Para muitas instituições do setor financeiro, abrir as porteiras do agronegócio não é uma tarefa corriqueira. Falar a língua do produtor rural e conhecer de perto as características e o risco das operações das fazendas são dois pontos sensíveis para se estabelecer uma relação – e uma oportunidade que tem sido vislumbrada por algumas empresas que se especializaram na originação de clientes para bancos e seguradoras interessadas em expandir suas carteiras junto ao maior negócio do país.
Foi o que vislumbrou, há pouco mais de dois anos, o executivo e investidor Rafael Coelho, CEO da A de Agro. No comando da Agronow, uma startup pioneira na geração e análise de dados de propriedades rurais, ele comandou uma guinada da empresa da área de monitoramento para uma agfintech, capaz de utilizar as informações colhidas para avaliar a concessão de créditos e seguros para produtores e empresas agrícolas.
A empresa ganhou novo nome, passou a se chamar A de Agro, e estreitou laços com a Faria Lima. Recebeu aportes de grupos como o BTG Pactual, o Banco Alfa e a gestora Suno Asset Management e somente este ano, já gerou mais de R$ 780 milhões em operações de crédito.
Há cerca de dois meses, fez uma rodada de captação que trouxe ao seu caixa R$ 28 milhões, mas, segundo Coelho, deve receber mais R$ 10 milhões até o final do ano como base para uma expansão de seus negócios.
A empresa negocia parceria com mais um banco. Segundo Coelho, essa instituição tem tamanho parecido com o BTG, quando se trata de crédito – a carteira do banco fechou o mês de junho perto de R$ 154 bilhões, com crescimento superior a 30% em um ano.
“Nós nascemos como uma geradora de dados do agro e mais recentemente nós começamos a trabalhar e tratar esses dados. E no início da safra, o que o produtor mais precisa é de crédito. Aí resolvemos atuar na originação deste crédito”, explica Rafael Coelho, CEO da A de Agro.
Além da análise de crédito dos produtores, após a liberação dos recursos pelos bancos a A de Agro faz o monitoramento das garantias e da produção dos tomadores.
“Basicamente, nós ajudamos quem não conhece o setor a entrar nele. E há muito interesse, já que é o segmento da economia brasileira que mais cresce e que ainda tem um potencial muito grande”, diz Luiz Alberto Sperotto, diretor de Operações da A de Agro.
Além do crédito mais tradicional, Sperotto conta que a startup começa a atuar com operações mais estruturadas, como CRAs e FIDCs, inclusive para atender gestoras como a Suno.
A expansão da startup não deve se restringir apenas ao crédito. A empresa já tem um acordo fechado com a Alper Seguros para atuar em um modelo muito parecido com o que atende aos bancos.
“Vamos gerar dados para que o seguro tenha a maior precisão possível. Um problema atual dos seguros paramétricos (que protege contra eventos climáticos que prejudicam a produção) é que eles monitoram uma região, e não a fazenda”, diz Coelho.
A A de Agro vai utilizar uma rede de satélites dos Estados Unidos para coletar dados e monitorar o comportamento do clima especificamente em cada fazenda. “Em muitos casos, os produtores têm problemas para receber indenizações porque o monitoramento das seguradoras aponta que houve chuvas na região. Mas nos talhões daquele produtor, não choveu. E ele não consegue comprovar”, afirma o CEO da startup, criada em 2019.
Tudo isso utilizando uma tecnologia chamada pela empresa de Rural Uno, que Coelho define como “inteligência territorial”.
O mecanismo ajuda a analisar a governança da propriedade rural, saber dos padrões socioambientais seguidos pelo produtor, além de antecipar a produtividade e os riscos climáticos.
Outro ramo em que a A de Agro planeja atuar é no marketplace de insumos. Nesse segmento, segundo Coelho, as conversas estão em fases mais iniciais com possíveis parceiros.
Nos números, a empresa vai fechar esse ano com uma receita que deve ficar acima do dobro do realizado em 2022.
“Vamos fechar com faturamento que deve ficar um pouco abaixo de R$ 8 milhões. Nós fizemos R$ 3 mihões no ano passado, que foi um período de transição, quando começamos a alterar as estratégias”, afirma o CEO.
Essa mudança estratégica teve como objetivo aumentar a recorrência das receitas da A de Agro, que consistem em uma porcentagem do prêmio estabelecido na taxa de juros do financiamento.
“Se fechamos uma operação em que o tomador vai pagar CDI mais 5% ao ano, nós ficamos com uma parte destes 5%”, explica Coelho. A empresa já gerou R$ 780 milhões em operações de crédito em 2023.
Sperotto afirma que o trabalho para a mudança de perfil deu resultados. “Nós saímos de uma proporção de 55% de faturamento vindo de projetos mais esporádicos e 45% de recorrente, para uma proporção de 95% de receitas recorrentes”.