Por mais que as políticas ESG já sejam encaradas como uma realidade em diversas empresas, a monetização de boas práticas ainda é um percalço a ser resolvido pelo mercado.

Os CBIOs, créditos de descarbonização para distribuidoras de combustíveis, já podem ser negociados na B3, mas outras práticas ambientais sustentáveis encontram travas na hora da remuneração e até na regulamentação de um mercado propriamente dito.

Olhando para esse problema, dois profissionais com vasta experiência no mercado financeiro chegaram com uma solução. Um deles é Gustavo Junqueira, ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB) e ex-secretário de Agricultura do estado de São Paulo entre 2019 e 2021.

Sua sócia, a economista Heloisa Baldin, acumula uma carreira de mais de 10 anos em instituições como Genial, Banco Pan e AMG Capital.

Desde outubro do ano passado, eles têm liderado a Iwá, uma gestora que pretende criar fundos de investimento que coloquem no portfólio ativos ambientais.

Conforme explicou Heloisa Baldin, que atua como CEO da empresa, ao AgFeed, a ideia é investir em ativos que envolvam energias renováveis, transporte sustentável, uso eficiente de recursos naturais e até boas práticas agrícolas por meio desse veículo.

“A Iwá nasce com o objetivo de trazer essa lógica mais profissional, que tem em outros segmentos do mercado, para o setor ambiental. Primeiro que pensamos que esse setor é apenas florestas e não é só isso. No geral, ele é pouco profissionalizado”, disse Heloisa Baldin, CEO e cofundadora da empresa.

Se de um lado produtos como os CBIOs já possuem um mercado organizado e de fácil acesso a alguns investidores, um investimento em etanol, por exemplo, ainda não tem esse grau de maturidade e, portanto, não é considerado um “ativo ambiental”.

De acordo com Baldin, a ideia é atacar principalmente o problema das emissões de CO2, algo que, segundo ela, passa obrigatoriamente pelo agro. Diante disso, ela vê oportunidade de tratar como ativo ambiental, por exemplo, além da conservação de florestas dentro de fazendas, um manejo feito com biológicos ou até mesmo a integração de lavoura, pecuária e floresta (ILPF).

“Isso tudo passa pelo desenvolvimento de metodologias para o contexto tropical do setor e suas particularidades para capturar e estocar carbono no solo. Esse é o panorama que enxergamos para uma transformação produtiva no Brasil que pode levar a economia a ser mais sustentável”, comenta.

A Iwá tem a meta de atingir R$ 1 bilhão em ativos ambientais sob gestão. O primeiro fundo, chamado de Iwá Nova Economia, deve chegar ao mercado nas próximas semanas, e começar com um portfólio entre R$ 100 milhões e R$ 200 milhões.

Segundo ela, a captação já foi iniciada e a gestora está em processo de fechar as primeiras operações. O fundo vai começar investindo em CBIOs, sendo o primeiro do tipo no mercado.

A ideia é, posteriormente, investir em etanol e em outros ativos. “Temos que aguardar mais regulações para entender o que de fato vira ativo financeiro. No futuro, o fundo terá várias exposições”, projeta.

O fundo já nasce nos moldes da nova regulamentação da CVM, a resolução 175. Dentre alguns instrumentos, vai ampliar a possibilidade de fundos multimercado.

Segundo Baldin, essa mudança permite, por exemplo, que o fundo da gestora tenha uma certa porcentagem de investimentos em CBIOs, outra com ativos florestais e outra com reflorestamento e conservação, por exemplo. Tudo num só veículo.

Baldin comenta que a tese do fundo é agnóstica e, além de encarteirar o que já está regulamentado como ativo ambiental, como CBIOs e o REDD+, de créditos de carbono voluntários, espera surfar na criação de novos ativos financeiros. “Com novas classes, teremos uma exposição em ativos de carbono e combustíveis sustentáveis”.

Investir em reflorestamento não é novo, mas a CEO vê a Iwá “entrando cedo no segmento”. Ademais, ela diz gostar da tese de energia. “Buscamos olhar para energia distribuída e energia solar, nenhum dos dois mercados está avançado. Na bioeconomia, existem chances de projetos de conservação em diversos biomas no norte, como as agroflorestas, por exemplo”, cita.

No primeiro momento, o foco da gestora e do fundo está nos investidores profissionais e empresas que são emissoras ou tomadoras de crédito de carbono, bem como investidores institucionais que queiram atuar no mercado.

Tanto que as primeiras captações estão sendo feitas, segundo a CEO, com pessoas que já atuam nesse mercado de forma particular, seja em CBIOs ou etanol ou em reflorestamento. A ideia da Iwá é ser uma espécie de veículo formal para esse tipo de investidor.

“Especificamente nesse primeiro fundo, estamos captando com os principais emissores de CBIOS”, explicou. A ideia, além de um produto de investimento, é “financeirizar” esse mercado de ativos ambientais.

Nesse aspecto, a presença de Gustavo Junqueira no negócio ajuda, e muito, a captação. Além de membro da SRB e antigo secretário do estado paulista, Junqueira já foi CEO do InvestSP. No setor privado, já atuou como CFO da Gradiente, vice-presidente executivo do Banco Pine, CFO da EZtec e foi membro do board da Cosan, Rumo e Nita Alimentos.

Heloisa Baldin explicou que a gestora quer, por exemplo, criar mecanismos para que o investidor pegue um ativo como etanol, por exemplo, e venda de derivativos e trave preços.

“Isso garante previsibilidade para a usina e para o distribuidor. O segmento de biocombustíveis é enorme, mas opera inteiro em contratos spot (à vista), e não possuem curva futura. Queremos ocupar esse papel de agente provedor de liquidez para o mercado”, afirmou.

Baldin sempre atuou em sua carreira com operações em derivativos nessas instituições, seja em produtos de renda fixa ou variável para o setor de infraestrutura, setor que ela considera bem parecido com o ambiental.

Os CBIOs, por exemplo, foram criados há poucos anos e, por isso, não possuem uma série histórica que mostre a relação entre risco e retorno dos ativos. Baldin quer que o fundo cumpra esse papel.

A Iwá foi criada com um financiamento próprio dos fundadores, que não descartam uma rodada de investimentos no futuro. Se isso for ocorrer, deverá ser com investidores estratégicos, segundo Baldin. Por enquanto, a ideia é dar tração ao fundo.