Registro (SP) - Ainda nos anos 2000, o engenheiro agrônomo Renato Benatti cursava pós-graduação na Esalq/USP com um sonho e uma ideia na cabeça.
Em uma conversa com o professor Luis Prochnow, uma das maiores referências em fertilizantes no país, Benatti arriscou uma provocação: “Professor, o modelo de fertilizante fosfatado tem um erro.”
“Ele quase me bateu na época”, brinca Benatti. “E me respondeu que as coisas que deram certo por aqui foram justamente as que o Brasil descontinuou.”
Mas a ideia do agrônomo, de trazer produtos mais inovadores no mercado, não morreu. E foi com essa obstinação que ele fundou a Hinove Fertilizantes Especiais em Araraquara (SP), em 2011, ao lado de Roberto Martins, executivo com passagens por empresas como Louis Dreyfus Company, Sucden e Agrinvest.
“Fundei a Hinove porque [pensei:] ‘Quero fazer um fósforo diferenciado.”, resume Benatti.
O que talvez o executivo não imaginasse é que a sua empresa, que começou com um faturamento de modestos R$ 3 milhões no primeiro ano, multiplicaria esse valor centenas de vezes em pouco mais de uma década: a Hinove pretende encerrar este ano com receitas de R$ 1,2 bilhão e ir além, atingindo R$ 5 bilhões em receitas já em 2030.
"Foi uma escadinha. Fomos dobrando, dobrando, e nos últimos cinco anos, quintuplicamos a emrpesa de tamanho", diz Benatti.
"Esse ano vai ser o nosso primeiro em que a gente está faturando já acima de R$ 1 bilhão. E nós temos uma projeção de, nos próximos cinco anos, estarmos entre as cinco maiores do país", resume Benatti, que conversou com o AgFeed em uma visita de jornalistas à unidade da empresa em Registro (SP), com apoio da iniciativa Nutrientes para a Vida.
A Hinove produz fertilizantes especiais sólidos, líquidos e misturados, mercado que tem crescido a passos largos ao longo dos últimos anos em comparação com o mercado tradicional de fertilizantes.
Inicialmente, entre 2011 e 2019, a empresa terceirizava sua produção. Isso mudou após a instalação das primeiras plantas nos estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, a partir do fim da década passada.
Hoje, são três plantas, localizadas em Guará (SP), Registro (SP) e Rio Brilhante (MS). Somadas, essas unidades têm capacidade nominal de produzir 1 milhão de toneladas de produtos e já consumiram cerca de R$ 350 milhões em investimentos nos últimos seis anos.
Nos próximos anos, a ideia da Hinove é investir mais R$ 300 milhões em ampliações nas unidades de Registro e Guará para que a empresa consiga alcançar uma capacidade de 2,2 milhões de toneladas em cinco anos.
A primeira das unidades, a de Rio Brilhante, foi inaugurada em 2019. Antes disso, a Hinove criava a formulação dos produtos e terceirizava a fabricação. A unidade sul-matogrossense fabrica fertilizantes sólidos e líquidos e deve chegar a uma capacidade de produção de 654 mil toneladas de produto em brreve.
Também em 2019, entrou em operação a unidade de Registro (SP), dedicada à produção de fertilizantes floculados e granulados, que deve chegar a uma capacidade produtiva total de 372 mil toneladas no futuro.
A maior planta da empresa, no entanto, fica em Guará (SP). A estrutura, que pertencia anteriormente à Mosaic, ficou hibernado entre 2015 e 2022, até ser adquirida e reativada pela Hinove há dois anos.
Desde então, a unidade recebeu R$ 150 milhões em investimentos. Nos próximos anos, deverá estar produzindo 534 mil toneladas de fertilizantes sólidos, 376 mil de fertilizante granulados e 300 mil de fertilizantes líquidos.
“É uma planta gigantesca, e o nosso objetivo é fazer dela a unidade de fertilizantes especiais mais completa das Américas”, afirma Benatti.
Por trás da expansão acelerada está a estratégia de oferecer soluções sob medida para cada cliente, explica Benatti. “Não respondemos não. 'Você tem sais solúveis?' Sim. 'Você tem adubo líquido?' Sim. Você tem fertilizante que pode ser testado na Lua? Sim." brinca. "O que a gente busca ter as respostas prontas para os nossos clientes.”
Por muito tempo, a base dos clientes da empresa esteve centrada nos produtores paulistas de cana-de-açúcar. “A gente nasceu no estado de São Paulo, o meu know-how, do nosso diretor comercial, do meu sócio, sempre foi em cana”, explica Benatti.
Hoje, no entanto, a companhia ampliou sua atuação: a cana, que já representou 80% das vendas, responde por 55% do faturamento, seguida por soja (15%), milho (10%), florestas (10%) e o restante em HF, café e citros.
Além de trazer produtos sob medida aos clientes, a Hinove também garante que seus produtos são sustentáveis.
A rota de produção dos fertilizantes fosfatados é uma das mais desafiadoras do ponto de vista ambiental. Isso porque relevantes do processo acabam produzindo rejeitos.
Na etapa de beneficiamento, por exemplo, a rocha fosfática extraída das minas passa por processos físicos, como britagem e flotação, para concentrar o teor de fósforo.
