Depois de uma retração em 2024, o mercado brasileiro de agtechs encontrou em 2025 um ambiente ainda morno, mas com tendências de reaquecimento.
Ainda distante dos excessos observados no ciclo antes desse “inverno das startups”, os aportes ao longo deste ano mostraram um perfil mais seletivo de investimentos, com foco em eficiência operacional, uso intensivo de dados e soluções diretamente conectadas aos gargalos do campo.
Para 2026, a expectativa é de continuidade desse mesmo movimento: um mercado ativo, porém mais exigente, em que capital, tecnologia e inovação seguem disponíveis, desde que ancorados em tração, impacto mensurável e aderência clara à realidade do produtor rural.
Essa é a leitura do Rural Tech Report 2025, levantamento feito pela Rural que observou o ecossistema e suas tendências.
Segundo o estudo, os investimentos em startups do agro somam mais de R$ 680 milhões ao longo do ano, com forte concentração em Climate Techs e Marketplaces, verticais que, juntas, puxaram os aportes no setor. O volume é, de acordo com a Rural, cerca de 10% menor do que em 2024.
O montante de 2025 é impulsionado pela rodada de R$ 280 milhões da Mombak, que atua com reflorestamento na Amazônia e levantou capital com o Fundo Clima e o BNDES.
Para além do volume investido, o que chama atenção é a natureza das teses que ganharam espaço. Em um ambiente de juros elevados e maior custo de capital, investidores passaram a priorizar soluções que ampliam a visibilidade da cadeia, reduzem incertezas e apoiam decisões mais racionais no campo.
“Ao longo de todo o ano de 2025, grande parte das rodadas retornou a empresas que fundamentam suas estratégias na tomada de decisão baseada na visibilidade do landscape”, afirmou Thomaz Edmundo, sócio da Rural.
Na prática, isso se traduziu em interesse crescente por plataformas ligadas a clima, dados de produção, rastreabilidade e transações de grãos.
“O investidor está cada vez mais ancorado em teses que facilitam a tomada de decisão, em vez de se apoiar em modelos mais próximos de bens de consumo”, acrescentou o sócio no levantamento.
A maior parte dos investimentos se concentrou em climate techs, seguido por marketplaces, biológicos e agricultura de precisão.
Do lado das grandes corporações, a percepção é semelhante. Para André Fukugauti, gerente de Inovação Aberta da Bayer, 2025 marcou a transição definitiva do discurso para a prática.
“Vi agricultores adotando inteligência artificial para mapeamento de talhões, startups implementando blockchain em contratos de venda de grãos e plataformas digitais revolucionando a gestão de insumos e operações”, diz Fukugauti no report da Rural.
Segundo ele, a expectativa para 2026 é de que parcerias estratégicas acelerem ainda mais essa transformação, especialmente em temas como agricultura regenerativa, automação no campo e cadeias integradas.
A tendência também aparece na fala de Sabrina Chabregas, diretora de pesquisa e desenvolvimento do CTC. Para ela, o próximo ano deve combinar inovação com escala.
“2026 será um ano de novidades relevantes e, ao mesmo tempo, de ganho de integração com o ecossistema. Conectar soluções, simplificar jornadas e transformar inovação em prática cotidiana é como fechamos o ciclo entre ciência, dados e impacto real no campo”, disse.
Na ponta da demanda, o comportamento do produtor reforça esse ambiente mais pragmático. Segundo Caio Rosateli, head de finanças da venture builder WBGI, o produtor manteve alta adesão tecnológica em 2025, mas com foco claro em eficiência, previsibilidade e redução de risco.
“As pesquisas têm mostrado que mais de 95% dos produtores utilizam algum tipo de tecnologia digital, e cerca de 84% usam ferramentas digitais de forma recorrente”, afirmou.
As soluções mais demandadas no ano, segundo ele, foram softwares de gestão rural, planejamento de safra e controle de custos, plataformas de agrometeorologia e climate analytics, aplicações de inteligência artificial voltadas a crédito, seguro e logística e ferramentas de rastreabilidade e compliance, impulsionadas por exigências de mercado e exportação.
Em contrapartida, tecnologias que demandam um alto grau de experimentação ou um custo inicial elevado somado a um retorno pouco mensurável perderam espaço relativo.
Esse mesmo pano de fundo ajuda a entender por que, apesar do aquecimento observado em 2025, o mercado segue longe de um novo ciclo de euforia. A taxa Selic que avançou ao longo de 2025 e fechou o ano em 15% ano elevou o custo de capital, o que pressionou valuations e reduziu o apetite por rodadas maiores.
“O agro mostrou resiliência, mas o mercado de startups foi diretamente impactado pelo contexto financeiro doméstico e internacional”, afirmou Rosateli.
Segundo Juliana Chini, sócia da Rural, 2025 teve dois momentos bem distintos. O primeiro semestre foi mais aquecido, com forte recuperação dos investimentos em Food e AgTechs, enquanto que o segundo semestre foi mais cauteloso, reflexo da maior seletividade.
