As maiores preocupações de produtores rurais ao redor do mundo são o aumento nos custos dos insumos, a intensificação de eventos climáticos extremos e a volatilidade dos preços das commodities nos próximos dois anos.

É o que aponta a pesquisa Global Farmer Insights 2024, recém-divulgada pela consultoria McKinsey, que ouviu 4.400 agricultores de Brasil, Argentina, México, França, Alemanha, Holanda, Canadá e Estados Unidos no primeiro trimestre deste ano. A última edição do levantamento havia sido apresentada em 2022.

O recorte brasileiro, que trouxe tendências como maior adoção de biológicos e digitalização nos meios de pagamento, já havia sido divulgado em agosto pelo AgFeed.

Mesmo tendo recuado de 63% em 2022 para 48% neste ano, a preocupação com o preço dos insumos ainda é o maior risco esperado para os próximos dois anos na avaliação dos agricultores.

“Apesar de uma redução geral nos custos de fertilizantes e ingredientes ativos para proteção de cultivos no ano passado, os agricultores relatam um aumento médio percebido nos custos gerais de 13% no mesmo período”, diz o estudo.

“Eles continuam preocupados com o preço de insumos como fertilizantes, que tem a maior inflação percebida nos últimos 12 meses: 24% dos produtores relataram que os preços subiram mais de 20 por cento no ano passado”.

O clima, que não deu sossego ao agro nos últimos anos com efeitos como El Niño e La Niña na América Latina, furacões na América do Norte e ondas de calor na Europa, é a bola da vez: 41% das respostas veem os eventos climáticos extremos como principal ameaça para os próximos dois anos, percentual mais alto que em 2022 (35%).

Na América Latina e na Europa, os extremos climáticos passaram a ser a principal preocupação dos produtores, indica a McKinsey.

"Essa mudança no sentimento pode refletir o impacto de eventos como o El Niño em 2023, que resultou em secas generalizadas, inundações e flutuações de temperatura ao redor do mundo", afirma a consultoria.

Os produtores que acham que os extremos climáticos são o maior risco informaram gastar cerca de 30% a mais em compras agrícolas do que seus colegas e estão 50% mais propensos a planejar a compra ou arrendamento de mais terras nos próximos dois anos – provavelmente de olho em mudanças geográficas para terras mais adequadas para produção, segundo a McKinsey.

Já a volatilidade dos preços das commodities está preocupando principalmente os produtores da América do Norte: 30% deles veem como o maior risco.

Em contrapartida, os produtores ao redor do mundo enxergam como oportunidades para aumentar os lucros no futuro a possibilidade de melhora nos rendimentos, preços mais altos das safras e insumos mais baratos.

“Para capturar essas oportunidades, os agricultores avaliam tomar três ações principais: experimentar novos produtos coltados ao aumento de produtividade, novos produtos de proteção de cultivos e adquirir equipamentos, produtos ou tecnologias inovadores”, diz a McKinsey.

Otimismo

O otimismo dos agricultores em relação aos ganhos futuros varia significativamente entre as regiões.

Na Índia e América Latina, mais da metade dos entrevistados (76% e 53%, respectivamente) espera um aumento nos lucros nos próximos dois anos.

Por outro lado, na América do Norte e Europa, prevalece o pessimismo: apenas 15% e 17%, respectivamente, esperam aumento nos ganhos à frente.

A McKinsey avalia que a dinâmica de oferta e demanda pode estar influenciando a opinião dos produtores sobre os ganhos no futuro.

Nos Estados Unidos, diz a consultoria, há uma combinação de preços do milho e da soja em baixa, maiores estoques e queda nas exportações. Na Europa, o preço do trigo caiu cerca de 40% desde 2022 e os custos de produção subiram.

Já na Índia, o aumento dos preços do arroz, commodity dominante no País, parece estar contribuindo para a perspectiva positiva dos produtores indianos.

O caso do Brasil é particularmente interessante. Por aqui, os produtores mantêm uma expectativa positiva, impulsionados pelo crescimento das exportações de milho para a China.

Mas a McKinsey alerta que eventos ocorridos depois da realização das entrevistas, em março passado, como as queimadas, podem ter alterado a perspectiva dos produtores para o futuro.

Práticas sustentáveis

O estudo da McKinsey diz que a prioridade dos agricultores hoje é a melhoria da produtividade por diferentes caminhos: seja via adoção de tecnologia ou utilização de práticas sustentáveis e produtos biológicos.

As práticas líderes ao redor do mundo são rotação de culturas (68%), plantio direto ou reduzido (56%), e pulverização ou fertilização de taxa variável (40%).

Mas a adoção das práticas não acontece uniformemente na maioria dos países, que apostam mais em algumas práticas em detrimento de outras.

Nos Estados Unidos, por exemplo, 87% adotam rotação de culturas, mas apenas 23% usam produtos biológicos como biocontrole, biofertilizantes ou bioestimulantes, situação parecida com a do Canadá, onde 93% adotam a rotação e apenas 14% usam biológicos.

Mesmo na América Latina, a adoção varia. Nesse quesito, o Brasil é quem apresenta maior uniformidade no comportamento dos produtores e tem as melhores taxas de adoção em quase todos os parâmetros – o plantio direto, por exemplo, é adotado por quase todos os respondentes (97%), percentual que cai para 78% na vizinha Argentina e para 42% no México.

