A safra 2024/25 de milho começou em meados de setembro, nos estados que fazem o plantio de verão, mas o cenário ainda traz incertezas no campo.
A alta no custo de produção, somada a preços em patamares abaixo do esperado desde a safra passada, estão desestimulando muitos produtores que, na safra de verão, reduziram a área plantada.
“O custo de produção está alto enquanto a produtividade no campo tem sido menor, deixando o produtor com margens apertadas ou até mesmo negativas", explica Paulo Bertolini, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho).
Ainda assim, as primeiras estimativas feitas pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) apontam para uma alta de 3,4% na produção da safra total de milho 2025/2024, que deve chegar a 119,6 milhões de toneladas.
A área plantada deve ficar praticamente estável e por enquanto está estimada em 20,9 milhões de hectares, considerando a primeira, segunda e terceira safras que são cultivadas no Brasil.
Um incremento de área de 1% é esperado para a segunda safra, hoje a maior plantada no País, que deve alcançar 16,6 milhões de hectares. A produção da safra de inverno, que só começa a ser semeada quando a soja é colhida, a partir de janeiro, está sendo projetada pela Conab em 94,6 milhões de toneladas de milho, um aumento de 4,8%.
Para as exportações, o Itaú BBA projeta que 2025 seja melhor para o milho. Esse ano, com a produção menor, as exportações do cereal devem fechar abaixo de 40 milhões de toneladas. Já no ano que vem, segundo o banco, deve atingir no mínimo 42 milhões de toneladas. Isso porque o Itaú BBA estima a produção total de milho no Brasil ainda maior que a Conab – prevê 125 milhões de toneladas.
Já os preços do milho devem seguir pressionados no mercado internacional, “mas longe do cenário de baixa que vimos esse ano, quando o bushel foi negociado abaixo dos US$ 4", avalia o analista de Inteligência de Mercado da StoneX, Raphael Bulascoschi.
Mesmo que a Bolsa de Chicago não mostre valorização significativa, no mercado do milho, ao contrário da soja, o mercado interno pesa bem mais. Os recordes na exportação de aves e suínos vêm garantindo demanda pelo cereal internamente. Além disso é cada vez maior a demanda pelo grão para fazer etanol.
Nos últimos dias, analistas destacaram que os preços futuros do milho em reais, para 2025, estavam no melhor patamar dos últimos dois anos, para entrega em julho, em Mato Grosso, sinalizando R$ 47 por saca.
O indicador Cepea termina 2024 com patamar melhor que dezembro de 23, quando estava abaixo de R$ 67 por saca. Essa semana está cotado próximo de R$73.
Para o analista de mercado Vlamir Brandalizze, 2025 tem sinais positivos para o milho porque os dados mais recentes do USDA indicam que haverá um déficit de 20 milhões de toneladas globalmente, ou seja, uma oferta menor que a demanda, cenário diferente do que tem sido projetado para a soja.
Etanol como aliado
Se por enquanto o cenário não é dos mais estimulantes, o que tem melhorado o ânimo do produtor de milho é a perspectiva de crescimento na produção de etanol de milho.
"No longo prazo vemos um cenário promissor, com o fortalecimento da produção de etanol de milho, que vai gerar um pouco mais de previsibilidade e aquecer a demanda", avalia Bertolini.
De olho nesse potencial, algumas empresas planejam a construção de usinas. É o caso da 3tentos, que anunciou em novembro a obtenção de financiamento de R$ 500 milhões junto ao BNDES para construção de uma usina de etanol de milho e sorgo na cidade de Porto Alegre do Norte (MT).
A Inpasa, que possui a maior usina de etanol de milho no país, em Sinop (MT), também anunciou investimento de R$864,23 milhões na ampliação da unidade. A companhia obteve autorização da Agência Nacional de Petróleo e Biocombustíveis (ANP) para produzir até 6 milhões de etanol anidro e hidratado por dia.
Segundo dados da ANP, até 2026, o Brasil deverá contar com 12 novas usinas de etanol de milho. A expectativa é de que o setor encerre 2024 com produção de 8 bilhões de litros, com meta de dobrar a produção e chegar a 16,65 bilhões de litros até 2030.
Outro projeto em andamento é do empresário Joci Piccini, que está investindo em duas novas usinas. O AgFeed mostrou este ano que, se considerados todos os anúncios já feitos, devem ser investidos R$ 20 bilhões em novas plantas de etanol de milho nos próximos três, anos.
