segurou é que está em dificuldade”.
Já para a safra 2023/24, com os insumos bem mais baratos, o custo de produção está estimado em R$ 3,1 mil. Mesmo com a soja no patamar atual, a conta volta para o patamar histórico de 30 sacas por hectare. “Isso é um custo confortável para o agricultor, já que a média de produtividade no estado é de 62 sacas por hectares”, afirma.
A conta dos investimentos
As contas têm sido feitas também nas discussões do plano estratégico para os próximos cinco anos da Agro Amazônia, que acontecem nesse momento. Motta adianta que não haverá revisão para baixo em relação ao que já vinha sido feito.
Muito pelo contrário, há novos investimentos em vista. O crescimento orgânico através da abertura de novas lojas, por exemplo, prevê uma aceleração. Foram seis em 2022. Serão oito ainda em 2023, o que deve elevar o número de unidades para 71. E dez em 2024, com a previsão de superar 90 filiais em 2025.
Somente para o ano que vem, a previsão é investir entre R$ 30 e R$ 40 milhões nesses novos endereços. Isso, sem contar alguma eventual aquisição.
Crescer através da compra de concorrentes é algo novo na estratégia da Agro Amazônia. A primeira operação desse tipo foi concluída no início deste ano, com a incorporação da Nativa, rede com sede em Pato de Minas (MG) e com oito lojas nas regiões do Alto Parnaíba e Triângulo Mineiro.
Motta admite que, em meio ao cenário de dificuldades enfrentadas por outras redes, foi procurado por concorrentes com propostas de vendas de algumas lojas. A Agro Amazônia tem sido constantemente citada no mercado como uma potencial compradora – e o executivo não desmente.
Segundo ele, as aquisições podem ser usadas para a expansão para regiões ainda não atendidas pela empresa, como Sul e Sudeste, também como parte do planejamento de atuar em 12 estados “em um curto espaço de tempo, até 2025”.
Fábricas e silos
O investimento mais “pesado” será na construção da primeira indústria de beneficiamento de sementes do grupo, que deve ficar em torno de R$ 150 milhões, com previsão de entrega em um ano.
A Agro Amazônia já atua no segmento com a marca própria Dagma, em parceria com o Grupo Don Mario (GDM), além da venda de marcas de terceiros. Hoje, a comercialização está na casa de 2 milhões de sacas anuais.
A nova unidade, no Triângulo Mineiro, deve produzir, na primeira fase, 500 mil sacas. Até 2027, com a conclusão da segunda fase, serão 1 milhão.
Em fase de cotação junto a potenciais fornecedores está a construção de uma rede de silos próprios, para permitir justamente a ampliação de negócios envolvendo originação de grãos nas negociações de insumos.
Já em Cuiabá está sendo erguido um novo centro de distribuição – feita por uma empresa parceira, com contrato de locação à Agro Amazônia –, que deve atender a outro ponto crucial no crescimento: a logística. Serão 13,5 mil metros quadrados, sendo 7 mil para armazenar insumos e o restante para sementes, em ambiente com controle de temperatura.
“O CD será o pulmão da nossa logística”, afirma Motta. “Mas não abriremos mão de manter um armazém junto a cada filial. Nossa visão é de que precisamos ter o produto sempre disponível ao produtor para pronta entrega. O agro não pode esperar”.