Fernando Julianelli já fez essa viagem outras vezes – e quase sempre a bordo de um 4X4. Desde o início deste ano, embarcou novamente na HPE Automotores, a empresa que representa e dá o tempero brasileiro à icônica marca japonesas Mitsubishi.

É ele quem está ao volante, agora, da nova investida da MIT, o carinhoso apelido da montadora famosa por seus veículos offroad, pelos caminhos rurais do Brasil, reforçando uma antiga relação com quem decide e opera o agronegócio no País.

“O agro sempre foi uma coisa muito relevante para a gente, até pela característica dos nossos produtos”, diz ele, que retornou à empresa depois de um intervalo de cinco anos – agora como vice-presidente de Branding e Inovação, mas sempre com o olhar atento ao marketing e às vendas.

“Nosso mantra é que 90% do Brasil não é asfaltado, então nossos carros foram sempre muito pensados para o mercado e as características do País. Consequentemente, a gente sempre atendeu muito bem o agronegócio, porque tem um produto com que o consumidor sabe que pode contar para entrar no pasto, na plantação, na fazenda, entrar na cidade...”

Julianelli acredita, mais uma vez, que está no jogo do agro para vencer. Em um momento em que o segmento de picapes ganha novos concorrentes e categorias – chineses, elétricos, gigantes ou compactas – A MIT aposta em um velho clássico, mas com nova versão, que acaba de ser lançada e terá como primeiro palco a edição 2025 da Agrishow, que começa neste domingo, 27 de abril, em Ribeirão Preto.

A nova Triton já vem com o ano 2026 e uma meta ambiciosa: atingir uma venda de cerca de 14 mil unidades este ano – o que representaria um aumento de mais de 30% sobre as 10,8 mil L200 comercializadas em 2024, segundo dados da Fenabrave, o que colocaria a MIT em quarto lugar no segmento das chamadas picapes médias.

As estatísticas não diferenciam os consumidores e durante muito tempo a marca se posicionou seus veículos mais como off-roads do que como instrumentos de serviço para o homem do campo. A MIT, de fato, se orgulha de ter seu nome relacionado à liberdade de acessar qualquer ponto do mundo, à aventura, a um estilo de vida ao ar livre.

Isso não deixará de estar no DNA da companhia, mas a proposta da nova Triton será estar mais associada ao universo rural, à aventura diária da produção agropecuária. É daí que pode vir o crescimento e as vendas que permitirão atingir a meta proposta.

“Desse total, arriscaria dizer que 80% vão para o mercado do agro”, afirma Julianelli.

Uma grande campanha, lançada na semana passada e assinada pela agencia África, justifica essa ambição. Com ares de superprodução, a marca coloca a Triton como protagonista em cenas que se passam em “fazendas lendárias” hollywoodianas.

Da telinha para a vida real, os vendedores das 131 concessionárias da marca terão bastante para contar, no boca a boca com os consumidores.

A ordem da empresa é botar as Tritons na estrada e, mas do que um test drive, oferecer aos agricultores e pecuaristas o que Julianelli chama de “test life”.

Ou seja, nas suas palavras, “mais do que uma voltinha de três quarteirões em torno da concessionária, permitir que ele use a picape em situações reais da sua fazenda, para entender como ela é capaz de resolver problemas cotidianos da sua operação”.

O discurso e a prática devem reunir duas características que a empresa considera seus diferenciais. Primeiro, a tradição japonesa de construir carros robustos e confiáveis – e a prova disso, segundo Julianelli, é o fato de a MIT ser a marca com mais vitórias em rallies como o Paris-Dacar e o dos Sertões.

“Do ponto de vista de engenharia, a picape talvez seja um dos carros mais complexos de se projetar, porque precisa ser extremamente confortável e performar, vazio e cheio, precisa ser um carro seguro, inclusive andando em condições difíceis e, de repente, puxando uma carreta com 3500 quilos”, diz.

Segundo, o fato de que esses mesmos japoneses usam as condições brasileiras como laboratório e benchmark para o desenvolvimento das novas versões. Aqui, diz, eles conseguem encontrar um pouco de tudo que será exigido em qualquer lugar do mundo.

E, em terceiro, o fato de que a fábrica e os engenheiros da HPE – ou seja, a MIT brasileira – ter sua fábrica localizada em Catalão, em Goiás, no coração agrícola do País.

“Os nossos engenheiros vivem no mundo do agro. Eles não estão em São Bernardo do Campo, eles não estão em Curitiba, eles não estão na NASA. Eles estão no campo, conversam com os amigos deles, que trabalham em fazenda. Às vezes, a família deles nasceu em uma fazenda”, completa.

Fernando Julianelli, VP de Branding e Inovação da HPE Automotores

Catalão é o epicentro de um investimento bilionário da HPE, anunciado em 4 de abril (4X4 day, como a empresa batizou) do ano passado. O valor, claro, R$ 4 bilhões, a serem aportados até 2032.

Há pouco mais de um ano, o CEO da HPE, Mauro Luis Correa, anunciou que o valor será direcionado a adequações na fábrica para a produção de novos produtos e, consequente renovação de seu portfólio atual – que inclui, além das picapes, as linhas Pajero, Eclipse e Outlander.

A nova Triton, assim, já é uma espécie de primeira safra dessa semente financeira plantada por lá. E o resultado dessa “colheita” são atributos que o produtor rural, hoje bombardeado com promessas de muita tecnologia embarcada, costuma colocar no topo da lista de prioridades, segundo Julianelli.

