Um ano depois, os produtores que integram o Reg.IA, consórcio de agricultura regenerativa que reúne produtores rurais de soja e milho e empresas como Agrivalle, Bayer, BRF e Milhão Ingredients, sob a coordenação da agtech Produzindo Certo, têm razões para celebrar.

Ao todo, na safra 2024/2025, o consórcio de fazendas produziu 149,1 mil toneladas de soja regenerativa e também 9,2 mil toneladas de milho regenerativo na safrinha. A expectativa é de que a colheita de milho alcance 240 mil toneladas até o fim da temporada 2024/2025, considerando os diferentes ciclos do cereal.

O consórcio abrangeu 37 mil hectares em seu ano inicial. O volume de soja ficou um pouco abaixo dos 200 mil hectares ambicionados pela Produzindo Certo quando lançou a iniciativa, há um ano. Na ocasião, a empresa esperava que 50 propriedades entrassem no consórcio, mas como o número final de adesões foi menor, a produção também acabou sendo mais baixa.

De qualquer forma, a primeira safra já trouxe um importante legado de sustentabilidade.

Isso porque a pegada de carbono deixada pela produção de soja foi de 510,5 kg de CO2 equivalente por tonelada, 66% menor que a pegada média nacional da produção de soja, segundo cálculos feitos utilizando a calculadora Footprint PRO Carbono, desenvolvida pela Bayer em parceria com a Embrapa. O estoque de carbono no solo das plantações de soja foi de 73,5 toneladas por hectare, conforme resultado das análises realizadas pela empresa ConnectFarm.

Já no milho, considerando os 630,9 hectares de área colhida até o momento, a produtividade chegou a 243,22 sacas por hectare, igual a 14,59 toneladas por hectare, com o mesmo índice de estoque de carbono no solo registrado para a soja. A pegada de carbono foi 83% menor do que a média nacional.

Assim, com esses dados promissores em mãos, Aline Maldonado Locks, CEO da Produzindo Certo, considera que o primeiro ano do consórcio deixou um saldo positivo.

"Ficamos muito felizes porque a gente chegou bem perto daquilo que planejamos lá atrás e também com o fato de que todas as propriedades que ingressaram desde o início continuaram até o fim. Nenhuma delas foi desclassificada", afirma Locks em entrevista ao AgFeed. "Acho que os produtores fizeram a parte deles. Agora vamos ver como vai ser a saída desse grão regenerativo no mercado", complementa.

Ao aderirem ao consórcio, os produtores ganham direito a obter um prêmio já garantido de até 2% sobre sacas de soja e milho adquiridas previamente por empresas apoiadoras do projeto, como a BRF e a Milhão.

Os produtores não são necessariamente obrigados a comercializar sua produção com essas empresas, mas têm a garantia por parte dessas companhias de que elas vão pagar o bônus caso a produção esteja em conformidade.

O Reg.IA trabalha com a ideia de práticas mandatórias e opcionais para a participação dos produtores no projeto.

Entre as práticas mandatórias para habilitar suas fazendas ao consórcio, os agricultores poderiam escolher entre mostrar que haviam feito plantio direto de cobertura em toda a fazenda nos últimos três anos para habilitar parte dos talhões ou optar por fazer plantio de cobertura em pelo menos 25% dos talhões no caso de trazer toda a propriedade para o consórcio.

Já as práticas opcionais passavam pela possibilidade de fazer adubação orgânica, com pelo menos 20% do volume de fertilizantes sendo proveniente de fonte orgânica; pelo uso de biológicos, com os produtores fazendo ao menos uma aplicação de biológico na lavoura/safra; a redução de uso de pesticidas químicos, para que fosse abaixo de 20% da média nacional; e rotação de culturas.

No primeiro ano, os produtores poderiam escolher uma prática opcional além da mandatória. Já na próxima safra, a exigência vai aumentar e o produtor terá de escolher duas dessas práticas.

Além disso, na temporada 2025/2026, a Produzindo Certo pretende aumentar o número de propriedades envolvidas – passando de 37 fazendas que participaram do primeiro ano para 50 – e também o volume de produção, chegando a 200 mil toneladas de soja.

A ideia da Produzindo Certo é também expandir a quantidade de hectares envolvidos, para cerca de 50 mil hectares de cultivo de soja e milho regenerativos.

Já os estados das propriedades participantes devem permanecer os mesmos do ano inicial: Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais e São Paulo.

Para levar adiante os planos, a Produzindo Certo agora conta com dois novos parceiros que se somam às demais empresas e organização que já participavam do projeto: a startup Inplanet, com atuação no Brasil e na Alemanha, focada em geração de créditos de carbono a partir da utilização de pó de rocha nas lavouras, e a organização sem fins lucrativos Proforest.

