Em meados da década de 1950, o latifundiário e político alagoano Luiz Coutinho vendeu 30 mil hectares no sul de Alagoas à Companhia Progresso Rural. A empresa do Rio de Janeiro desenvolveu um projeto de cultivo de pimenta-do-reino naquela extensão de terra sem qualquer infraestrutura. Foi um fracasso.

Mas ali vivia Renê Bertholet, um franco-suíço morador da região. Ele conseguiu, junto ao governo estadual, a transferência das terras da companhia endividada para um projeto de colonização desenvolvido e estruturado por ele. O ano era 1956 e o projeto, inédito, juntava reforma agrária e cooperativismo.

A área foi dividida em 1.400 lotes de 20 hectares a 30 hectares, transferidos para a recém-criada Cooperativa Pindorama e doados posteriormente aos colonos locais. Todos se tornaram assentados e cooperados.

Do primeiro projeto - uma fábrica de suco de maracujá dois anos após a fundação - a um complexo industrial com a maior usina de açúcar e etanol de Alagoas e outras 14 fábricas, muita coisa mudou na cooperativa. Menos o modelo de agricultura familiar.

As imagens de satélite revelam aos curiosos que no “triângulo” entre Coruripe, Feliz Deserto e Pindorama ainda está o oásis produtivo com os milhares de lotes cultivados. Pindorama tem 30 mil moradores e 22 comunidades, tudo ligado de uma forma ou outra à cooperativa, é maior que 70% dos municípios alagoanos, mas ainda é distrito de Coruripe.

Bertholet viveu pouco para ver o projeto prosperar. Em 1º de maio de 1969, o fundador da cooperativa faleceu e sua casa abriga, desde 2000, um memorial. Por lá, dizem que o franco-suíço era muito dedicado, trabalhou demais e casou-se com Pindorama.

O espaço, na área urbana de Pindorama, foi aberto “para expor a história do cooperativismo local e a memória do homem que revolucionou a região”, segundo a descrição do site do memorial.

O visionário Bertholet não teve tempo de ver nascer a destilaria de álcool, em 1982, a fábrica de laticínios, em 1994, a fábrica de processamento de coco, em 1994, a usina de açúcar, em 2003, e vários outros empreendimentos. O último foi a modernização da usina de etanol, no ano passado.

Com investimento de R$ 70 milhões, a principal fonte de recursos da cooperativa se tornou também a primeira usina flex do Nordeste. A planta industrial é capaz de processar cana para açúcar e álcool durante a safra de seis meses e também milho para o etanol o ano todo.

Com o milho, a oferta dobrou de 30 milhões para 60 milhões de litros por ano de etanol combustível e outros seis tipos de alcoóis embalados para o consumo. A usina fornece também açúcar embalado, levedura e melaço para pecuária.

Lá também tem um boitel para receber até 2 mil animais confinados, que são alimentados com subprodutos do processamento de cana e do milho da usina.

No ano que vem, a Cooperativa Pindorama completará 70 anos. Para comemorar as sete décadas, a meta é superar R$ 1 bilhão de faturamento, ante R$ 720 milhões no ano passado, segundo contou Klécio Santos, diretor-presidente da cooperativa, em entrevista ao AgFeed durante o Congresso Conecta Agro, em Campinas.

“Em cinco anos saímos de R$ 200 milhões para R$ 720 milhões de faturamento e queremos chegar aos 70 com R$ 1 bilhão. Esse é o desejo e vamos pra cima”, resumiu o líder cooperativista.

Assim como Bertholet, Santos acabou se casando com Pindorama. Extensionista da Emater, chegou à região com 20 anos para prestar serviços sem conhecer a cooperativa. Depois de sete anos, comprou a posse de um lote e se tornou cooperado.

“Me tornei cooperado, mas com a intenção de ter a minha terra e não de ser presidente. E me casei com aquilo lá. Tenho 36 anos à frente dessa cooperativa como diretor-presidente”, contou Santos, produtor de cana e pecuarista.

Além de criadores de gado e canavieiros, entre os 1.077 cooperados - alguns têm mais de um lote - há também produtores de fruta, de coco e de pimenta. Desde que seja um produto entre os industrializados pela cooperativa, o plantio é liberado.

Santos explica que a produção do milho para o etanol e o processamento do arroz são as únicas atividades não realizadas, respectivamente, por cooperados e no complexo de Pindorama.

“O milho a gente compra fora, vem de Sergipe ou da Bahia. A intenção não é botar milho lá, porque a gente não vai tirar a cana”, disse.

Já o processamento do arroz é feito em uma unidade, a 45 quilômetros da sede, adquirida há pouco mais de um ano pela Cooperativa Pindorama. A beneficiadora recebe a produção de pequenos produtores que não são cooperados, mas sofriam para vender o arroz para atravessadores e quase não tinham margem no negócio, segundo Santos.

“Nós fomos pra lá pra salvar esse povo com a indústria, o apoio, a assistência técnica e o crédito. Eles plantavam arroz, viviam na mão dos atravessadores e a relação deles hoje é com a cooperativa, que traz a produção do campo para indústria”.

Para Santos, a receita do sucesso para um projeto de reforma agrária e de cooperativismo, com quase 70 anos, nascido da visão de um estrangeiro “é ser muito profissional no que faz para que, com resultado, a gente consiga fazer o bem coletivo o tempo todo”.

Resumo

  • Com 14 fábricas, boitel e a primeira usina flex do Nordeste, cooperativa Pindorama multiplicou seu faturamento nos últimos cinco anos e atingiu R$ 7230 milhões em 2024
  • Fundada em 1956 a partir de um projeto inovador de reforma agrária, reúne mais de mil pequenos produtores
  • Com atividade diversificada, cooperatia visa ultrapassar R$ 1 bilhão em receita ao completar 70 anos em 2026

Klécio Santos, diretor-presidente da Cooperativa Pindorama