O presidente da União Nacional do Etanol de Milho (Unem), Guilherme Nolasco, explica que além do aumento da produção, deve haver também uma pulverização das usinas para outras regiões. Atualmente as plantas estão concentradas em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Paraná, onde também estão os mercados consumidores.
Esse movimento deve contribuir para estimular o consumo do etanol de milho hidratado em outras regiões onde atualmente o produto acaba sendo pouco competitivo por conta dos altos custos logísticos.
Alguns projetos de usinas já estão em desenvolvimento em Balsas (MA), Luís Eduardo Magalhães (BA), no Piauí, e Rio Grande do Sul. Esse movimento, segundo Nolasco, deve promover mudança considerável na participação do etanol de milho.
“O produto deixará de ser um nicho de mercado consumido regionalmente e passará a ocupar cerca de 20% do mercado nacional de etanol", calcula.
A expansão no número de usinas também deve proporcionar maior previsibilidade para os produtores de milho, que terão demanda e melhores preços, estimulando o aumento do plantio nas regiões onde as indústrias se instalarem.
Outro aspecto que contribui para um horizonte positivo para o etanol de milho é a Lei 14.993/2024 sancionada em outubro, chamada de “combustível do futuro”, que prevê o aumento do percentual de etanol anidro misturado à gasolina variando entre 27% e 35%.
“Além do aumento da mistura ser benéfica para o setor, passamos a mensagem ao mundo de que os biocombustíveis são um elemento importante no processo de descarbonização do país", avalia Nolasco.
Ele destaca ainda que a desoneração de PIS e Cofins para o farelo e óleo de milho, cuja alteração na lei foi aprovada em julho, também foi outra vitória do setor, ao deixar os produtos mais competitivos.
Um ponto de atenção para a indústria do etanol é a oferta de biomassa no mercado. Enquanto uma usina leva em média dois anos para ser construída e começar a operar, o cultivo de eucalipto leva em média seis anos até o ponto de corte. "Há um descasamento entre a ampliação do setor e a oferta de biomassa", afirma Nolasco.
Em média, é preciso 350 quilos de biomassa para produzir uma tonelada de etanol de milho. Por isso, muitas empresas estão testando matérias-primas alternativas ao eucalipto, como a palha do milho, soqueira do algodão e até caroço de açaí.
“A oferta de biomassa é um ponto estratégico na decisão de investimento em uma nova biorrefinaria", pondera.
Infraestrutura ainda preocupa
Embora o cenário futuro para o milho e o etanol de milho indiquem perspectivas de expansão, o setor ainda esbarra em questões que podem ser um entrave à expansão dos negócios.
O primeiro deles está relacionado ao déficit de armazenagem para a produção, que afeta o agronegócio brasileiro há anos e não é uma questão exclusiva do milho. “O Brasil cresce em média 10 milhões de toneladas todos os anos e a capacidade de armazenagem cresce 5 milhões, portanto temos um déficit anual de 5 milhões de toneladas", explica Bertolini.
Ele explica que existe um déficit de 120 milhões de toneladas em capacidade estática de armazenagem no País e o milho sofre bastante com esse cenário. Para o executivo, parte da solução do problema passa pelo aumento da oferta de crédito.
“O PCA (Programa para Construção e Ampliação de Armazéns) não tem recurso suficiente, é preciso ampliar os programas e recursos para a infraestrutura", pondera.
Na ponta da logística, o setor também precisará encontrar caminhos para contornar o fim dos incentivos fiscais estaduais, que deverão deixar de existir em função da Reforma Tributária.
"Os incentivos fiscais ajudam a mitigar o custo logístico, com essa mudança, teremos que atacar o problema na sua raiz e um dos caminhos é a diversificação dos modais", avalia.
Ele explica que o setor precisará passar por um reposicionamento a fim de criar corredores de escoamento eficientes. Além disso, com a pulverização de usinas em outras regiões, será fundamental o posicionamento dessas unidades próximas dos pontos de escoamento, como portos, rodovias, ferrovias e hidrovias.
Enquanto a estrutura de armazenagem fica abaixo do que o Brasil precisa, analistas têm reforçado a necessidade do produtor escalonar vendas, travando a compra dos insumos de forma antecipada e aproveitando janelas de melhor preço para ir comercializando aos poucos, pelo menos parte da produção