Depois de muitas rodadas de negociações e idas e vindas dentro do Congresso, o agronegócio brasileiro esperava que o marco legal dos pesticidas, também conhecida como “lei dos agrotóxicos” voltasse do gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sem alterações, após aquelas já acordadas para viabilizar a aprovação pelos parlamentares.

Mas a palavra “surpresa” é a primeira que aparece nos posicionamentos das entidades que representam o setor ao tratar dos vetos feitos pelo presidente Lula na Lei 14.783, que regula toda a cadeia de comercialização e fiscalização de defensivos químicos agropecuários.

Publicada no Diário Oficial da União da quinta-feira, 28 de dezembro, a versão sancionada pelo presidente traz uma série de vetos que desagradou parlamentares e empresas, por retroceder em relação ao que havia sido pactuado no Congresso.

“Vamos trabalhar contra esses vetos”, afirmou ao AgFeed o deputado Arnaldo Jardim, vice-presidente da FPA. Ele afirmou que a entidade que reúne parlamentares ligados ao setor ainda deve fazer uma análise mais profunda dos vetos para apenas em janeiro emitir uma posição institucional, mas já adiantou que a tendência é de se caminhar para a revisão da decisão de Lula através da derrubada desses vetos.

A CropLife Brasil, entidade que representa as empresas do segmento de insumos, se manifestou por meio de nota e foi na mesma linha. No documento, afirma que já está em contato com membros da Frente Parlamentar da Agropecuária “para futura apreciação dos vetos presidenciais pelo Congresso Nacional”.

Tanto o parlamentar quanto a CropLife manifestaram surpresa com os vetos. “A versão original trazia avanços institucionais fundamentais para que o agronegócio seguisse com acesso às inovações tecnológicas presentes em diversos países produtores agrícolas mundiais”, disse a CropLife em sua nota.

O veto mais questionado diz respeito à coordenação de processos de reanálises de pesticidas pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Segundo o presidente Lula, esse ponto tiraria poder da Anvisa e do Ibama na avaliação sobre riscos para a saúde e o meio ambiente dos produtos.

Sobre o ponto da reanálise, em seu veto, o presidente Lula afirma que ter o Mapa como único braço governamental a atuar no processo é “inconstitucional”.

“A inovação legislativa permitiria que, após o registro do agrotóxico, o seu fabricante alterasse significativamente o conteúdo do produto registrado sem o aval da Anvisa e do Ibama”, diz o texto que justifica o veto.

A Croplife contestou essa visão. “A liderança do MAPA garantiria maior previsibilidade para o setor privado e eficiência para a administração pública, sem renunciar aos rígidos critérios técnico-científicos dos órgãos de saúde, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), e do meio ambiente, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recurso Naturais Renováveis (IBAMA)”, diz a nota.

Segundo a entidade, outro veto “relevante e injustificável” foi no ponto que dispensava a gravação da marca da empresa e da advertência sobre a proibição de reutilização da embalagem em alto relevo na embalagem dos produtos.

“Atualmente, o Brasil possui um dos sistemas mais avançados de logística reversa do mundo, com destinação de 93% das embalagens usadas para reciclagem controlada. O veto representa, portanto, apenas custo adicional sem qualquer benefício ao meio ambiente”, diz a CropLife.

O governo alega que a dispensa da gravação da marca vai contra o interesse público, já que o fim do destaque da advertência sobre reutilização poderia aumentar o risco de reuso das embalagens de pesticidas.

O presidente Lula vetou ainda a criação de uma taxa para registro de agrotóxicos, justificando que o mecanismo foi criado sem que no Projeto de Lei conste a alíquota e a base de cálculo para a taxa.

A CropLife lembra que os recursos seriam direcionados para investimento na estrutura das agências regulatórias e na melhoria da fiscalização de defensivos químicos.

A entidade lembra ainda que vários pontos relevantes aprovados na Câmara dos Deputados já haviam sido excluídos na Comissão de Meio Ambiente do Senado, para que o PL pudesse ser aprovado.

“Por tudo isso, nossa expectativa era de que o projeto, que representava o resultado de um debate democrático que envolveu diversos setores da sociedade ao longo dos últimos 24 anos, fosse aprovado na íntegra pela Presidência da República”, diz a entidade.

Arnaldo Jardim segue na mesma linha. Ele lembra que, diferentemente da derrubada dos vetos de Lula ao Marco Legal das Terras Indígenas, aprovada pelo Congresso há duas semanas, no caso da lei dos pesticidas houve um longo processo de negociação para que houvesse consenso entre a bancada da FPA e a base do governo.