Uma encomenda especial foi embalada e despachada esta semana na sede da fabricante de aviões agrícolas Pyka, em Alameda, no estado americano da Califórnia.

De lá partiu para o Brasil o primeiro avião pulverizador elétrico e autônomo para ser testado em propriedades da SLC Agrícola, companhia que deve ser a pioneira no uso da tecnologia  da startup americana no País.

A ideia é que a companhia de commodities comece a operar o equipamento em meados de novembro, segundo antecipou Volker Fabian, diretor comercial da Pyka, ao AgFeed.

A depender do plano de voo da agtech, outras devem seguir a mesma rota em breve. Pioneira na produção de aviões agrícolas e de carga elétricos e autônomos, a Pyka vai reforçar a aposta no Brasil, onde começou a aterrissar no ano passado, com demonstrações de seus equipamentos – e logo conseguiu o contrato com a SLC.

Por aqui, segundo Fabian, a empresa tem conversas em andamento com outros grupos agrícolas brasileiros para firmar novos acordos comerciais. Ainda não há negócio fechado, mas ele diz se diz “otimista” em relação ao futuro da empresa no Brasil – ainda que seja econômico nos detalhes dessas operações futuras.

“O plano, de modo geral, é expandir os compromissos no Brasil nos próximos meses e anos, alcançando outros grandes agricultores e produtores no País,  à medida que concluirmos nossas operações iniciais com a SLC e expandirmos a partir disso”, afirma Fabian.

O atual sobrevoo vem com as baterias carregadas por uma nova rodada de investimentos de US$ 40 milhões, recém-fechada. O objetivo da companhia é ampliar a capacidade de produção de suas aeronaves.

O crescimento das operações pode, inclusive, fazer com que a startup tenha uma base no Brasil.

“Temos pessoas que dão suporte, mas ainda não temos uma equipe estabelecida especificamente no Brasil de forma permanente. À medida que expandimos a operação no País, é bem provável que tenhamos pessoas localmente”, afirma Fabian.

Hoje, funcionários de suporte e de operações de voo ficam baseados na Califórnia, onde está a sede da empresa, e viajam para o Brasil e outros países, como Honduras e Equador.

Nem drone, nem avião

O contrato com a SLC foi anunciado em julho e previa a utilização das aeronaves com o objetivo de aumentar a eficiência operacional da empresa e, ao mesmo tempo, reduzir o uso de defensivos químicos e de emissões de carbono da SLC.

"Buscamos no mercado uma solução autônoma para aplicação aérea que satisfaça os requisitos da nossa operação, e o produto da Pyka se mostrou ideal. A combinação de carga útil e precisão de pulverização tem o potencial de reduzir nossos custos operacionais para aplicação aérea”, afirmou Ronei Sana, gerente de agricultura digital da SLC Agrícola, na ocasião.

“Minha percepção é que a SLC acredita que este é o futuro da aplicação aérea na agricultura. Eles estão muito animados em trabalhar conosco. Mas precisamos mostrar a eles que o avião faz um ótimo trabalho”, avalia Fabian.

O equipamento a ser utilizado pela SLC é o modelo para pulverização Pelican Spray, que tem 6 metros de comprimento, 11 metros de envergadura e capacidade de carga de 300 quilos – elétrico e autônomo, não precisa de piloto e nem de combustível na operação.

As aeronaves da empresa situam-se em um nível intermediário entre os drones e os aviões agrícolas. Sua capacidade é o dobro dos maiores drones, que conseguem transportar somente 150 quilos de defensivos. Já os aviões têm capacidade para até 3 mil quilos.

Uma das dificuldades da empresa hoje, segundo Fabian, é justamente explicar as diferenças tecnológicas dos equipamentos da Pyka – mas para as autoridades, e não para quem está no campo.

“Os produtores já estão bastante familiarizados com a forma como a pulverização aérea funciona e entendem que esta é uma máquina que automatiza a pulverização agrícola. É muito mais seguro, mais limpo e é mais barato”, afirma ele.