Na Europa, a prática mais sustentável utilizada é a rotação de culturas, com 71% de adesão, seguida por 58% de plantio de cobertura, 56% de plantio direto e 53% de aplicação ou pulverização de insumos em taxa variável.

Apesar do uso de biológicos ficar por último, com adesão de 41%, o continente europeu só fica atrás do Brasil (67%) na adoção desse tipo de produto se comparado a outras regiões.

De uma forma geral, a McKinsey avalia que Índia e México “ficam para trás” na adoção de práticas sustentáveis em comparação com Argentina, Brasil, Europa e América do Norte.

Entre os respondentes mexicanos, 42% adotam plantio direto, 35% dizem usar biológicos, 23% dizem adotar rotação de cultura, 16% fazem plantio de cobertura e 7% fazem aplicação ou pulerização de fertilizante em taxa variável.

A Índia traz números ainda piores. Apesar de 48% dos produtores indianos informarem que adota rotação de cultura e 35% dizerem que usam biológicos, as demais taxas ficam em apenas um digito.

De uma forma geral, a consultoria avalia que, ao redor do mundo, "há baixa disposição para adotar práticas sustentáveis ​​individuais nos próximos dois anos entre os agricultores que atualmente não estão usando essa prática específica (menos de 10% dos agricultores para a maioria das práticas)."

Biológicos

O levantamento indica, entretanto, que cerca de 90% dos produtores que usam biológicos disseram que esperam manter ou aumentar os gastos com produtos do tipo.

Além disso, a pesquisa também aponta que 63% vão manter os gastos com produtos biológicos independentemente das mudanças nos preços de proteção de cultivos e fertilizantes.

Os agricultores não estão adotando produtos biológicos como um substituto para protocolos tradicionais, segundo a McKinsey, mas sim como complementação dos manejos existentes de fertilizantes e proteção de cultivos. Somados, eles melhoram o rendimento no campo.

Só que a adoção de bioestimulantes e bionutrientes ainda não chega à metade dos produtores em nível global. Cerca de 31% dos agricultores ao redor do mundo estão usando bionutrientes, enquanto 20% usam biocontroles, e 6% dos respondentes pretendem usar os dois produtos.

O Brasil, de longe, vem se consolidando o campeão dos biológicos, anotando 64% de uso de bioestimulantes ou fertilizantes (em 2022, era 52%) e 61% de uso de biocontrole (ante 55% em 2022).

Nos Estados Unidos, 26% fazem uso de bioestimulantes ou biofertilizantes e apenas 12% fazem uso de biocontrole – e 5% e 6%, respectivamente, planejam usar esses necanismos no futuro.

Já na Europa, houve um recuo de adoção de bioestimulantes ou biofertilizantes de 2022 para cá, passando de 38% para 33%. O biocontrole, por sua vez, cresceu de 23% para 25%.

Os piores resultados, em contrapartida, vem da Índia: apenas 15% adotam bioestimulantes e biofertilizante; e somente 4% usam biocontrole. As taxas de crescimento esperado para o futuro também são baixas: 3% e 5%, respectivamente.

Tecnologia e carbono

O levantamento indica ainda que, ao redor do mundo, os produtores estão mais inclinados a adotar novas tecnologias que melhoram diretamente as operações.

Os Estados Unidos têm a maior adoção de tecnologia, com 61% de adoção de agronomia digital, 51% de adoção de hardware de agricultura de precisão, e 38% de adoção de tecnologias de sensoriamento remoto.

Os casos de uso dessas tecnologias variam de acordo com a região. Na América do Norte e na América Latina, o monitoramento de rendimento é a principal tecnologia de agronomia digital, com 60% e 49% dos agricultores, respectivamente, dizendo que a usam.

Já na Europa, o monitoramento de rendimento na Europa é muito mais limitado, com 27% dos agricultores e as tecnologias mais são usadas são direcionadas para o gerenciamento de doenças, com 28% de adoção.

Se as tecnologias estão sendo adotadas, por outro lado os programas de carbono ainda patinam, mesmo com o crescimento desse mercado ao redor do mundo.

De acordo com a McKinsey, a porcentagem de agricultores que disseram estar participando atualmente de programas de carbono é baixa, de apenas 12%. O país onde há maior adesão é o Canadá, com 12%, seguido por Estados Unidos (11%) e Europa (9%).

Já as taxas mais baixas estão no México, onde nenhum entrevistado disse participar de programas do gênero, e na Índia, com apenas 1%.

Parte dos níveis reduzidos de adoção se explica pela falta de conhecimento em alguns países: 90% dos respondentes na Índia e 60% no México afirmaram nunca ter ouvido falar dessas iniciativas.

Globalmente, mais da metade dos entrevistados (54%) já ouviram falar em programas do tipo e, mesmo assim, não participam. Para a McKinsey, “a baixa adoção de programas de carbono provavelmente se deve à falta de incentivos e conscientização claros.”

Mesmo no líder Estados Unidos, o retorno ainda é percebido como não alto o suficiente por cerca de 60% dos produtores.