A medição da produção de etanol no Brasil tem um ponto geográfico muito determinado. O chamado Centro-Sul inclui os dois maiores produtores de cana-de-açúcar do país, os estados de São Paulo e Minas Gerais. Já o Centro-Oeste, sobretudo Mato Grosso, puxa a tendência de investimentos bilionários na produção do etanol de milho.

Mas a realidade está mudando, principalmente nesse segundo universo, com o surgimento de novas plantas que utilizam o milho como matéria-prima para a produção de biocombustíveis. Essa é a observação feita pelo presidente da associação sucroalcooleira exatamente do segundo maior estado produtor do etanol de cana.

Segundo Mário Campos, presidente da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (Siamig), novos projetos de usinas têm sido anunciados em estados que antes estavam distantes deste mercado, como Maranhão, Piauí, Bahia, Alagoas e até o Rio Grande do Sul.

“Há uma expectativa de que a produção de etanol de milho chegue a 10 bilhões de litros em 2030. Acredito que essa marca possa ser antecipada”, projeta Campos.

O presidente da Siamig ressalta que somente o milho contribuiu com 6 bilhões de litros de etanol em 2023. Para este ano, a expectativa é que a produção fique próxima de 7 bilhões de litros.

Toda essa diversidade geográfica é e será viabilizada pelo milho, afirma Campos. “O Mato Grosso do Sul começou essa tendência de usina ‘flex’, que faz etanol tanto de cana quanto de cereais. E temos vários anúncios pelo Brasil, como no Rio Grande do Sul, que nunca produziu etanol”.

No final da semana passada, a Be8 anunciou a liberação pelo BNDES de um financiamento de quase R$ 730 milhões para a construção de uma planta para produção de etanol na cidade gaúcha de Passo Fundo, com capacidade para 210 milhões de litros do produto por ano, o equivalente a 20% de toda a demanda do estado.

Toda essa produção da Be8 terá como origem cereais como milho e trigo, e a planta vai produzir também farelo e até mesmo glúten vital, obtido a partir da farinha dos cereais.

No Oeste da Bahia, até mesmo empresas não diretamente ligadas ao agronegócio decidiram investir no biocombustível à base de milho. A distribuidora Petrobahia, dona de uma rede de postos na região Nordeste, anunciou em fevereiro a disposição de aportar, juntamente com parceiros, um montante de R$ 908 milhões em um projeto para colocar em operação a primeira planta para produção de etanol a partir do grão no estado.

Para Campos, esse é o exemplo da forma como deve crescer a produção de etanol no Brasil nos próximos anos. “Será uma expansão mais racional e verticalizada. Principalmente agora, que muitas empresas conseguiram sanear seus problemas financeiros”, diz ele, referindo-se, sobretudo, à melhoria do cenário corporativo no segmento sucroenergético..

A Siamig é uma das entidades participantes do movimento Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil, que em março apresentou um estudo sobre os caminhos para diminuir as emissões de gases de efeito estufa na indústria automobilística e no transporte público.

Neste contexto, segundo Campos, o estado de Minas Gerais tem um papel cada vez mais relevante. No ano passado, as 36 usinas mineiras moeram mais de 80 milhões de toneladas de cana, utilizadas tanto para produção de açúcar quanto de etanol.

Para 2024, Campos afirma que a expectativa é de ampliação de 9% na área plantada. “Muito por conta das novas tecnologias utilizadas, com plantas mais adaptadas à região e da melhor produtividade”.

O governo de Minas tem a meta de chegar à marca de zero emissão líquida de carbono em 2050 e toda a frota pública de carros é abastecida com etanol. “Até os carros do Sebrae/MG são movidos a etanol”, afirma Campos.

Mas para o presidente da Siamig, o poder público precisa incentivar o uso de etanol pelos consumidores de uma outra forma. “Precisamos de uma política tributária mais direcionada para o etanol”.

Para Campos, a reforma tributária é a grande oportunidade para que o Brasil trate o etanol e outros biocombustíveis de forma realmente distinta em relação à gasolina. “A produção de petróleo ainda é muito subsidiada e incentivada no mundo. No Brasil também é assim. É necessário mudar isso”, diz o executivo.

Outro ponto da verticalização citada pelo presidente da Siamig é a produção de energia. “Em Minas Gerais, das 36 usinas, 25 vendem energia para o mercado. No período mais seco, essas unidades chegam a ser responsáveis por até 15% de toda a energia consumida no estado”, conta.

O biometano também é apontado por Campos como parte relevante da produção, especialmente quando se pensa na descarbonização de toda a cadeia produtiva do setor sucroalcooleiro, como potencial substituto do diesel como combustível para o transporte de cana.

“O biometano vai ganhar mais força a partir da aprovação do Projeto de Lei do Biocombustível do Futuro. Somente com a aprovação na Câmara dos Deputados, já foram retomadas conversas sobre investimentos na produção do gás. Não é um produto que gere tanto retorno, mas é importante principalmente quando se pensa em economia circular, de aproveitamento total dos materiais orgânicos”, explica Campos.