“O desafio é fazer com que as autoridades de aviação entendam o quão seguro nosso equipamento é para voar e nos deem aprovação para operar”, emenda.

No Brasil, ele diz não ter encontrado dificuldades para a utilização de drones de pulverização – o que torna, inclusive, o mercado brasileiro atrativo para a empresa, em sua avaliação.

A mesma situação, entretanto, não aconteceu no país de origem da empresa, os Estados Unidos.

“A FAA [Administração Federal de Aviação, órgão regulador americano, semelhante à Anac no Brasil] é um pouco mais lenta na adoção de novas tecnologias. Esse foi um dos maiores obstáculos”, afirma ele.

Além da SLC, outra empresa brasileira com quem a Pyka mantém relacionamento é a Embraer. Há três anos, em 2021, a startup americana e a companhia anunciaram um acordo para “acelerar a chegada da solução autônoma ao mercado de agricultura de precisão”.

“Não quero entrar nos detalhes comerciais, mas temos um contrato assinado com a Embraer para expandir nossos relacionamentos e entregar aviões para eles”, disse Fabian, sem indicar mais detalhes sobre a relação.

A América Latina é um importante mercado para a empresa. Na região, a Pyka mantém contratos como a multinacional Dole, um dos grandes players do mercado de bananas, para testes de utilização de suas aeronaves de pulverização.

“Estamos operando comercialmente com a Dole em Honduras e expandindo nosso relacionamento com eles para outros países. Além da Dole, também estamos trabalhando com outros produtores de banana na Guatemala e na Costa Rica”, afirma Fabian.

Pentágono na mira

Encerrada no fim de setembro, a rodada de captação do tipo série B, de US$ 40 milhões, foi liderada pela Obvious Ventures, empresa de venture capital fundada por Ev Williams, um dos criadores do antigo Twitter, com participação de Piva Capital, Prelude Ventures, Metaplanet Holdings e Y Combinator.

O montante dessa rodada representa praticamente a totalidade de recursos – US$ 48 milhões – que a companhia, fundada em 2019, havia conseguido captar no mercado até então.

“Vemos a eletrificação da aviação logo ali na esquina. Voar é uma das atividades mais intensivas em carbono do mundo”, disse a Obvious no anúncio do fechamento da rodada.

“Em um futuro próximo, prevemos jatos elétricos de passageiros. Um passo importante nessa direção é o voo elétrico sem passageiros. É por isso que investimos na Pyka”.

Enquanto o avião de passageiros autônomo e elétrico não sai do papel, a Pyka se concentra em desenvolver em suas aeronaves agrícolas e também de carga.

Os recursos vão permitir à empresa mais capacidade de produção para atender também as demandas de um importante (e recente) cliente da empresa: o Pentágono.

O Departamento de Defesa dos Estados Unidos se interessou por uma versão modificada da aeronave autônoma de carga da Pyka, o Pelican Cargo, que é capaz de operar com cargas pesadas, longas distâncias e fora de aeroportos, com recarregamento rápido, em menos de 90 minutos.

Em fevereiro, a Pyka entregou, em leasing, três aeronaves de carga elétricas autônomas à Força Aérea dos Estados Unidos.

A negociação foi feita através do braço de inovação do Departamento da Força Aérea, que mantém um programa que busca desenvolver e acelerar o mercado comercial de aeronaves.

Para atender às necessidades militares, de forma que suas aeronaves possam ser utilizadas, por exemplo, em cambos de batalha, a empresa se juntou à empresa Sierra Nevada Corporation (SNC), que acumula longa bagagem nesse tipo de aeronave.

“Acreditamos que a Força Aérea é um cliente ideal para aproveitar os benefícios desta tecnologia e está ajudando a promover a aviação de emissão zero nos Estados Unidos por meio de parcerias com empresas como a nossa”, disse o CEO da Pyka, Michael Norcia.