Já existe tecnologia no mercado capaz de gerar colheitas com mais de 130 sacas de soja por hectare. E, mesmo assim, a média nacional ainda gira em torno dos 60.

O que separa esses dois números não é apenas genética, clima ou manejo. O que separa esses dois mundos é informação e a capacidade de usá-la com precisão.

Estamos entrando na era da terceira safra do agronegócio. Depois da safra e safrinha, surge a safra de dados, silenciosa, mas essencial.

Ela não acontece no campo visível, mas no invisível, nas prescrições personalizadas, nos algoritmos de recomendação, nos históricos de talhão.

No agro, o desafio não é coletar dados, e sim transformá-los em decisões, como dosagem, escolha de híbrido, janela de plantio e manutenção preditiva.

Um exemplo real dessa nova safra de dados vem do episódio do Rural Evolution com a produtora Lígia Pedrini e a startup B4A.

Ao perceber que os desafios da sua fazenda iam além da análise química e física do solo, Lígia adotou o diagnóstico metagenômico da B4A, que usa DNA para mapear a microbiologia do solo.

A tecnologia permitiu identificar com precisão a presença de organismos como nematóides, ajustar o uso de insumos biológicos e evitar gastos desnecessários com produtos genéricos.

Mais do que dados, ela recebeu recomendações práticas baseadas na realidade do seu sistema de produção. O resultado? Maior produtividade, mais saúde do solo e decisões embasadas, que convenceram até gerações anteriores da família a apostar no novo.

É nesse tipo de inteligência aplicada que a terceira safra começa a ser colhida.

A safra de dados só será colhida quando a informação for útil, prática e personalizada para a realidade de cada produtor.

A tecnologia já entrega um potencial produtivo altíssimo. Mas ele é desperdiçado quando usamos recomendações genéricas. Uma mesma semente pode performar de forma completamente distinta dependendo de onde, como e quando for utilizada.

Por isso, capturar dados no campo, da semeadura à colheita, deixou de ser uma opção. Virou requisito para a eficiência.

Mais do que isso, virou requisito para competir.

Paul Graham tem uma frase que define bem esse novo momento: “Relentlessness wins” (algo como “ser implcável leva à vitória”, em uma tradução livre). No agro, essa obsessão aparece na calibragem fina da curva de semeadura, na pressão da plantadeira, nas micro correções de adubação via VRA, na manutenção preditiva do maquinário.

São os detalhes invisíveis que, acumulados ao longo da safra, explicam a diferença na produtividade. Como ele diz em Hackers & Painters, é a devoção fanática aos detalhes que gera o impacto “estonteante”. No campo, isso é gestão com dados.

Estamos vivendo, também, uma mudança geracional. A sucessão familiar no agro está em curso. E, com ela, chegam aos comandos das fazendas profissionais nativos digitais, pessoas que tomam decisões com base em números, benchmarks e dashboards.

Para essa nova geração, o serviço importa mais do que o produto. A entrega vale mais do que a marca. E a precisão conta mais do que o discurso.

Isso muda tudo.

Empresas tradicionais, que cresceram com base na força da distribuição e no poder da marca, precisarão rever seu papel no ecossistema. Porque a disputa de hoje não é mais por território, e sim por confiança, agilidade e entrega. E o custo da inércia pode ser alto.

Em um mundo onde a inteligência artificial encurta o delta de tecnologia entre empresas grandes e novas entrantes, a vantagem não está mais no tamanho. Está na velocidade de adaptação.

Esse novo jogo é mais complexo, e, paradoxalmente, mais simples. Menos é mais. Não se trata de oferecer tudo para todos, mas o certo para cada um. Eficiência virou obrigação. E, com ela, veio a complexidade. Tornar a tecnologia útil, simples e invisível virou o maior desafio da década.

O agro, que já fornece alimento ao mundo, agora precisa aprender a nutrir decisões com dados. Porque é nessa terceira safra que estará a próxima grande vantagem competitiva do setor.

Fernando Rodrigues é fundador da Rural.com.vc.