“Estou falando mais de hardware do que de software”, diz. “O chassi da novo Triton é muito mais resistente, que recebeu tecnologia de qualidade, com níveis de aço muito mais modernos”, aponta, ao iniciar a decifrar um rol de características que, na sua opinião, pesarão a favor da Triton na escolha dos potenciais clientes agro.

Um dos pontos destacados por ele é a economia do motor diesel da picape, campeã na categoria em um levantamento realizado pela revista 4 Rodas.

“A gente sabe que isso faz uma diferença enorme, porque ele faz contas. Com um tanque que tem 70 litros e roda 14km por litro, mais ou menos, estamos falando de quase mil quilômetros de autonomia”, calcula.

“O pessoal do agro às vezes ele faz travessias em que ele não tem um posto de combustível pra abastecer o diesel nesses mil quilômetros de distância. Então assim, isso as vezes é uma qualidade mais importante do que qualquer outra tecnologia, dependendo do uso”.

Julianelli prossegue, ressaltando que, na capacidade de rebote, “é a maior capacidade de rebote da categoria, com 3.500 kg, um motor biturbo, diesel, extremamente moderno, a qualidade toda de molas, amortecedores, enfim... Então tem essa parte toda da parte de baixo do carro”.

No quesito segurança, destaca o desempenho em testes de certificadoras como a Latin NCAP, em que a Triton foi a única picape que tem cinco estrelas. “A Ranger tem quatro estrelas”, compara, citando a concorrente fabricada pela Ford.

“Então, do ponto de vista de segurança versus performance, acho que segurança é muito mais importante, porque não estamos vendendo carro de corrida. A gente está vendendo carro para a família, carro para consumidor, ele é muito seguro”.

Julianelli conta que já fez o seu próprio “test life” com a Triton e pode, ali, testar o discurso na prática e entender como a eletrônica embarcada conversa com o “hardware” que estrutura a picape.

“O carro tem assistente de descida. Então, se você chega numa piramba cheia de terra molhada ou de pedra, ele tem diversos módulos para você selecionar para as diferentes condições, uma central inteligente do carro muito bacana. Você fica imaginando um cara que um fazendeiro, enfim, não tem que se preocupar com o que ele vai encontrar pela frente. Para ele talvez seja o melhor benefício de comprar um carro como esse”.

Mas a lida no campo, lembra ele, é só uma parte da vida do produtor rural. E a picape, em geral, o acompanha também no lado urbano de sua rotina. E aí, o 4X4 tem de se transformar, como diz Julianelli, na “limusine dele, o carro de luxo dele”.

Por isso, um dos pontos mais relevantes da estratégia da MIT tem sido capacitar sua rede de concessionárias a prestar um serviço que atenda a essa “vida dupla” da picape e seus proprietários, com presença e senso de urgência.

“Precisa ter um comportamento marketing e de atendimento para Manhattan, para São Paulo, para Rio de Janeiro, para Curitiba, mas que, se ele tiver um problema no trabalho da fazenda, possa levar a picape lá e sair com ela pronta pra voltar à operação quatro ou cinco horas depois”.

Os revendedores também são estimulados a ouvir mais e, se for o caso, fazer daquele carro orgulhosamente robusto um veículo único, customizado às necessidades de cada comprador. Hoje, segundo Julianelli, a área de desenvolvimento da HPE já possui uma série de acessórios criados especialmente para a Triton, inclusive churrasqueiras projetadas para serem instaladas na caçamba da picape.

Mas seus engenheiros podem, a partir de necessidades específicas, criar modelos sob demanda. No ano passado, por exemplo, a marca lançou uma série com o sistema Link Comand, que replica e amplifica o sinal de telefonia e de dados nas propriedades rurais, transformando a picape em uma espécie de "roteador 4X4”.

“A gente não tem esse carro pronta entrega, mas ele ajuda a explicar o que somos capazes de fazer. Hoje muitos fazendeiros têm máquinas autônomas, têm drones que são comandados por 5G, enfim, que a gente pode levar essa facilidade caso seja necessário”, conta.

“O bacana do que a picape é hoje e do que ela foi lá atrás é que ela sempre foi um carro extremamente robusto, mas muito espartano. E e hoje ele é um carro extremamente tecnológico”, continua.

“Se você entra em uma Trriton Katana, que é nosso topo de linha é um carro de extremo luxo, na ergonomia dos banco de couro, você tem câmera 360, você tem ACC (assistente computadorizado de condução), em que o carro acelera e freia sozinho na estrada com piloto automático, você tem diversos sensores...”

A ordem, agora, é acelerar os negócios, o que é um desafio e tanto para quem precisa vender veículos que custam acima de R$ 300 mil em um ambiente de juros altos e produtores rurais ressabiados.

“A rede está muito madura, depois desses mais de 30 anos da marca no País. É o mesmo que acontece no mercado financeiro: tem o pessoal que atende crédito rural, tem o pessoal que atende asset management, venture capital, essas coisas todas. É um negócio diferente” diz.

As concessionárias, segundo Julianelli, hoje têm estruturas e parcerias para oferecer opções de operações associadas às safras dos clientes, inclusive barter. E uma safra mais robusta, como a recém-colhida, deve abrir algumas porteiras para a marca.

“Esse ano vamos participar de mais de 25 feiras agropecuárias e temos um programa de visitar as fazendas, de levar o nosso produto até o fazendeiro”, diz Julianelli. No mercado de picapes, afinal, é preciso enfrentar qualquer terreno.