Uma das maiores fabricantes de defensivos e sementes do mundo, a Basf, está dando mais um passo para avançar na digitalização de suas transações com os agricultores, ao adquirir uma participação societária na startup brasileira Grão Direto, considerada a maior plataforma de comercialização digital de grãos da América Latina.

O acordo envolve a Conecta.ag, ecossistema digital para o setor agrícola que a Basf oferece aos clientes em parceria com a Vertem. Um dos principais objetivos é ofertar a compra e venda de grãos, via digital, para toda a cadeia de produtores, distribuidores e revendedores.

Ao mesmo tempo, a unidade de capital de risco corporativo da multinacional, Basf Venture Capital (BVC), tornou-se sócia da Grão Direto, com a saída de um acionista minoritário. O valor investido e o percentual de participação da Basf na startup não foram divulgados pelas duas empresas, que alegam ter assinado um acordo de confidencialidade.

A Conecta.ag já viabilizava que distribuidores oferecessem seus produtos e serviços aos agricultores, que podiam escolher o que comprar e de quem.

Patrícia Ambrósio, Head de Serviços Financeiros e Operações Estruturadas - Digital e Excelência Comercial da BASF, explicou que “as soluções da Grão Direto, como precificação de grãos e relação de troca em tempo real e personalizadas, fechamento de negócios em ambiente digital e fluxo de informação automatizado, estarão agora integradas e sendo ofertadas dentro do ecossistema do Conecta.ag”.

Segundo a Basf, a intenção é ampliar as opções para a comercialização e barter digital com foco nos cultivos de soja e milho. O lançamento das soluções será feito “ao longo das safras 2023/2024 e 2024/2025”, disse a empresa, o que sinaliza a possibilidade de que negócios para segunda safra de milho já sejam viabilizados pela parceria, à medida que a comercialização segue bastante atrasada em relação à média histórica.

“O acordo dá início às atividades do pilar financeiro do ecossistema lançado em 2022, que já conta com um marketplace e um pilar de fidelidade”, acrescentou Ambrósio.

A afirmação se refere ao fato de o Conecta.ag ter iniciado com o papel de um marketplace e, no ano passado, ter ganho mais uma função, agregando diferentes programas de fidelidade, inclusive o Agrega, da própria empresa.

O AgFeed mostrou, em reportagem publicada em agosto passado, que a Basf já agregou consultorias agronômicas ao leque de serviços digitais e também planeja lançar algo relacionado à concessão de crédito aos agricultores neste ambiente.

“A parceria com a Grão Direto tem valor estratégico pela expertise e pioneirismo em soluções nativamente digitais para a comercialização de grãos. Trabalharemos na integração das soluções para as operações de troca e comercialização na jornada do produtor no nosso ecossistema, nosso objetivo é torná-las 100% digitais entregando agilidade e simplicidade na forma de fazer negócios com grãos”, completou Patrícia Ambrósio.

O CEO da Grão Direto, Alexandre Borges, disse que a parceria tem uma visão de longo prazo e que deve fortalecer a empresa, que oferece operações no mercado spot, a termo e barter.

“Reforçamos o nosso propósito de sermos uma plataforma neutra, independente e aberta a todos os players do mercado. Além disso, a conexão direta e em tempo real entre compradores e vendedores destrava uma série de novos negócios financeiros e logísticos”, afirmou Borges.

Segundo a Grão Direto, seu aplicativo para a comercialização digital de grãos já teve 300 mil downloads e conta com cerca de 7 mil pontos de entrega e retirada dos produtos agrícolas.

Grandes tradings de commodities agrícolas já vêm utilizando a plataforma da startup. Em 2022, por exemplo, a Grão Direto captou R$ 40 milhões junto a investidores como ADM, Cargill, Amaggi e Louis Dreyfus.

A plataforma oferece precificação em tempo real para diferentes condições de logística e prazos de pagamento. Segundo a empresa, são mais de 20 milhões de preços calculados diariamente pelos algoritmos proprietários da plataforma.

Nos últimos 12 meses, a startup diz ter atingido 5 milhões de toneladas de grãos conectados digitalmente, atendendo não apenas as tradings, mas também pequenos e grandes produtores rurais, além de revendas e cooperativas.

A Basf não divulga dados sobre a abrangência atual de suas plataformas digitais e que metas possui relacionadas ao avanço deste tipo de transação, mas destaca que a ideia é que offline e online sigam coexistindo.

“O futuro do agronegócio é a multicanalidade. Dar uma experiência omnichannel para os produtores, distribuidores e empresas é o que garantirá um futuro mais eficiente e produtivo para a agricultura. Ampliaremos o contato e o relacionamento direto com o produtor para aquelas situações relevantes e não mais porque esta é a única opção. O digital não afasta, pelo contrário. O digital irá aumentar a proximidade entre todos, e isto só é possível aliando offline com online”, afirmou a executiva da empresa.

Posicionamento da Basf em venture capital

A multinacional alemã diz estar buscando fortalecer seu posicionamento “em capital de risco e empreendedorismo”.

A Basf Venture Capital destacou que a entrada no quadro societário da Grão Direto “reforça sua atuação na América do Sul em 3 dos pilares da tese de investimento do fundo, que são: agtechs, digitalização e novos modelos de negócios”.

Karine Hajar, gerente de Investimento da BVC para a América do Sul, afirmou que “a Grão Direto possui no cerne de sua proposta de valor gerar muita eficiência e conexão para um mercado que hoje tem duas realidades: o mercado físico com seus desafios logísticos e processos analógicos e o mercado financeiro concentrado em bolsas como a de Chicago.

A expectativa é de que a plataforma da startup garanta a transparência das transações, reduza ineficiências para compradores e vendedores, “além de permitir o acesso de mais agricultores às melhores oportunidades para comercializar suas safras”, disse Hajar.

Perguntada sobre a relação com os demais acionistas da Grão Direto – a concorrente Bayer já foi citada no passado – a Basf respondeu que, do ponto de vista societário, “o intuito é promover a transformação digital do setor em benefício de todo o mercado através das soluções digitais inovadoras da Grão Direto. Sendo assim, via seus braços de corporate venture capital (CVC), grandes corporações fomentam a inovação para todo o ecossistema”.

Já no aspecto da relação comercial, a companhia destacou que “diversas grandes empresas do agro, assim como a Basf, possuem parcerias comerciais com a Grão Direto para ofertar soluções e reforçar seus posicionamentos no mercado e não necessariamente há uma conexão de curto ou longo prazo de negócios”.

A Basf Venture Capital investiu, em 2023, em mais quatro empresas: uma chinesa, a Phomera, não relacionada ao setor agrícola, a startup suíça DePoly, de plástico sustentável, a canadense PH7, também com foco em recicláveis, e na WayBeyond, da Nova Zelândia, uma empresa de IoT e softwares que visam melhorar a produtividade das lavouras e a lucratividade dos agricultores.

No Brasil, em 2022, a BVC já havia liderado uma rodada que captou US$ 10 milhões para a fintech Traive.

O AgFeed questionou a BVC sobre novos investimentos previstos, que disse não haver “um capital dedicado exclusivamente a agtechs ou geografias específicas”.

O braço de venture capital da Basf informou ter “um evergreen fund de US$ 250 milhões, com presença em física em Mannheim, Toronto, Boston, Los Angeles, Hong Kong, Shanghai, São Paulo, Mumbai e Tel Aviv”.

O foco está em descarbonização, economia circular, agtechs, novos materiais, digitalização e novos modelos de negócios, “participando de rodadas seed a Serie B com cheques de US$ 1 milhão a US$5 milhões”.