Pouco mais de um ano depois de lançar um fundo para investir em CBIOs, os créditos de descarbonização emitidos por produtores de biocombustíveis, a gestora Iwá, focada em ativos ambientais, está dobrando a aposta em veículos destinados a financiar práticas sustentáveis.

A gestora de Heloísa Baldin agora está lançando um FIDC (fundo de investimento em direitos creditórios) com foco em agricultura regenerativa. A ideia é captar R$ 500 milhões com investidores para financiar, a juros mais baixos que os praticados usualmente no mercado, a adoção de práticas agrícolas sustentáveis no Cerrado brasileiro.

Com o novo fundo, a Iwá pretende alcançar 40 mil hectares pertencentes a 20 produtores rurais da região de Rio Verde (GO), um dos principais polos de produção de grãos do País.

A intenção da Iwá é ir além do financiamento convencional, dando também suporte técnico à transição das propriedades que vão receber o crédito. A adoção de agricultura regenerativa envolve práticas como o plantio direto e de cobertura, utilização de insumos biológicos, rotação de culturas e adubação orgânica, entre outras.

Para implementar essas mudanças no campo, a gestora está atuando em conjunto com o Grupo Associado de Agricultura Sustentável (Gaas), organização que promove a inserção de técnicas regenerativas e sustentáveis no campo, que vai dar assistência técnica e suporte aos produtores.

“Quando a gente fala de agricultura regenerativa, não adianta fazer um produto de crédito puro e simples. É necessário fazer um projeto de crédito com assistência técnica”, avalia Heloísa Baldin, CEO e fundadora da Iwá.

Com passagens por instituições como Barclays, Genial Investimentos e AMG Capital, Baldin já havia tido contato com o agro quando atuou no Banco Pan, mas não com a agricultura regenerativa.

“O que eu conhecia era o agronegócio convencional. Ainda não tinha tido contato com os produtores regenerativos com os quais queremos trabalhar neste fundo. Estive em Rio Verde, conheci de perto essa realidade e descobri toda uma ‘cena’ voltada à agricultura regenerativa. Foi a partir daí que começamos a desenhar o projeto”, conta.

O prazo dos financiamentos é dilatado, durando entre 7 a 10 anos – o que, segundo Baldin, é natural em virtude do processo de transição de práticas no campo ser mais demorado.

“Esse investimento vai começar a dar retorno no quarto ano. A gente vai ter uma carência longa e você tem um prazo de repagamento da operação maior”, diz a fundadora da Iwá.

Baldin diz que uma parte do valor captado com investidores será direcionada para a monetização de ativos ambientais.

“Ainda estamos estudando alternativas. Não sabemos se vai ser, por exemplo, um projeto de crédito de carbono, um projeto de crédito de biodiversidade ou um PSA (pagamento por serviços ambientais). Mas a ideia é que exista um componente do retorno explicitamente vinculado ao ativo ambiental”, afirma.

As captações para o novo fundo começaram há cerca de um mês – e a ideia da Iwá é que esse processo dure até junho do ano que vem.

Neste primeiro momento, a gestora está em busca de capital concessional, especialmente de bancos de desenvolvimento como BNDES e BID.

A intenção é que, em uma segunda etapa, a captação seja ampliada para outros perfis de investidores, incluindo investidores privados, institucionais e de varejo.

“A ideia é captar mais ou menos um terço do fundo, entre 30% a 50%, com capital concessional. E fazer à mercado o resto da captação”, diz Baldin.

Por ora, o foco da Iwá para a captação do fundo está mais voltado ao Brasil. Embora a gestora tenha conversas com investidores estrangeiros em andamento, Baldin diz que fatores como o custo cambial e o cenário externo desfavorável têm limitado uma participação mais expressiva de recursos internacionais.

“O que eu ouvi bastante é que as fontes para capital concessional secaram, especialmente nos Estados Unidos. Agora, a gente vai começar a falar com investidores europeus e alguns investidores árabes”, diz Baldin. “E a gente está falando de um veículo de 10 anos, o risco cambial também não é desprezível.”

Além disso, a proposta de financiar a transição para a agricultura regenerativa não se limita ao projeto em Rio Verde.

A intenção da Iwá é usar esse fundo como um piloto para o desenvolvimento de novos veículos financeiros voltados ao fomento de cultivos sustentáveis em outras regiões do País.

“Queremos aproveitar o aprendizado em Rio Verde para replicar esse modelo de assistência técnica localizada em outras áreas do Brasil”, afirma a fundadora da Iwá.

A ideia, de acordo com Baldin, é trabalhar com “clusters” regionais, o que permite atuar com grupos de produtores geograficamente próximos, com práticas agrícolas semelhantes – e também atuando de forma parecida com os de Rio Verde, em um esquema “comunitário”, nas palavras da fundadora da Iwá.

Dessa forma, o fundo evita a dispersão entre regiões distantes, o que poderia dificultar a padronização e o acompanhamento técnico das iniciativas.

“Imaginando, por exemplo, que uma das possibilidades do fundo é produção de grão não transgênico. Se você tem um cluster onde você vai ter 40 ou 50 mil hectares produzindo soja, você consegue fazer um contrato de venda dessa soja com uma trading. Com uma fazenda em Rio Verde, outra em Sinop (MT), e outra em Barreiras (BA), não consigo fazer a mesma coisa”, afirma Baldin.

CBIOs em operação

Além do fundo de agricultura regenerativa, a Iwá deve começar a operar nas próximas semanas o Iwá Nova Economia, veículo criado com o objetivo de adquirir CBIOs – créditos de descarbonização exigidos de distribuidoras de combustíveis – e outros ativos.

A expectativa da Iwá era de que as primeiras operações ocorressem logo após o lançamento, em março do ano passado. No entanto, os planos da gestora mudaram após o mercado de CBIOs passar por instabilidades ao longo de 2024, impactado negativamente por queda nos preços e no volume de créditos negociados.

Distribuidoras passaram a contestar judicialmente a obrigatoriedade de aquisição dos créditos e começaram a descumprir as metas estabelecidas pelo RenovaBio, programa federal de descarbonização.

Dessa forma, os créditos, que chegaram a ser negociados a R$ 99,45 em abril do ano passado, caíram quase 25% em três meses, chegando a R$ 75 em julho. “A gente decidiu, então, segurar o lançamento”, diz Baldin.

No começo de janeiro, o presidente Lula sancionou uma lei que endurece as penalidades para as distribuidoras que descumprirem metas de descarbonização.

Dessa forma, com condições de mercado aparentemente mais tranquilas, a gestora sentiu mais segurança para colocar seu fundo em operação.

“A gente viu que alguns dispositivos da nova lei estão funcionando. Um exemplo: a ANP começou a notificar os inadimplentes por e-mail, não mais somente por ofício como era até então”, afirma a fundadora da gestora.

A Iwá foi criada em 2023 por Baldin e Gustavo Junqueira, ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB) e que foi secretário de Agricultura do estado de São Paulo durante o governo de João Doria, entre 2019 e 2021. Junqueira deixou a operação no ano passado.