O mercado de insumos biológicos já é uma realidade no presente e deve encerrar a safra 2024/2025 com um faturamento de R$ 3,8 bilhões somando as empresas do setor que atuam no mercado nacional, segundo estimativas da consultoria Blink Inteligência Aplicada.

Mesmo com oportunidades no presente, há quem já olhe para o futuro. Para além de uma projeção de movimentar R$ 6 bilhões daqui quatro safras, o olhar atento está para novas gerações de biológicos, além de tecnologias que agreguem valor frente ao ofertado hoje.

Na agtech Bsafe Biotech, a ideia é dominar o mercado de bioinseticidas através de uma tecnologia de RNA de Interferência (RNAi). Para tal, nada melhor do que alguém que entende, e muito, de passado, para vislumbrar o futuro.

Nascida a partir dos estudos do biólogo Paulo Ribolla, professor da Unesp, a companhia hoje tem como CEO José Tomé, um dos principais responsáveis por criar o ecossistema de inovação no setor em Piracicaba a partir da criação do Agtech Garage, hoje propriedade da PwC.

Depois de deixar o projeto criado por ele no início de 2024, Tomé decidiu continuar no ecossistema, mas com outro viés. Primeiro como investidor através de uma firma própria, a Chaac Capital. Até agora, já investiu na Inralt, startup que utiliza ondas eletromagnéticas e IA para realizar análises químicas de plantas.

A outra atuação de Tomé é enquanto executivo, à frente da Bsafe. Praticamente um ano à frente do cargo, o CEO revelou que a empresa deve encerrar 2025 com R$ 5 milhões captados numa rodada pré-seed.

O movimento, além de acelerar o desenvolvimento de produtos, prepara terreno para outra rodada de mais R$ 5 milhões, essa do tipo seed, que a startup pretende realizar em janeiro do ano que vem.

A companhia já possui como investidor a argentina GRIDX, uma firma de venture capital que conecta cientistas que estão na fronteira da inovação global a empreendedores com perfil de gestão.

José Tomé citou que neste ano, investiram na companhia Marcelo Carvalho, CEO da MilkPoint Ventures e ex-sócio na fundação do AgTech Garage, além de Mathias Soares, sócio da Pack Fertilizantes, empresa que foi vendida para o Grupo Larderello em 2022, Fernanda Gottardi, da GR8 Ventures, e Diogo Rodrigues Carvalho, executivo e empreendedor, que foi um dos pioneiros dos biológicos no Brasil como  cofundador da Bug Agentes Biológicos, vendida para a holandesa Koppert em 2017.

“Procurei trazer pessoas que possam ajudar estrategicamente, executivos que agreguem também no smart money. Na próxima rodada não descartamos investidores institucionais, se tudo for bem construído. Já conversamos com fundos de Venture Capital”, disse Tomé, que também investiu na Bsafe por meio da Chaac Capital.

O restante da captação projetada até o final do ano deve trazer outros investidores e um recurso via subvenção.

Com o recurso captado até agora, a empresa inaugurou seu novo laboratório no parque tecnológico de Botucatu. Antes, a companhia estava incubada dentro da Unesp, no campus que fica na cidade, onde atuava o pesquisador Paulo Ribolla.

“No recurso, falamos em 20% para Capex, envolvendo por exemplo equipamentos e 80% para pessoal e outros insumos para acelerar o desenvolvimento”, disse.

A tese da Bsafe é simples: No laboratório, a agtech faz o sequenciamento gênico da praga e, na sequência, utiliza algoritmos para detectar os genes que devem ser anulados. Com o resultado em mãos, a startup produz a molécula de RNAi com bactérias geneticamente modificadas.
E, a partir da molécula, a Bsafe faz a multiplicação em levedura, encapsulando a tecnologia.

O primeiro produto da companhia é um bioinseticida que combate o “cascudinho”, nome popular do inseto Alphitobius diaperinus, uma praga comum na avicultura. A projeção de Tomé é que o próximo produto seja um bioinseticida que ataque o psilídeo, inseto que é vetor do greening, praga que tira o sono da citricultura há décadas.

Do lado científico, o RNAi é um processo biológico natural que regula a expressão genética, praticamente "interferindo" no RNA. Dessa forma, pode anular genes determinados de algum microorganismo, o levando a morte.

