Diante de margens apertadas e da dificuldade de transição de comando nas empresas, o futuro do mercado de leite pode estar na consolidação dos pequenos e médios laticínios. Essa é a conclusão da Equus Capital, gestora especializada em fusões e aquisições, que também atua com consultoria estratégica para médios laticínios.
Atuando como consultora estratégica e financeira de empresas desse segmento, a Equus concluiu recentemente um diagnóstico das tendências e encontrou um cenário de contrastes.
Resumo
- Estudo da gestora mostra que setor de fabricação de laticínios registrou, no ano passado, 266 aberturas líquidas de empresas
- Margens apertadas e dificuldade de sucessão nas empresas, entretanto, dificultam a continuidade dos negócios
- Com isso, demanda por consultoria em fusões e aquisições tem aumentado, sobretudo por parte de família que atuam no segmento
De um lado, em todo o País, o setor de fabricação de laticínios registrou, no ano passado, 266 aberturas líquidas de empresas, mesmo com uma série de desafios.
Por outro lado, um passo atrás na cadeia, o subsetor de preparação do leite foi o único a registrar saldo negativo, com 26 fechamentos líquidos. “A preparação primária de leite enfrenta cada vez mais exigências regulatórias e aumento de custos, o que pressiona pequenos produtores e dificulta a sobrevivência de negócios de menor porte”, afirma Felipe Vasconcellos, sócio da Equus Capital, em entrevista ao AgFeed.
Assim, ele e sua equipe têm vivido dias de maior demanda para assessorar empresários em fusões e aquisições, atendendo principalmente famílias. “Muitas nos procuram justamente para pedir essa ajuda. Não sabem como fazer e muitos começam devagarzinho, com dúvidas do tipo ‘Quanto é que vale a minha empresa?’ A maior parte não sabe e acha que vale o valor da terra, por exemplo”, diz.
Os dados e a intensa procura revelam, segundo Vasconcellos, a chegada de uma nova fase da consolidação do mercado brasileiro do leite. A primeira envolveu grandes grupos como a francesa Lactalis, dona de marcas conhecidas dos consumidores como Parmalat, Itambé, Batavo e Président, que já era um gigante em seu país e se transformou em uma potência também no Brasil, onde chegou há pouco mais de uma década, em 2013.
De lá para cá, os franceses investiram cerca de R$ 5 bilhões no Brasil, fazendo aquisições de diferentes laticínios e marcas, que fizeram a companhia liderar o mercado nacional. Hoje, a Lactalis tem 2,7 bilhões de litros, emprega 13 mil pessoas e opera 22 fábricas em oito Estados brasileiros.
Depois desse movimento focado em um crescimento de marcas, a tendência mudou, diz Vasconcellos. Ele trabalhou por quase uma década na gestora Tarpon e participou da captação do fundo que criou a Rumina, empresa que fornece soluções de gestão para pecuaristas e que é controlada pela 10b, da Tarpon.
“Multinacionais como a Lactalis e outras empresas do setor estão menos preocupadas agora em adicionar, necessariamente, novas marcas para o seu portfólio. Agora, a competição está um pouco menos nas marcas, mas principalmente no fornecimento de leite, nas bacias leiteiras”, afirma.
Ao comprar laticínios regionais, na avaliação de Vasconcellos, os concorrentes conseguem adicionar novas marcas ao seu portfólio ao mesmo tempo em que dominam bacias leiteiras regionais.
"Mesmo que o leite, por exemplo, produzido no interior de São Paulo, não chegue até a capital, essa estratégia é crítica até para evitar que o concorrente compre. Caso contrário, ele terá acesso a mais leite do que você", afirma.
Notícias Relacionadas
Vasconcellos explica que hoje há uma combinação de fatores que permitem a venda dos laticínios médios para grandes grupos.
"Trabalhando há mais de 15 anos com esse assunto, entendi que as pessoas geralmente vendem por três motivos: falta de condições de saúde ou sucessores para o negócios, dificuldades em manter o crescimento do negócio após atingir um pico e aproveitar o momento certo de venda para conseguir um preço melhor. Hoje, esses três motivos estão caminhando juntos", diz o sócio do Equus Capital.
Vasconcellos, explica que, atualmente, muitos produtores já não conseguem fazer a sucessão de suas propriedades para os filhos. "Todos têm herdeiros, mas não têm sucessores. Em grande medida, filhos dos donos de laticínios não querem seguir o negócios dos pais, querem ter outras profissões: dentista, psicólogo, arquiteto, qualquer outra coisa que não seja tocar o laticínio."
Além disso, há um movimento de laticínios em dificuldades de seguir crescendo com a concorrência das grandes companhias do setor.
“Ele começa a perceber que está tendo cada vez mais dificuldade de comprar leite no mercado para produzir o produto e está enfrentando cada vez mais competição nas gôndolas também, porque o produto que antes não chegava começou a chegar e porque entrou um cara maior. Ele pensa: ‘Talvez se eu não vender hoje, eu vou vender mais barato depois. Então eu deveria aproveitar esse momento.’”, diz Vasconcellos.
Além disso, ele lembra que os grandes players do setor têm acesso a ferramentas de crédito que laticínios pequenos e médios não conseguem acessar da mesma forma.
"O empresário às vezes não tem dinheiro, precisa tomar crédito e não consegue, enquanto que a Lactalis, por exemplo, eventualmente emite dívida em euro na França e transfere para o Brasil", afirma o sócio da Equus Capital.
No momento, a gestora atende dois clientes do setor de laticínios. A Equus também empresas do setor de biocombustíveis como clientes. A gestora tem ainda um fundo de venture capital, que investe apenas em empresas do setor de internet das coisas e inteligência artificial. Quanto a investimentos novos no agronegócio, Vasconcellos despista: “Tenho planos, mas ainda não posso compartilhar.”