O tarifaço de Donald Trump está promovendo um redesenho do comércio global e impactando diferentes setores. Para a pecuária brasileira, esse novo cenário traz uma expectativa que deve se mostrar muito positiva no curto prazo.

Com o tarifaço, a carne bovina americana tende a ser menos exportada e consumida prioritariamente naquele próprio mercado. Isso reduz a presença dos EUA no cenário global de exportação, criando uma janela de oportunidades para países que já têm estrutura e qualidade reconhecida, caso do Brasil.

A tecnologia tropical de produção de bovinocultura desenvolvida aqui é muito mais eficiente — e, vale registrar, credora de gases efeito estufa. Hoje, os Estados Unidos operam com uma das arrobas mais caras do mundo, comercializada por cerca de US$ 100. Enquanto isso, aqui, a arroba gira em torno de US$ 50. Ainda assim, o rebanho por lá vem diminuindo, enquanto a atividade brasileira vem crescendo e se intensificando.

Apesar da enorme diferença de custo, os EUA rivalizam com o Brasil a condição de maior exportador de carne bovina. Isso só é possível por contar, em seu favor, com acordos internacionais e barreiras não tarifárias (regulamentações técnicas e fitossanitárias, muitas vezes de mero objetivo protecionista).

Diante dessa nova realidade do comércio global, tais barreiras contra o produto brasileiro tendem a ser flexibilizadas. Em isso acontecendo, a competitividade de custo ampliará nossa posição em mercados que já atuamos, como China e Oriente Médio, e em novos mercados a explorar, como Japão, Coreia do Sul e União Europeia, destinos que inclusive melhor remuneram a carne bovina.

Ao longo do tempo, isso significará não apenas crescimento em volume exportado, mas também reconhecimento e valorização ainda maiores do nosso produto.

Como exemplo recente, a tonelada de carne bovina para China, destino com barreiras flexibilizadas ao nosso produto, era negociada a US$ 4,8 mil antes do tarifaço. Agora, já há relatos de negócios a US$ 6,3 mil.

É importante destacar que o setor pecuário brasileiro já é um dos maiores players globais. Dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontam que, em 2024, o país alcançou recorde de animais abatidos, com 10,91 milhões de toneladas.

Ainda conforme a entidade, os embarques para exportação também foram recordes, chegando a 3,78 milhões de toneladas, sendo a China o principal destino. Para 2025, a demanda continuará em alta, podendo chegar a 3,86 milhões de toneladas exportadas, segundo previsões anteriores a esse novo evento do tarifaço.

Por outro lado, precisamos ficar alertas para os desafios a longo prazo. A redução do comércio mundial provocada pela política protecionista de Trump pode impactar negativamente o crescimento econômico global.

Com menos trocas comerciais, a tendência é de uma desaceleração econômica, o que pode resultar em menor renda e, por conseguinte, menor demanda por commodities, incluindo a carne bovina. Ainda assim, se as barreiras não forem levantadas contra o Brasil, teremos ganhado volume, novos mercados e participação no comércio mundial desse produto.

Esse momento mostra como a pecuária brasileira pode se beneficiar de um cenário de mudança internacional. Com um produto competitivo e de qualidade reconhecida, temos a chance de ocupar um espaço ainda mais importante no comércio global.

Para isso, precisamos manter o foco na eficiência, no cumprimento de exigências sanitárias, na sustentabilidade da nossa cadeia produtiva e numa diplomacia comercial ativa, que continue a promover os interesses nacionais mantendo boa relação com todos os países do globo.

Em resumo, o Brasil vem se consolidando como um provedor de alimento seguro em escala para a segurança alimentar global. Desde os anos 2000, com destaque para a soja e carne de aves. Provavelmente agora com a carne bovina (e energias renováveis).

João Antônio Fagundes é CEO do Grupo Raça Agro e especialista do mercado pecuário.