Cuiabá (MT) - Uma tonelada de milho que entra numa usina de etanol dá origem a cerca de 450 litros do biocombustível. O resíduo dessa operação, porém, tem se tornado cada vez mais atraente para as empresas que processam o grão.
Como subprodutos dessa mesma tonelada, as usinas obtêm cerca de 151 quilowatts hora de energia elétrica, 19 quilos de óleo de milho e mais 212 quilos de DDG, (sigla que vem do inglês, Dried Distillers Grains, que significa grãos secos de destilaria), um importante insumo para ração animal.
Essas três letras têm ajudado a mudar o paradigma da pecuária brasileira, já que fornecem uma fonte para alta performance na nutrição animal.
Graças aos vultosos investimentos em novas plantas industriais para a produção de etanol de milho, a produção brasileira atual de DDG, que beira as 4 milhões de toneladas, deve dobrar até 2030, segundo estimativas da União Nacional do Etanol de Milho (Unem).
Desse montante, pelo menos 30% deverá ser exportado – o mercado de vendas externas já começa, ainda que em passos mais tímidos, a ganhar uma escala importante.
Segundo Andrea Veríssimo, gerente de Relações Internacionais da Unem, as exportações de DDG têm crescido exponencialmente nos últimos anos. Em 2022 foram 279 mil toneladas vendidas com uma receita de US$ 91 milhões. No ano passado, o montante bateu os US$ 181 milhões com 609 mil toneladas.
Entre janeiro e fevereiro de 2024, o faturamento já atingiu R$ 32 milhões, segundo dados da UNEM. Na média de 2024, foram R$ 16 milhões por mês, e numa conta simples, sem considerar variáveis e sazonalidades, somaria em doze meses algo em torno de R$ 192 milhões se as vendas continuarem nesse ritmo.
Veríssimo conversou com o AgFeed durante a Conferência Internacional Unem Datagro sobre Etanol de Milho, em Cuiabá, e pontuou que a entidade olha para esse horizonte de vendas com muita atenção.
Durante o evento, a Unem apresentou uma nova marca para divulgar o DDG fora do Brasil. Feito em parceria com a Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), a marca “Brazilian Distillers Grains” será utilizada para falar do DDG mundo afora.
“Vamos diferenciar o nosso produto frente o americano e mostrar que o DDG está relacionado à segurança energética e alimentar. Nas reuniões, também falaremos sobre a circularidade dessa economia que envolve a produção de etanol de milho como combustível renovável”, afirmou.
Enquanto o Brasil é conhecido pelo etanol de cana, os EUA já produzem há décadas o biocombustível feito de milho. A diferença é que, por aqui, as indústrias utilizam na sua matriz energética a biomassa, que geralmente vem do cavaco de eucalipto.
Nos Estados Unidos, a fonte da energia é o gás natural. Essa diferença traz uma pegada de carbono menor para o etanol de milho brasileiro quando comparado ao americano.
O logo da marca usa cores verdes e douradas e, segundo Veríssimo, essa estrutura “green to golden” quer mostrar o valor que os grãos possuem. “Não queríamos uma identidade que só remetesse ao milho”, afirmou.
Dentro de duas semanas, uma comitiva da Unem embarca para o Vietnã em missão comercial. O país asiático foi o destino de 43% das exportações de DDG pelo Brasil em 2023 e foi mapeado pela entidade como um dos principais mercados potenciais para vendas.
Além dele, a instituição olha com bons olhos para os mercados da China, Indonésia e Tailândia, na Ásia, e Espanha, Reino Unido, Turquia e Nova Zelândia, ao redor do globo.
As principais empresas do setor de etanol de milho, FS e Inpasa, aproveitam o boom do mercado do biocombustível para também dar tração às vendas de DDG.
A Inpasa produz atualmente 1,8 milhão de toneladas de DDG por ano e, segundo Rafael Ranzolin, vice-presidente da empresa, a ideia é passar das 3 milhões de toneladas com as novas plantas da empresa, que devem ficar prontas até o primeiro trimestre de 2025.
Nesse mix, algo entre 30% e 40% são vendidos para o mercado externo. “O DDG está em uma escala ascendente junto com o etanol de milho, pois um não pode ser produzido sem o outro. E o mercado internacional é promissor ao extremo”, afirmou.
Na FS, segundo dados do balanço referente ao terceiro trimestre do ano fiscal 2023/2024, que corresponde aos meses de outubro a dezembro, a empresa acumulava, de abril a dezembro, uma produção de 1,2 milhão de toneladas de DDG.
Somando esse número às cerca de 300 mil toneladas produzidas no último trimestre do ano fiscal anterior (2022/23), a produção total durante o ano de 2023 beirou 1,5 milhão de toneladas do produto.
Os benefícios do DDG
O advento do mercado do DDG pode contribuir também para o meio-ambiente. Segundo explicou Flávio Portella, professor da Esalq/USP, os subprodutos do etanol de milho são grandes aliados na conversão de pastagens. “Isso pode fazer a nossa pecuária, que é a segunda maior do mundo, passar a dos EUA em breve”, afirmou durante a conferência.
Ele cita que, como o DDG é mais proteico do que rações tradicionais, seu uso para a engorda acaba permitindo um tempo abatye mais precoce do rebanho, já que o boi atinge o peso ideal para abate em menos meses. Consequentemente, isso reduz as emissões de CO2 por parte dos animais.
Além disso, o uso do subproduto permite a intensificação da pecuária. “A área de pasto no Brasil diminuiu 35 milhões de hectares nos últimos 32 anos, mais de um milhão por ano. Essa área vai para a agricultura e adequação ambiental”, afirmou Portella.
Segundo o analista sênior do Datagro, João Figueiredo, essa menor área para criação de gado também traz uma ajuda ao facilitar a rastreabilidade da carne exportada, algo cada vez mais exigido por organizações internacionais, como por exemplo, a União Europeia (UE).
“Você intensifica a criação do boi, tira a pressão de novas fronteiras agrícolas e traz novas áreas. Sem rastreio, não haverão compras. A UE exigirá 100% do boi rastreado. Eles não são o player que mais compra, mas possuem influência no mercado”, afirmou.