"A ideia é que esses novos parceiros consigam levar adiante a mensagem do Reg.IA para mais produtores e empresas", diz Locks.

A Produzindo Certo negocia ainda com mais dois novos parceiros para aderirem ao consórcio. Locks diz ainda não poder revelar quais são, mas que devem ser anunciadas até o fim deste segundo semestre.

Já os planos de levar o Reg.IA para fora do Brasil ainda não avançaram, diz Aline Locks. Em fevereiro deste ano, o cofundador e diretor de operações da Produzindo Certo, Charton Locks, disse ao AgFeed que havia a possibilidade de inserção do consórcio da Argentina, país onde a empresa já possui uma base.

“A gente tinha uma expectativa de talvez levar para a Argentina, mas por enquanto não vamos levar. Queremos concentrar os esforços de estabelecer e fazer o Reg.IA crescer aqui no Brasil, consolidando ele antes de levá-lo para outro país”, diz Locks.

Por esse mesmo motivo, a empresa não pretende ampliar por enquanto a quantidade de culturas no próximo ciclo de Reg.IA, mantendo soja e milho, ainda que não descarte a ideia para o futuro, segundo Aline Locks. “Tem outras culturas, como o café, que a gente tem olhado e temos interesse em expandir o escopo. Mas ainda não vamos fazer isso nesse segundo ano de Reg.IA, continuando com soja e milho.”

Consórcio de pecuária sustentável

Além de apresentar os resultados do Reg.IA, a empresa de Locks também lançou nesta semana o Bov.IS, um consórcio semelhante ao voltado para os grãos, só que com foco na pecuária sustentável, cujo lançamento já havia sido antecipado pelo AgFeed em fevereiro deste ano.

Em seu primeiro ano, o consórcio pretende alcançar 45 pecuaristas dos estados de Mato Grosso e Pará, trabalhando com 125 mil hectares de pastagens e com a expectativa de recuperar e intensificar pelo menos 5 mil hectares.

"A ideia é que seja um consórcio de pecuária intensiva e sustentável, apoiando a intensificação da pecuária em propriedades rurais brasileiras", diz Aline Locks.

A intensificação de pastagens é uma estratégia que mescla diferentes técnicas, incluindo correção de solo, adubação e divisão do gado em piquetes. Com uma lotação maior de animais, há mais produtividade na produção, diminuindo a pressão de desmatar florestas para abertura de novas áreas de pasto.

O formato do consórcio é parecido com o do Reg.IA, com práticas obrigatórias e opcionais a cumprir.

Para o pecuarista participar da iniciativa, a ideia é que ele se comprometa a adotar três práticas obrigatórias: rastrear 100% de seu rebanho; status socioambiental na transação; e ter desmatamento zero em sua propriedade a partir de 31 de dezembro de 2020, seguindo o padrão da lei desmatamento da União Europa, a EUDR.

“Depois de se comprometer a adotar essa prática, o produtor terá um ano para cumpri-la”, diz Aline Locks.

Além de se comprometer a obrigatoriamente adotar essas práticas, os pecuaristas terão de escolher pelo menos uma entre cinco práticas opcionais, que são: adotar planos de de melhoramento genético do rebanho; utilizar metodologias como Recria Intensiva a Pasto (RIP) e Terminação Intensiva a Pasto (TIP); fazer recuperação de pastagens; ter a gestão de índices zootécnicos; ou adotar boas práticas de bem-estar animal.

Dessa forma, a Produzindo Certo espera que, ao fim de três anos, os pecuaristas consigam um aumento de 25% na taxa de lotação das propriedades e redução de 50% na pegada de carbono deixada por cada arroba do boi produzida.

A iniciativa começa sem nenhuma empresa envolvida. "Vamos começar a captação de parceiros agora, ainda não temos nenhum oficializado", diz Locks.

A Produzindo Certo também ainda não fechou a adesão de pecuaristas ao consórcio, mas Aline Locks afirma que esta semana fará a apresentação do programa a vários produtores, na expectativa de começar a trazê-los para dentro da iniciativa.

Resumo

  • Primeira safra do Reg.IA produziu 149,1 mil toneladas de soja regenerativa e 9,2 mil toneladas de milho regenerativo, com pegada de carbono 66% menor que a média nacional na soja e 83% no milho
  • Iniciativa envolveu 37 mil hectares e 37 propriedades no primeiro ano, com meta de chegar a 50 fazendas e 200 mil toneladas de soja na próxima safra
  • Produzindo Certo lançou na semana passada o Bov.IS, consórcio de pecuária regenerativa, que pretende atingir 45 pecuaristas em MT e PA