Quando alguns aventureiros montaram pequenas usinas de etanol de milho no interior de Mato Grosso, há 10 anos, eram vistos com muita desconfiança.
Mas a história mostrou que estavam certos e a produção não parou de crescer desde então, avançando mais de 1000% somente nos últimos 5 anos.
Na carona vieram os subprodutos. O principal deles é o DDG (sigla que vem do inglês, Dried Distillers Grains, que significa grãos secos de destilaria), insumo para ração animal.
O Brasil historicamente produzia etanol a partir da cana de açúcar, mas a expansão da segunda safra de milho, plantada na mesma área de soja, porém durante o inverno, fez explodir a produção do grão no país, aumentando as exportações do grão e a competitividade da produção do biocombustível e seus derivados.
Uma tonelada de milho processada nas usinas rende em média de 441 litros de etanol, 20 kg de óleo vegetal e 224 DDG, produto que conquistou pecuaristas e a indústria de ração como ingrediente para fornecer alta performance na nutrição animal.
Tornou-se insumo valioso no Brasil, que lidera a exportação mundial de carne bovina, aparecendo entre os maiores fornecedores globais de proteína.
O passo mais recente deste cenário de crescimento é a movimentação das usinas de etanol para que o DDG seja também um produto importante na exportação.
Em entrevista ao AgFeed, o presidente-executivo da União Nacional do Etanol de Milho (Unem), Guilherme Nolasco, confirmou que a intenção é expandir a produção de DDG dos atuais 4 milhões de toneladas para 8 milhões de toneladas em 2030 e espera exportar pelo menos 30% deste volume.
“Fizemos um amplo levantamento de dados sobre nosso setor e selecionamos oito mercados potenciais no mundo que podem importar o nosso DDG”, diz Nolasco.
“Por isso em 2022 procuramos a Apex (Agência de Promoção de Exportações e Investimentos do Brasil) para estruturar um projeto com foco no mercado internacional”.
A Unem deve assinar em breve uma parceria com a Apex. Pelo acordo, metade do custo com estudos de mercado e campanhas de promoção do DDG brasileiro será custeada pelo setor privado e a outra parte com recursos públicos.
No primeiro ano serão investidos R$ 2,5 milhões e a intenção é seguir renovando com novos aportes bianuais, de acordo com o presidente da Unem.
A exportação brasileira de DDG até agora é muito pontual e praticamente concentrada em apenas uma empresa, a Inpasa, que possui usinas em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além de instalações no Paraguai.
O gerente comercial da Inpasa, Daniel Sarmento, diz que a empresa se destaca na produção do DDGS, que tem um processo industrial diferente, bastante alinhado com o que procura o mercado externo, o que facilitou a exportação.
O DDGS, de acordo com a Inpasa, possui elevada concentração de minerais, teor de proteína de 30%, alto conteúdo de metionina, vitamina B, além de outros ingredientes, o que vem garantindo resultados diferenciados na alimentação animal.
Segundo Sarmento, são produzidas 4 mil toneladas de DDGS por dia, sendo que 1 mil toneladas são exportadas.
A empresa começou no Paraguai, onde já fazia negócios de exportação, o que também favoreceu para que fosse a primeira a exportar o produto brasileiro.
O AgFeed apurou que a FS Bionergia, que junto com a Inpasa responde pela maior parte do mercado, também já estaria iniciando a exportação, especialmente em 2023.
O fato é que o mercado aquecido aparece em números: há 20 usinas de etanol de milho em operação no país, com capacidade instalada de 6 milhões de metros cúbicos por ano.
Outras 8 plantas estão em fase de autorização para construção, o que vai adicionar mais 900 mil metros cúbicos nesta conta. Segundo a Unem, há uma previsão de investimentos de R$ 15 bilhões na construção de novas usinas de etanol de milho no Brasil até 2030;
Mato Grosso é o líder na produção de etanol e também no DDG. O estado deve produzir 1,7 milhão de toneladas do insumo na safra 2022/23 e a produção brasileira de DDG está estimada em 2,43 milhões de toneladas.
Fator China
O início das exportações de milho em grão para a China deve refletir em diversas outras cadeias, inclusive no DDG, que chegou a ser pauta das conversas da comitiva do governo brasileiro em viagem recente ao país asiático.
Em 2022 o Brasil exportou 278 mil toneladas, com receita de US$ 91 milhões. Em 2017 quando foram registrados os primeiros embarques eram apenas 4,7 mil toneladas e US$ 2,9 milhões faturados, mas para os próximos anos é esperado um grande salto.
“A China é um mercado consolidado. Os EUA já chegaram a vender 7 milhões de toneladas de DDG por ano para lá e hoje não exportam mais nada por causa de relações internacionais conturbadas”, afirma Nolasco, da Unem.
“É um uma oportunidade para o Braisl, mas também estamos de olho em países como Turquia, Nova Zelândia, Arábia Saudita, Irã e Tailândia”, revela.
Vantagens na pecuária
O analista da Scot Consultoria Eduardo Torres concorda com o cenário otimista. “Já somos grande produtor e exportador de milho em grão e, com a abertura à China ao fim de 2022 acelerando a exportação, o processo para embarque de outros produtos derivados do milho ou do seu processamento também poderá ser beneficiado”, afirma.
Segundo Torres, durante a pandemia e todo o cenário de menor demanda por combustíveis, a produção de etanol de milho cresceu, muito em função dos bons preços do DDG.
“Atualmente, o setor concentra-se praticamente em fornecer insumo à pecuária de corte e leite, mas seu uso à avicultura e suinocultura não está descartado, sendo usual nos Estados Unidos. Com isso, abre-se espaço para outros mercados e um cenário de preços e interessantes ao mercado de DDG no país”, disse Torres.
O DDG tem sido considerado uma nova opção para alimentação dos animais não apenas pela questão nutricional, mas também pelo impacto nos custos, já que pode substituir outros produtos como soja, milho e caroço de algodão.
No o valor do produto registrou média de R$1.331/tonelada, enquanto o milho ficou R$1.058/tonelada, o que parece não ser vantajoso. Mas há uma explicação para a maior competitividade.
“O teor proteico dos dois produtos é bem diferente. Quando a gente calcula a relação de custo por Proteína Bruta, o DDG é 64% mais barato que o milho, com valor de R$4,76 por kg de proteína bruta, enquanto o milho custa R$13,10/kg de proteína bruta”, calcula a Coordenadora de Desenvolvimento Regional do Instituto Mato Grossense de Economia Agropecuária (Imea), Vanessa Gasch.
*Com informações de Alessandra Mello