Para ela, essa dinâmica tende a se repetir em 2026, com um início mais forte e um segundo semestre mais tímido, influenciado pelo calendário eleitoral, que naturalmente bagunça o mercado de capitais.
Os deals de 2025
Esse ambiente mais maduro ficou evidente na lista de rodadas e movimentos corporativos do ano, que teve algumas rodadas de destaque.
Logo no começo do ano, em janeiro, a Promip, uma das pioneiras no desenvolvimento de insumos biológicos no Brasil, levantou R$ 20 milhões para escalar sua plataforma.
O aporte foi feito pela gestora Angra Partners, que aportou por meio do Inova FIP. A ideia do veículo é dar cheques de R$ 10 milhões a R$ 40 milhões em outras empresas do agro.
Poucos meses depois, em março, a Grão Direto finalizou uma das maiores rodadas do ano. A empresa, que possui uma plataforma de comércio digital de grãos, captou R$ 90 milhões em uma rodada liderada pela Kaszek, com participação de SLC e Bradesco.
O aporte ajudou a empresa a investir na ampliação de soluções tecnológicas, incluindo precificação e negociação em tempo real, avanços na digitalização do barter e novas soluções baseadas em inteligência artificial. Além disso, a companhia tem a intenção de expandir seus produtos e serviços financeiros.
Em maio, a fintech Agrolend atraiu US$ 3 milhões (cerca de R$ 17 milhões na cotação da época) da JICA, agência de cooperação do governo japonês, numa extensão da rodada do tipo Série C que realizou ao final de 2024. Com isso, o aporte da rodada do banco digital dos irmãos Glezer ultrapassa os R$ 300 milhões.
No mesmo mês, outras duas rodadas. Primeiro a Agroadvance, que atua com educação no agro, levantou R$ 9,5 milhões com a SLC e a Ânima Ventures. Depois, a Buzz Fly, que transforma resíduos orgânicos em proteínas e adubo a partir da larva da mosca BSF, captou R$ 6 milhões com Olavo Setúbal Jr., Marcos Molina, André Lara Resende e Agroven
No segundo semestre, a Produzindo Certo captou R$ 20,7 milhões para expandir suas soluções em agropecuária regenerativa. A rodada foi liderada pela Arar Capital e pela SP Ventures, e ainda contou com a participação de The Yield Lab, SLC Ventures e Agroven.
Outra rodada, essa de valor não revelada, foi da Symbiomics, agtech que utiliza IA para produzir biológicos. O aporte foi liderado pela multinacional Corteva, e também contou com cheques da Yield Lab e Arar Capital.
No apagar das luzes do ano, a Guarda, de seguro paramétrico, levantou R$ 4,5 milhões numa rodada liderada pelo braço de venture capital da Randon.
Houve ainda diversas rodadas menores: Jetbov (R$ 1 milhão), SciCrop (R$ 1 milhão), Brota (R$ 5 milhões), SoluSolo (R$ 4,8 milhões), Olho do Dono (R$ 2,2 milhões) e ainda uma sequência de movimentos de M&A, como as combinações entre CheckPlant e xFarm, e Smart Sensing e Drop.
Para Fernando Rodrigues, CEO da Rural, o conjunto desses movimentos indica que o setor entrou em um novo patamar de maturidade. “Tecnologia, capital e dados só fazem sentido quando viram resultado na fazenda, transparência na cadeia e eficiência para quem investe. A terceira safra do produtor são os dados, e é neles que se apoia a próxima onda de produtividade”, afirmou.
Do lado de quem investe, a leitura é semelhante. Em entrevista recente ao AgFeed, Renato Ramalho, CEO da KPTL, afirmou que a gestora entrará em 2026 com uma agenda madura de desinvestimentos.
“Captar com juros a 15% não é trivial. A macroeconomia não vai mudar tanto”, disse. Segundo ele, tanto novos investimentos quanto exits dependerão muito mais da dinâmica específica de cada ativo do que de um movimento estrutural do mercado.
Ainda assim, Ramalho avalia que o Brasil segue relativamente bem posicionado dentro do universo de mercados emergentes e vê nas climate techs uma frente com bom dinamismo, impulsionada pela agenda climática e pelos desdobramentos da COP 30. “O capital está mais seletivo, mas continua buscando boas teses”, afirmou.
Resumo
- Aportes em agtechs somaram mais de R$ 680 milhões em 2025, queda de 10% em um ano, com forte concentração em climate techs e marketplaces
- Investidores passaram a priorizar soluções ligadas a dados, clima, produtividade e rastreabilidade, enquanto teses com alto custo inicial e retorno pouco mensurável perderam espaço
- Para 2026, o setor deve seguir ativo, porém sem euforia, com capital mais seletivo, juros elevados e foco em tração, eficiência e impacto comprovado no campo