Estudo conduzido por pesquisadores do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) identificou que apenas o investimento em tecnologia não será suficiente para melhorar a produtividade e a rentabilidade do agronegócio nos próximos anos.
Para que a produção acompanhe o crescimento da demanda por alimentos será necessário ampliar os investimentos em prevenção e combate aos impactos das alterações do clima.
Segundo os pesquisadores Jayson Beckman, Fengxia Dong, Maros Ivanic, Jonas Jägermeyr e Nelson Viloria, a elevação da temperatura global e das condições extremas do clima – com maior aridez do solo em algumas regiões e aumento das precipitações e enchentes em outras áreas – tendem a se intensificar, impactando diretamente não apenas a produtividade, mas também a rentabilidade das colheitas e os níveis globais de comércio.
“Ao longo da história, a produção agrícola tem sido resiliente e capaz de fornecer alimentos necessários para atender a demanda global. No entanto, os níveis de produtividade são altamente dependentes do clima”, menciona o estudo, divulgado na semana passada.
Os dados da pesquisa mostram que a produção agrícola global aumentou consistentemente em taxas médias de 2% ao ano entre as décadas de 1960 e 2010, quando o ritmo diminuiu para uma média de 1,93% ao ano. E a tendência, a partir de agora, é continuar desacelerando à medida em que as estimativas para as condições climáticas pioram.
Associadas às projeções de aumento populacional – que tende a sair dos atuais 8 bilhões de pessoas para 11 bilhões até 2050 -, colocam em risco a regularidade da oferta, impactando inclusive a disponibilidade de água para projetos de irrigação.
“A expectativa de crescimento populacional exige muito mais alimento e aumento da produção agrícola, que conseguiu se expandir nas últimas décadas com investimento em tecnologia para aumentar a produtividade”, lembram os pesquisadores.
Mas o contexto de maior adversidade do clima modifica esse cenário, pois reduz a resiliência da produção, compromete a produtividade de culturas como soja, milho, trigo e arroz – e consequentemente, o abastecimento de insumos para a produção das proteínas animais - e até de energia limpa.
O estudo traz alguns exercícios sobre o impacto das alterações do clima em quatro commodities consideradas essenciais para a alimentação global - soja, milho, trigo e arroz. Uma das estimativas considera que um aumento de 2ºC na temperatura média global entre 2029 e 2058, por exemplo, resultaria em redução de 3,3% na produção global de arroz, de 3,6% na soja, de 7% no trigo e 8,6% no milho.
Esses modelos climáticos, alertam os pesquisadores, subestimam o potencial de declínio da produção, pois não consideram o contexto de cada região – ou seja, níveis de umidade do solo e de chuvas, capacidade de evaporação da água da chuva, infiltração e escoamento – além dos riscos de calor extremo e seca severa, como já vem sendo registrado em algumas regiões do Brasil e de outros países.
No caso específico do milho, utilizado para alimentação humana, produção de ração animal e geração de energia (etanol de milho), o impacto é mais severo porque o aquecimento global e a probabilidade de condições climáticas extremas como secas e inundações, têm efeitos mais significativos na produtividade das lavouras dos países que lideram a comercialização e produção global da commodity quando comparado com outras culturas.
De acordo com o USDA, no momento de realização do estudo (2021), os principais produtores de milho com base na alocação de terras foram a China (43,3 milhões de hectares), Estados Unidos (34,5 milhões de hectares) e Brasil (21,8 milhões de hectares), que responderam por 48% da área global de cultivo do grão.
Os pesquisadores apontam que os Estados Unidos tinham, até então, a maior produtividade por hectare - cerca de 11,1 toneladas métricas/ha, enquanto Brasil e China registraram 5,3 toneladas/ha e 6,3 toneladas/ha, respectivamente. “Mas as alterações climáticas tendem a impactar mais severamente a produtividade do milho dos EUA”, dizem.
Os dados dos modelos estatísticos que traçam as estimativas do estudo indicam que a produtividade do milho nos EUA diminuirá 26,1% em 2050, enquanto no Brasil será de 6,7% e na China, de 18%. Simulações similares foram realizadas com soja, arroz e trigo - este último, mais adaptado ao clima seco.
No caso da soja, as estimativas são de que Brasil e Argentina consigam manter taxas de produtividade e rentabilidade das lavouras, enquanto Estados Unidos e China acumulem perdas. Cenário similar é traçado para o arroz, com China e Índia mantendo boas taxas de produtividade - e outros países produtores perdendo em rentabilidade e área plantada.
Esse é um cenário que, segundo os pesquisadores, pode levar a um déficit na oferta de alimentos, à medida em que a demanda cresce e a oferta diminuiu – seja porque haverá uma redução de áreas próprias para cultivos (impactadas por seca ou chuva extremas) ou porque a perda da produtividade e da rentabilidade resulte em menos investimentos por parte dos produtores em algumas commodities.
“Esse cenário não traz um problema apenas para os níveis de produtividade e para as taxas de comercialização das principais commodities, mas também para o preço dos alimentos e, em última análise, para a própria segurança alimentar”, conclui o estudo.