“Um grama de prevenção vale um quilo de cura”. Esse ditado popular explica muito bem a ideia da SafeCows para mudar alguns rumos da pecuária brasileira.

A empresa, que é um braço da BrDot, startup com foco em soluções que utilizam Internet das Coisas (IoT), está prestes a lançar no mercado um rastreador que monitora dados sobre saúde e comportamento, em tempo real, de bovinos.

O rastreador é uma biocápsula, que foi desenvolvida pela BrDot e é ingerida pela vaca.

Essa cápsula, que tem cerca de 10cm de comprimento e 4cm de largura, parecida com uma pilha D, possui uma série de sensores que podem atestar a saúde do animal. O produto fica alojado no rúmen do animal, uma estrutura próxima ao estômago.

Dentre alguns indicadores analisados pelo produto estão a temperatura, os batimentos cardíacos, o nível de hidratação, a quantidade de metano e de carbono no organismo e até o nível do pH do animal.

Esses indicadores servem para dar uma dimensão de como está a vaca, e prever seu nível de produtividade, verificando se há doenças ou não no ruminante.

Quando ingerida, a cápsula cilíndrica tem uma bateria que dura cinco anos, o que garante que a vida produtiva da vaca será integralmente medida em tempo real. Nos testes feitos até agora, a BrDot atestou que a cápsula não causa nenhum impacto no comportamento do animal.

O CEO da BrDot, Rodrigo Junco explicou ao AgFeed que a ideia começou a ser estruturada há um ano e meio, quando a empresa mudou um pouco seu viés de negócio.

Junco, que possui um background profissional todo focado em tecnologia, fundou a empresa em 2021. Na época, ele começou a se questionar sobre motivação e propósito no mundo dos negócios. Como sempre foi um entusiasta pelo tema da IoT, percebeu que seu uso poderia revolucionar algumas indústrias.

Apesar de notar algumas indústrias e cidades começando a dar os primeiros passos no tema, percebeu que ainda havia uma avenida a perseguir, além de constatar que há uma falta de profissionais com perfil para atuar no segmento.

Nesse momento ele descobriu a Helium, uma empresa americana que criou uma rede de conexão sem fio descentralizada e baseada em blockchain. Essa rede conecta dispositivos que operam com a internet das coisas (IoT) e que podem enviar dados por longas distâncias.

A BrDot nasceu trabalhando junto à Nova Labs, empresa dos fundadores da Helium que tem como objetivo difundir a rede na América Latina. A rede Helium é descentralizada, ou seja, não possui um “dono”, como são as soluções do mercado de telecomunicação tradicional.

“Começamos com essa oferta de serviço e suporte para empresas desenvolverem projetos nessa rede. Temos a rede disponível, com mais de seis mil pontos distribuídos no continente, mas a demanda ainda é incipiente pois as soluções não estão disponíveis”, afirmou.

Foi aí que a empresa passou a focar em desenvolver projetos específicos que utilizassem essa rede como base. Um deles é a SafeCows.

“Precisamos buscar especialistas no mercado para ajudar com o desafio tecnológico, que é baseado na medição de dados num meio que não vemos no mercado: uma cápsula ingerida pelo animal, e não uma coleira ou tornozeleira”, afirma.

O objetivo da SafeCows é ganhar o mercado de vacas leiteiras e também de pecuária de corte. Atualmente, a solução está em etapa final de validação técnica e sanitária, além de aguardar questões legais envolvendo a Anatel. “O produto está pronto, só esperando essas certificações”.

Na parte técnica, a BrDot tem uma parceria com o Centro Universitário Católica do Tocantins (UniCatólica) e a companhia AR Inovações. “Começamos dessa forma, via pesquisa e validação, para ganhar reputação, trazendo a academia para o negócio”, afirmou.

A cápsula ingerida pelo animal se conecta então com a rede Helium, que tem um dispositivo instalado em alguma tomada da propriedade. Esses dados coletados são disponibilizados num dashboard para o produtor, veterinário ou zootecnista que cuida do animal em uma fazenda.

A BrDot instala na propriedade uma espécie de modem de internet para ter acesso à rede Helium, e esse modem, por sua vez, consegue captar dados até 700 metros de distância, o que permite a solução funcionar também numa pecuária mais extensiva, em pastagens.

Além das vinte vacas testadas em conjunto com a UniCatólica, Junco comentou que a empresa tem feito testes com um parceiro comercial em Uberlândia-MG, já focado na pecuária de corte.

“Se esse produtor, por exemplo, possui uma reserva florestal e consegue medir o quanto a área sequestra carbono, a solução da SafeCows entra para medir o quanto é emitido na atmosfera. Isso ajuda o fazendeiro a chegar na neutralização de carbono”, completa Junco.

A ideia é que em dois meses a tecnologia chegue comercialmente no mercado. O foco inicial, segundo o executivo, será em atender veterinários e zootecnistas, que poderão usar a cápsula como auxílio na tomada de decisão para um tratamento ou uso de medicamentos.

Para dar escala à solução, Junco revelou que a empresa deve buscar uma captação de R$ 5 milhões a partir de agora. Até então, o financiamento da pesquisa se deu com caixa próprio da empresa, e a ideia é buscar fundos de venture capital e empresas do ramo interessadas.

“Fomos procurados numa fase inicial por alguns fundos, mas ainda não estávamos pensando nisso. Queríamos primeiro ter uma tecnologia estruturada para ter a solução e apresentá-la ‘pronta’ para o mercado. Agora o momento é de captação”, afirmou o CEO da BrDot.

Cápsula desenvolvida pela SafeCows

A inserção inicial no mercado por meio de veterinários é só a primeira fase da empresa, segundo o executivo.”A fase um é focada em produtividade, em usar a tecnologia da IoT de alta precisão e isso ter reflexos na melhoria de eficiência da produção”, afirmou.

A ideia é, no médio e longo prazo, produzir dados e criar um ecossistema que se beneficie dessas informações. “O produtor deixará de produzir apenas leite e também passará a produzir dados”, afirmou.

Nesse sentido, uma empresa que compre o leite ou a carne desse produtor terá dados para provar que o animal está saudável. Nesse momento, Junco aposta que o comprador será uma espécie de “investidor”, que poderá ganhar em cima da venda dos dados, e que repassa o produto sem custos ao produtor.

Em 25 anos de carreira, Rodrigo Junco já atuou com startups e multinacionais, e teve passagens pela Naspers, fundo sul-africano que já foi dono do Buscapé, e também pela Acxiom, empresa norte-americana listada na Nasdaq focada em dados empresariais, análises e tecnologia, que possui US$ 1 bilhão em receitas anuais.

Antes de fundar a BrDot em 2021, passou quatro anos na Incognia, empresa que atua com identidade baseada em geolocalização para verificação de usuários e segurança. A companhia captou em janeiro US$ 31 milhões, cerca de R$ 155 milhões, em uma rodada do tipo série B. Na ocasião, foi avaliada em US$ 181 milhões.

“Meu repertório profissional vem de uma carreira sólida na área de tecnologia, sempre com foco em marketing e vendas”, afirmou.