Guilherme Palhares atua como analista de investimentos do Santander há poucos meses. Em novembro do ano passado o ex-BofA, onde esteve nos últimos 4 anos, e ex-BTG, onde ficou por 3 anos, assumiu a cobertura das ações de alimentos e agronegócio no banco.

Formado em administração pela UFRGS, Palhares é um analista experiente e reconhecido no setor. Além de avaliar ações de empresas do agro na bolsa brasileira nas outras casas desde 2018, já atuou do outro lado do balcão, o chamado buy side, em um fundo de investimentos.

Na cobertura atual dentro do Santander, três ações do agro caem mais nas graças do analista, que olha com atenção para as maiores empresas de proteína animal listadas na B3, além de SLC Agrícola e Camil.

A SLC Agrícola tem demandado bastante atenção, segundo Palhares. A ação teve sua cobertura iniciada pelo Santander em janeiro e, em pouco tempo, já recebeu um upgrade na análise, com uma recomendação de outperform pelo analista, o equivalente a recomendar a compra.

Atualmente, o analista vê um preço-alvo de R$ 25 para o papel ao final deste ano, o que traria uma valorização de 27,8% frente ao valor atual que o papel é negociado.

O analista considera que o papel da SLC, que está na B3 desde 2007 e no Ibovespa, principal índice de ações da bolsa, desde 2022, “um nome que ficou muito tempo com pouca atenção no mercado”.

A recomendação positiva para o papel está ancorada na perspectiva da próxima safra, 2024/2025, que deve ser mais positiva para a empresa.

“Vemos nos números do USDA um cenário de plantio neste ano sem eventos climáticos como vimos nessa safra, com produtividade voltando na próxima. Cria-se uma oportunidade também para expansão de área voltar a dominar o noticiário sobre a SLC”, afirmou Guilherme Palhares ao AgFeed.

Ele cita que a empresa tem um movimento de crescer também via arrendamento, e nesse cenário de El Niño, onde houve uma produtividade diferente de produtor para produtor, os donos de terras podem voltar a fazer negociação com quem foi mais resiliente na próxima safra. Esse movimento pode beneficiar a SLC, segundo o analista.

Ainda no arrendamento, o analista do Santander conduziu recentemente um estudo onde avaliou a divisão da rentabilidade da terra de terceiros, a fim de entender como a SLC ganha com terras arrendadas.

“Vemos que a SLC tem conseguido entregar uma rentabilidade da operação acima do que ela mesmo paga em termos de leasing. Se olharmos uma média do setor, ela consegue entregar um retorno maior ao longo do tempo”, afirmou Palhares. “Um grande atrativo na SLC é que ela tem rentabilidade em cima de terras de terceiros”.

No relatório, enviado para clientes do banco há algumas semanas, Palhares e a analista Laura Hirata declararam que seu entendimento do valor da terra como uma combinação de retorno sobre ativos e ganhos de propriedade de terra ao longo do tempo.

O documento foi feito a partir de conversas com grandes donos de terra no País, com a intenção de avaliar melhor as áreas e os contratos de arrendamento. No relatório, é pontuado que as recentes avaliações da Terra Santa e de fundos de terra sugerem que as ações da SLC não estão devidamente avaliadas.

“A SLC está sendo negociada com um desconto de 47% em relação à avaliação de seu ‘estoque’ de terrenos de 2022 e 38% de desconto em relação à nossa estimativa ajustada de avaliação de terreno”, diz o relatório.

Nesse sentido, o Santander enxerga a SLC capturando 40% da avaliação da área arrendada, considerando que os proprietários recebem 3% em rendimentos de arrendamento e incorporam a valorização da terra a longo prazo, enquanto a SLC obtém um retorno de 8% sobre o banco total de terrenos. “Assim, estimamos que os retornos sobre a área arrendada representem R$ 5 bilhões em valor para a SLC”, diz o relatório.

Segundo o Santander, a Terra Santa atualmente arrenda 39 mil hectares para a SLC, e os fundos financiam os outros 24 mil hectares, cobrando 17 e 13 sacas por hectare de arrendamento da SLC, respectivamente.

Palhares ainda aguarda a publicação do balanço com os resultados da empresa no quarto trimestre de 2023, que será divulgado no dia 6 de março.

Apesar disso, o olhar estará menos focado nos resultados finais e sim nas perspectivas do management da empresa em relação à próxima safra, bem como o andamento da fixação de insumos.

Um churrasco mais saboroso para a Marfrig. E frango na JBS

Nos grandes frigoríficos listados, a aposta do Santander está na Marfrig e na JBS. Além da recomendação também outperform, os preços-alvo dos papéis são de R$ 15,70 e R$ 37 ao final deste ano, respectivamente.

Nesse cenário, Guilherme Palhares aposta numa valorização de 73% para as ações da Marfrig e de 64% para o papel da empresa da família Batista até dezembro.

Na Marfrig, o analista vê uma posição privilegiada da National Beef, subsidiária americana da empresa. Ele argumenta que a empresa opera num mercado de maior valor agregado no país, o chamado prime choice.

Palhares cita, usando dados do USDA, que esse mercado passou de 2% do total para 10%, comparando o último ciclo do boi com o atual. “Esse prêmio importante de preço por si só sustenta uma margem alta”, diz.

O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos mostrou que nos últimos 15 anos esses cortes de mais qualidade (selos choice e prime) passaram a representar 82% do mercado.