“São 16 toneladas de rocha fosfática, com teor médio de 7% de fósforo contido, para formar 1 tonelada de concentrado de apatita”, explica Benetti. “Dessas 16 toneladas, 15 virou lama, 1 virou a rocha concentrada”, explica.
Na Hinove, o processo é diferente. Isso porque a empresa trabalha com rochas de maior pureza, com cerca de 24% de fósforo, explica Benatti. E é por esse motivo que a empresa diz ser a única produtora do mundo de fertilizantes fosfatados sem geração de rejeitos. “A gente produz sem gerar 1 kg de rejeito e 1 kg de resíduo porque a nossa rocha já é mais concentrada”, afirma o CEO.
Presente e futuro verde
Para os próximos anos, a Hinove trabalha com dois projetos ambiciosos na linha de sustentabilidade: uma planta de ácido sulfúrico e de pequenas e médias usinas de amônia verde em São Paulo e no Mato Grosso do Sul.
A unidade de ácido sulfúrico, que deve ser instalada em Guará, deve ser a primeira usina carbono zero por ser autossuficiente em energia, aproveitando o que já é produzido na unidade.
O projeto está orçado pela Hinove em R$ 140 milhões e a companhia agora busca recursos no mercado, a juros mais baixos, para conseguir viabilizar este investimento. "A ideia é que a gente comece a construir ela em meados do ano que vem", diz Benatti.
Já o projeto da amônia verde, se realmente sair do papel, deve necessitar de investimentos que ultrapassam R$ 1 bilhão.
A amônia é uma importante matéria-prima para a produção de fertilizatnes nitrogenados como ureia e nitrato de amônio. Mas a pegada de carbono que seu processo produtivo deixa, por utilizar gás natural, se tornou um problema para as indústrias de fertilizantes.
É por isso que as indústrias têm se interessado em investir em plantas de produção de amônia verde.
No fim do ano passado, a multinacional Yara, única a produzir nitrato de amônia no Brasil, deu um primeiro passo importante para viabilizar a produção desse insumo no País, quando começou a produzir amônia verde em Cubatão (SP), utilizando biometano, numa parceria com a Raízen, do grupo Cosan.
A produção, no entanto, ainda é pequena, girando entre 6 mil a 7 mil toneladas de amônia verde por ano – e a multinacional continua utilizando gás natural na maior parte de sua produção.
A Hinove planeja seguir por um outro caminho para viabilizar o projeto. A empresa pretende utilizar água, ar e energia em sua planta, fazendo hidrólise para a produção de hidrogênio verde e, com isso, conseguindo obter a produção de amônia líquida.
"Vamos trabalhar a amônia líquida para aumentar os nossos clientes em fertilizante líquido e agregar no nosso fosfatado. E, se sobrar material, fazer sulfato", afirma Benatti.
A ideia não é transformar a amônia em fertilizante sólido. “Para transformar essa amônia em ureia, precisaríamos de outra planta para ter o produto solidificado”, diz Benatti.
Se a Hinove optasse por fabricar ureia, os custos seriam mais altos, diz Benatti. Isso porque uma unidade produtora de amônia, que depois é convertida em ureia, pode chegar a custar US$ 1 bilhão (cerca de R$ 6 bilhões).
Já o projeto da Hinove, que envolve a produção de amônia líquida, custará menos, mas ainda assim o valor é significativo: US$ 100 milhões (pouco mais de R$ 600 milhões) por planta.
A Hinove pretende lançar quatro unidades industriais de amônia líquida até 2030, sendo uma em Guará, outra em Araraquara e duas em Rio Brilhante.
Três dessas plantas – em Araraquara, Guará e Rio Brilhante – teriam capacidade de produzir 50 mil toneladas de amônia. Uma outra menor, também em Rio Brilhante, teria capacidade de produzir 5 mil toneladas. As quatro plantas custariam, ao todo, US$ 307 milhões (R$ 1,65 bilhão) à companhia.
A ambição da Hinove, todavia, vai além dessas unidades: Benatti sonha em erguer pelo menos 20 unidades produtoras de amônia no futuro.
"Se a gente estivesse nos Estados Unidos, já estaríamos construindo. Mas aqui, realmente, você não tem recursos disponíveis (de imediato)", afirma o CEO.
O executivo fala com a experiência de quem tem recorrido ao mercado de capitais para viabilizar seus projetos. A companhia já emitiu dois CRA: um de R$ 100 milhões em 2023, e outro de R$ 70 milhões em junho deste ano. Houve ainda uma emissão de debêntures em 2022, no valor de R$ 70 milhões.
Mas, daqui em diante, a ideia é utilizar outras estruturas financeiras, especialmente em um momento de Selic a 15% ao ano.
"O que a gente não vai fazer mais é emitir CRA, pagando CDI + 3%. Com a capex necessária para fertilizantes no Brasil, você tem que buscar juros muito mais atrativos", afirma Benatti.
O jornalista viajou a convite da Hinove e da Nutrientes para a Vida.
Resumo
- Hinove projeta crescer de R$ 1,2 bi em 2025 para R$ 5 bi até 2030, dobrando capacidade produtiva para 2,2 milhões t/ano
- Empresa aposta em fertilizantes sob medida e livres de rejeitos, com foco em sustentabilidade e inovação
- Planos incluem planta de ácido sulfúrico carbono zero e até quatro usinas de amônia verde, somando R$ 1,65 bi em investimentos