Ribeirão Preto (SP) - Há quase um ano o mercado aguarda com expectativa o lançamento do primeiro “Fiagro estadual”, que vem sendo estudado pelo governo paulista em conjunto com empresas do setor financeiro.
O financiamento do agronegócio via mercado de capitais, desde a criação dos Fundos de Investimento em Cadeias Agroindustriais (Fiagros), em 2021, vem crescendo de forma significativa e trouxe a possibilidade de que o poder público também vire “sócio” em algumas iniciativas.
“Estamos disponibilizando R$ 500 milhões para aportes nestes fundos e agora queremos que as gestoras nos procurem e apresentem suas propostas”, destacou o presidente da Desenvolve SP, Ricardo Brito, em entrevista exclusiva ao AgFeed.
No segundo semestre do ano passado a Desenvolve SP já havia divulgado uma carta consulta para os interessados no lançamento de FIPs (fundos de investimento em participações, para diferentes setores) e também para FIDCs (fundos de direitos creditórios, com a possibilidade de envolver o agronegócio).
Era mais um passo na jornada de criação do “fiagro paulista”, consequência de uma parceria firmada em maio de 2023 entre a secretaria de Agricultura de São Paulo e a Suno Asset Management. O diretor de agronegócio do Grupo Suno, Octaciano Neto, já foi secretário de Agricultura do Espírito Santo e conhece bem as dificuldades de financiamento no setor púbico.
No fim do ano passado, o AgFeed trouxe mais detalhes sobre a iniciativa, que já vislumbrava a possibilidade de oferecer R$ 1 bilhão de crédito ao setor.
O processo da carta consulta prossegue e é possível que algum dos fundos, inclusive voltado ao financiamento do agro, seja viabilizado em breve.
Em paralelo, porém, o estado resolveu dedicar esforços a um programa mais amplo, que foi lançado oficialmente pelo governador Tarcísio de Freitas, nesta segunda-feira, junto com o anúncio de um pacote de medidas para financiar produtores rurais, na Agrishow, em Ribeirão Preto.
“O projeto que estamos lançando é parecido. Vamos aportar, por exemplo, R$ 50 milhões em determinado fundo, que pode ser um Fiagro ou um FIDC, e esperamos que gestora capte mais R$ 200 milhões, portanto nossa participação seria de 20%”, explicou Brito.
Com base neste cálculo, Brito diz que os R$ 500 milhões tendem a se transformar em R$ 2,5 bilhões em financiamento agrícola, ao contabilizar os recursos privados que serão captados em cada fundo.
Ele esclarece que a contrapartida obrigatória é “gerar impacto”, ou seja, os parceiros devem destinar o crédito para pequenos e médios produtores e trazer outros benefícios, como a própria geração de emprego e renda no campo.
O AgFeed apurou que três gestoras estão conversando com os técnicos da Desenvolve SP e da secretaria de Agricultura de São Paulo para que apresentem as “teses” e viabilizem novos fundos. Além da Suno, já estão próximas do projeto empresas como Rio Bravo e Mauá.
Mas a expectativa do presidente da Desenvolve SP é que mais gestoras e mais cooperativas agropecuárias, por exemplo, procurem a agência. Não haverá um vencedor da licitação, vários podem ter os projetos aceitos ao mesmo tempo, segundo ele.
No processo iniciado na carta consulta do ano passado, está previsto também um aporte de R$ 30 milhões do FEAP, Fundo de Expansão do Agronegócio Paulista. Neste caso, é possível que a Suno seja a primeira a viabilizar o fundo, à medida que discute detalhes das propostas desde o início do ano passado.
“Detectamos gargalos no mercado de crédito e o recurso uma vez na mão do gestor precisa ser endereçado a estes vários gargalos. Aqui na Agrishow, por exemplo, há máquinas super tecnológicas, mas com uma escala muito além do médio produtor, mesmo que ele consiga crédito para comprar, será considerada uma operação mais arriscada e por isso o financiamento será mais caro”, argumentou Brito.
A iniciativa prevê parcerias com cooperativas e com empresas de máquinas e equipamentos, que vão ajudar para que os recursos cheguem ao perfil do produtor alvo.
“A parceria com o setor é imprescindível porque eles têm capilaridade, tem equipes circulando no estado inteiro”, destacou.
Por outro lado, a expectativa é que a presença do governo com as gestoras de investimentos ajude a reduzir o risco de crédito, viabilizando um juro mais barato.
O edital desta segunda fase está sendo finalizado e deve ser publicado nas próximas semanas. Depois disso, as empresas têm 30 dias para apresentar as propostas.
“Mas as conversas já podem acontecer desde agora. É um projeto prioritário”, afirmou Brito. Na visão dele, as primeiras operações com produtores rurais, que vão ser tomadores dos financiamentos, vão ocorrer ainda este ano.
Jorge Louzada, superintendente de fundos da Desenvolve SP, que também conversou com o AgFeed, disse que assim que for lançado o edital, a equipe fará um road show em todas as cooperativas paulistas.
“Algumas já se manifestaram, dizendo que tem interesse em emitir dívida com garantia. Isso para recursos do governo é uma segurança muito boa. Não é recurso a fundo perdido, ele retorna”, explicou.
Além da compra de equipamentos, os fundos poderão ser criados “por cultura ou por cooperativa” e usados por exemplo em projetos de armazenagem e irrigação.
O modelo chamado de “blended finance” que mistura recursos públicos e privados, poderá também ser ampliado para uma participação de organismos internacionais, como o BID, segundo o presidente da Desenvolve SP. “Mas vamos testar o modelo”.
O secretário de Agricultura de São Paulo, Guilherme Piai, disse ao AgFeed que o primeiro Fiagro paulista, quando sair, deve ter juros entre 8% e 10%, por isso se mostrou bastante animado.
“Estamos executando o maior crédito da história de São Paulo, são R$ 1,4 bilhão, sendo R $300 milhões no FEAP e R$ 100 milhões no seguro rural, ambos são valores recordes”, afirmou.
O montante “biolionário” considera também os R$ 600 milhões já anunciados em créditos do ICMS para empresas de máquinas agrícolas e para o setor de proteína animal.