Em 2010, o mercado contava com 30% em cortes do tipo select, de menor qualidade, 60% no choice e apenas 2% no prime. Atualmente, o cenário é distinto, e além dos 10% do prime, são 72% para o choice e 15% para o select.

De acordo com o analista, os cortes classificados como choice são vendidos 10% mais caros que o select. Já o prime é 15% mais caro.

Para corroborar com essa avaliação positiva do papel, o Santander tem divulgado semanalmente um relatório a seus clientes com informações do padrão de consumo de carne ao redor do mundo, que são recolhidos num Big Data de tecnologia própria do banco.

“Hoje temos acesso a muitos dados de informação no setor, seja Brasil, EUA, Austrália, México ou China. Com esse escopo grande, temos tudo automatizado diariamente”, explica.

Em termos comparativos, a margem de lucro da operação norte-americana da Marfrig, onde está a National Beef, foi de 4,4% no terceiro trimestre de 2023, e somou um faturamento de US$ 3,37 bilhões.

Enquanto isso, a margem da JBS USA Beef foi de 1,6% no mesmo período, e a da Tyson Foods ficou praticamente no zero a zero.

Atualmente, Palhares vê que o primeiro trimestre de 2024 deve ser marcado por um preço um pouco mais baixo para o boi, com mais disponibilidade de animais no mercado, aproveitando um preço de milho em baixa no final de 2023. O restante do ano, contudo, deve ser difícil para o mercado bovino por lá, segundo o analista, em função dos custos elevados e produção em baixa.

Se a operação bovina da JBS nos EUA não vai bem, a diversificação agrada Palhares, que aposta principalmente num bom desempenho da Pilgrim’s, que deve encarar uma normalização da oferta de aves somada à redução de custos por conta do preço do milho.

A diversificação geográfica deve ajudar a JBS, principalmente na Austrália, onde o analista avalia um “ciclo bom no país”, que por conta do El Niño por aqui, tem aumentado a oferta de gado por lá. “A JBS tem levado muito brasileiro para trabalhar lá. Isso mostra que a empresa vê boas perspectivas na região. Vejo um primeiro ano de ciclo bom na Austrália, com exportação subindo”, diz.

No Brasil, o ciclo tem melhorado, de acordo com Palhares, mas a demanda ainda mais fraca da China limita o potencial de ganhos para as empresas exportadoras de proteína.

“Talvez no ano que vem vejamos uma estabilidade do abate, já que o preço do bezerro está um pouco acima da arroba do boi. Falta um ingrediente ainda nessa conta que é o preço de exportação e a incerteza política na Argentina. Com um cenário mínimo de previsibilidade no câmbio, o setor volta a ter investimento”, pontua.

BRF e Minerva ainda na geladeira

As ações da dona da Sadia e os papéis da Minerva estão com recomendação neutra pelo analista. O preço-alvo ao final de 2023 está em R$16 para a BRF e R$8 para a concorrente. O cenário projetado pelo Santander traria uma valorização de 11% e 20%, respectivamente, aos papéis.

Na BRF, a quebra de safra preocupa o analista, já que o preço em baixa de soja e milho afetou o prêmio dos grãos nacionais. “Gostaríamos de ver esse prêmio arrefecendo um pouco mais para estarmos mais animados”, diz. Com isso, o real efeito da queda de custo pode ser avaliado e colocado na conta da recomendação.

Apesar disso, ele vê a empresa “fazendo a lição de casa”. Além do aumento de capital feito no ano passado, Palhares espera uma diminuição na alavancagem somada a uma melhora de eficiência interna.

Já a Minerva está numa encruzilhada. Uma visão mais positiva (ou mais negativa), depende da aprovação ou postergação da compra dos ativos da Marfrig.

Em agosto passado, a Minerva anunciou que comprou 16 plantas de abate e desossa da Marfrig na América do Sul e um centro de distribuição por R$ 7,5 bilhões. São 11 plantas no Brasil, três no Uruguai, uma na Argentina e uma no Chile.

“A transação é relevante, mas a empresa é vista pelo mercado de capitais em uma situação binária, pela incerteza sobre a junção”, afirmou.

Essa indefinição do momento que a Minerva passará a operar as plantas, que devem elevar sua produção em mais de 50%, deixa o analista receoso. Junto a isso, o cenário de exportação mais fraco, por conta da demanda menos aquecida da China, justifica a posição neutra.

Um arroz e feijão no ponto para a Camil

Guilherme Palhares também está otimista com o papel da Camil, e prevê uma valorização de 27,8% até o final do ano para a ação. O preço-alvo é de R$ 12.“Temos gostado de Camil”, pontua Palhares.

Para ele, os movimentos de aquisição feitos nos últimos anos, que aumentaram sua alavancagem podem ter ficado para trás, e agora a empresa deve entrar num momento de colocar a casa em ordem.

“Entramos em um 2024 onde vejo todas essas coisas convergindo, com a Camil aumentando sua capacidade de café e massa, e vendo os resultados desses investimentos na prática”, afirmou.

Nos cálculos do Santander, o lucro líquido da empresa deve avançar 50% em 2023 e 32% em 2024. A alta estaria baseada também em um cenário de bons preços para o arroz brasileiro e a capacidade da Camil de “ajustar rapidamente os preços, o aumento dos volumes nas novas linhas de negócio, enquanto mantém a rentabilidade".