Dando alguns passos atrás, RNA (ácido ribonucleico) é algo presente em todo organismo vivo. A molécula faz a síntese de proteínas, e é fundamental para a regulação genética e expressão das informações do RNA.

No modelo de negócio, a Bsafe não deve atuar no B2C, mas sim licenciando as moléculas para empresas de insumos.

“Nós saímos de uma lógica de triagem, ou uma busca com um grau de aleatoriedade por microorganismos para ir para um design, mais intencional, vendo a formação genética e produzindo essa molécula. É outro jogo”, disse Tomé.

Além dos dois produtos que já estavam no radar, Tomé revelou que a empresa está trabalhando em uma solução para combater a spodoptera, conhecida como lagarta-do-cartucho.

“Estamos com parecer de patenteabilidade em andamento e conversas para anunciar dois projetos de co-desenvolvimento com players da indústria em breve”, adiantou o CEO.

Tomé conta que a oportunidade de se tornar CEO da Bsafe fez brilhar seus olhos por dois motivos. Primeiro, pelo potencial que o mercado de RNAi tem na agricultura, em sua visão. Segundo, por unir a expertise de negócios acumulada nos últimos anos com sua carreira de cientista, antes do Agtech Garage.

Tomé se formou em engenharia química, pesquisando, durante a graduação, tecnologias ligadas à biorrefinarias. Depois de formado, atuou por oito anos no CTC (Centro de Tecnologia Canavieira) no projeto do etanol de segunda geração (E2G).

“Tive uma primeira fase profissional como cientista e depois fiz uma segunda fase empreendendo. Nesse momento atual, comecei a olhar para deeptechs, e a Bsafe conseguiu traduzir o cientista e o gestor de projetos. Vi que podia contribuir no negócio na minha melhor versão”, disse.

Outra vantagem da nova empreitada, segundo ele, é a eliminação de certos ritos burocráticos que empresas de biotecnologia enfrentam.
Isso porque, tecnicamente, os bioinseticidas da startup não são transgênicos e a levedura não leva um organismo vivo, que por consequência, não tem como se multiplicar no solo.

“O produto não é um GMO (Organismo Geneticamente Modificado). Usamos o GMO para produzir, mas ele é inativado. Isso ajuda a superar algumas barreiras”, explicou.

Tomé escolheu divulgar a empreitada nessa semana, em um momento em que as atenções do mercado agro estão voltadas a um dos principais eventos do ecossistema do continente, o World Agri-tech South America Summit, realizado em São Paulo a partir detsa terça-feira, 24 de junho.

A ideia é mostrar o momento atual do negócio e “educar o mercado sobre o potencial do RNA”. “É uma tecnologia com potencial, e muitos ainda enxergam como a sexta geração de biológicos, ou seja, algo para daqui um tempo. Mas está mais próximo do que imaginamos”, acrescentou Tomé.

Ainda disruptiva e com poucos players, a tecnologia de RNAi tem dado seus primeiros passos no agro brasileiro. Recentemente, a gestora Just Climate investiu US$ 25 milhões para trazer a GreenLight, que também atua com RNAi, para o Brasil. A ideia, segundo revelou o CEO da empresa, Andrey Zarur, é ter seus produtos aplicados em 1 milhão de hectares nos próximos anos.

Os produtos da GreenLight também trabalham com o RNA de interferência e o portfólio está concentrado, por enquanto, em um adjuvante potencializador para inseticidas, o Fortivance.

A companhia tem buscado aprovação junto ao Governo Federal para outros dois produtos: um focado no combate ao oídio, fungo que aparece na soja e em diversas outras culturas, e o outro mirando o controle de pragas na culturas de frutas.

Resumo

  • A Bsafe Biotech, que tem José Tomé como CEO, busca captar R$ 5 milhões até dezembro em rodada pré-seed e já planeja dobrar o montante em uma rodada seed no início de 2026.
  • Com base na tecnologia de RNA de Interferência (RNAi), a empresa desenvolve bioinseticidas para pragas como o cascudinho e o psilídeo, com foco em licenciamento para grandes empresas de insumos.
  • A startup acaba de inaugurar um laboratório em Piracicaba e pretende fechar parcerias de co-desenvolvimento com players da indústria ainda neste ano, mirando o mercado de biológicos de nova geração.