Enquanto o mercado de carbono ainda não é regularizado no Brasil, iniciativas localizadas tentam simular essas vendas de créditos verdes. Por aqui, a que mais se proliferou foi a do RenovaBio.

Nas últimas semanas, Os CBIOs, créditos de carbono para distribuidoras de combustíveis negociados na B3 dentro do escopo do RenovaBio, voltaram a uma cotação próxima aos R$ 150, um valor que não atingia desde julho de 2022 e próximo da máxima histórica de junho do ano passado, quando bateram os R$ 200. Nessa semana, estão cotados a R$ 140.

A tendência é seguir nessa onda positiva e parte do mercado já vislumbra voos mais altos para essa modalidade.

Na visão de Frederico Favacho, sócio da área de agronegócios do Santos Neto Advogados, escritório que atende players da área de biocombustíveis, no máximo até 2024 esse ativo deve voltar aos R$ 200, e deve seguir anotando novas máximas históricas.

Quando esse ativo estreou na Bolsa, lá em 2020, cada CBIO era cotado por US$ 10.

Mesmo com essa alta nos preços do CBIO, o Itaú BBA destacou, em relatório, que a geração de novos CBIOs se manteve estável em junho deste ano frente ao ano passado, em 2,7 milhões de títulos.

“No acumulado do início do ano passado até junho de 2023, o volume emitido foi de 47,8 milhões de títulos. Se considerarmos o total emitido até então, o volume já é suficiente para o cumprimento da meta referente ao ano de 2022”, afirma o BBA, em relatório.

Em termos de metas, a B3 esperava 36 milhões de emissões desses ativos em 2022 e 37,5 milhões neste ano. Para o ano que vem, a ideia é atingir 50 milhões.

Favacho considera a experiência do RenovaBio e do mercado de CBIOs como exitosa. Apesar disso, cita que o movimento é uma faca de dois gumes.

Se por um lado se trata de uma lei que engloba as empresas distribuidoras, a obrigatoriedade legal faz o mercado funcionar. Por outro lado, por estar limitado a um setor, também o crescimento é limitado.

No futuro, ele espera que os CBIOs, que foram reconhecidos pela CVM como ativos financeiros, possam partir para outras modalidades de investimento, como os fundos.

“Isso faria as pessoas investirem nesses fundos que compraria e revenderia CBIOs. O mercado, inclusive, está propício para isso”, afirma Favacho. Somado a isso, ele vê a possibilidade da própria B3 trabalhar com o chamado mercado futuro de CBIOs.

Um contrato futuro nada mais é do que um compromisso de comprar ou de vender uma certa quantia de um determinado bem em uma data adiante e por um preço já definido. “Com isso, você consegue com que as distribuidoras façam hedge do produto”, comenta.

Na Bolsa brasileira, algumas commodities agrícolas como milho e café possuem contratos futuros que podem ser negociados.

O RenovaBio foi estabelecido em 2017 e regulamentado nos anos seguintes, na intenção de dar mais um passo rumo à meta de redução de emissões estabelecida pelo país no Acordo de Paris.

Dentre os objetivos brasileiros dessa convenção, está a necessidade de aumentar a participação de biocombustíveis para 18% na nossa matriz energética até 2030.

O principal elemento do programa são os CBIOs, que são créditos de carbono específicos para as empresas distribuidoras de combustíveis.

Pelo regulamento, essas companhias são obrigadas a comprar uma quantidade determinada de CBIOs. Quem emite esses CBIOs são os produtores de biocombustíveis, como etanol e biodiesel.

Cada certificado representa uma tonelada de carbono equivalente que deixou de ser emitida para a atmosfera ao substituir o combustível fóssil por um renovável. É como se fosse um incentivo a esses produtores de combustíveis mais limpos vindo de grandes poluidores.

A ideia no longo prazo é que as distribuidoras coloquem esse valor gasto nos CBIOs no preço dos combustíveis fósseis, o que, na teoria, diminuiria sua comercialização.

De acordo com a B3, cada CBIO corresponde a uma tonelada de CO2 evitado, e não possui uma data de vencimento. Assim, um CBIO só deixa de circular no mercado quando for solicitada sua “aposentadoria”.

“A cada ano os distribuidores de combustíveis deverão solicitar a aposentadoria de CBIOs de sua titularidade em quantidade equivalente às metas de descarbonização que lhe foram estabelecidas”, diz o órgão.

Mercado aquecido pesa no bolso

Já que a intenção com o CBIO é, a longo prazo, diminuir o apetite por combustíveis fósseis que são altamente poluentes, um mercado aquecido com esses ativos em alta estaria pesando mais no bolso das distribuidoras. Por consequência, esse valor acabaria sendo repassado para o preço da gasolina nos postos.

Na semana passada, a Federação Nacional de Distribuidores de Combustíveis, Gás Natural e Biocombustíveis (Brasilcom), em conjunto com a Vibra e a Ipiranga, afirmaram em nota que uma disparada nos preços dos CBIOs já estaria impactando os custos aos consumidores nos postos e a inflação.

A Brasilcom afirmou na nota que vê “muita preocupação com a escalada desenfreada e injustificada do preço dos CBios".

Com o ativo por R$ 150, a federação estimou um impacto de R$ 0,12 por litro na formação de preço ao consumidor.

Para a Brasilcom e as outras empresas que assinaram a carta, o RenovaBio precisa ser “aperfeiçoado para que cumpra com seu objetivo, gerando ganhos ambientais e sociais para o Brasil, com equilíbrio, regras claras e isonômicas".