Rondonópolis (MT) - No pátio de triagem do terminal da Rumo em Rondonópolis (MT), o vaivém de caminhões não tem hora para acabar.
São 80 caminhões, 13 tombadores e 14 vagões sendo carregados por hora na instalação, um ritmo que ajuda a explicar como o complexo intermodal da companhia de logística, o maior de grãos da América Latina, bateu recorde histórico de movimentação em outubro.
Durante o mês, segundo dados da empresa, foram transportados na Malha Norte, que atualmente tem o terminal como ponto final, 6,8 milhões de TKU (toneladas por quilômetro útil). O número é o maior no histórico da malha. Só de produtos agrícolas (soja, milho, farelo, açúcar, fertilizantes e outros grãos), foram 5,59 milhões de TKU.
Mesmo com a ferrovia operando a todo vapor, a companhia não pensa apenas em crescer: precisa se adaptar a um agronegócio cujo compasso está em franca mudança.
O movimento, que antes obedecia um calendário previsível - soja de janeiro a junho, milho de julho a dezembro -, agora é contínuo. Produtores com mais estruturas de armazenagem, como silos e silo-bags, passaram a segurar a soja por mais tempo, escolhendo o melhor momento de venda.
E enquanto isso, as indústrias de etanol de milho do Centro-Oeste começaram a reter parte do cereal dentro do Estado.
O resultado: um fluxo mais pulverizado, em que os vagões transportam soja, milho e farelo simultaneamente, sem o intervalo de safra que antes marcava o ano ferroviário.
Para se ter uma ideia, segundo os dados da própria empresa, foram transportados, em setembro e outubro deste ano, 821 mil TKU e 1 milhão de TKU de soja, respectivamente. Nos mesmos meses do ano passado, foram 87 mil TKU e 2 mil TKU do mesmo produto.
Já no milho, o que se vê é uma redução no transporte que passa pela malha, justamente pela menor exportação e maior uso do cereal nas usinas de etanol. Em outubro do ano passado, foram 3,4 milhões de TKU transportados. Neste ano, 2,9 milhões de TKU.
“Tem ano que chove demais, tem ano que o produtor segura e muda a dinâmica comercial. Faz parte do nosso negócio e o que buscamos é ter infraestrutura flexível para se adaptar ao que o mercado pedir”, disse Natália Marcassa, vice-presidente de regulação e relações institucionais da Rumo, ao AgFeed.
“O terminal de Rondonópolis não tinha essa flexibilidade há alguns anos. Recapacitamos a operação e hoje conseguimos atender os três produtos (soja, milho e farelo) de forma simultânea. Foi essencial”, acrescentou a VP.
A adaptação é uma resposta direta a um agro que amadureceu. Só o terminal de Rondonópolis movimentou mais de 21,5 milhões de toneladas em 2024, divididas entre soja, milho, farelo e fertilizantes.
Ali, a companhia opera 24 horas por dia em regime de três turnos, e a fila de caminhões continua firme até a madrugada. Em um cenário de safras recordes, a linearidade virou sinônimo de eficiência.
A presença de novas indústrias, como as de etanol de milho, também começa a redesenhar o mapa logístico e, hoje, o volume que desce para Paulínia (SP) já supera o de combustível que sobe pelo mesmo corredor.
“O milho que transportamos hoje só existe porque existe o etanol de milho. É o excedente desse novo ciclo industrial”, explica Marcassa.
Apesar disso, a executiva ressalta que é difícil dizer que “o transporte de milho está diminuindo”. “Como tivemos uma safra arrastada de soja, a gente não sabe exatamente o tamanho da safra de milho, pois estamos até hoje escoando soja”.
Enquanto o mercado muda, a Rumo segue investindo em ampliar a malha e garantir espaço para o futuro.
O AgFeed visitou na última semana as obras de expansão da Ferrovia de Mato Grosso (FMT), que ligará o terminal de Rondonópolis, que atualmente é o ponto final da malha, até um novo terminal na rodovia BR-070.
A unidade, localizada no município de Dom Aquino, estará localizada próxima também das cidades de Primavera do Leste e Campo Verde. Até o novo terminal, previsto para iniciar a operação no segundo semestre de 2026, a ferrovia engloba 162 quilômetros.
Só nesta primeira fase de expansão, o investimento estimado é de R$ 5 bilhões. Com o novo terminal, com capacidade para 10 milhões de toneladas, com possibilidade de dobrar mediante uma expansão, a Rumo quer atingir mais regiões do centro de Mato Grosso.
A ideia é que o terminal receba grãos, além das cidades próximas, também da região do Vale do Araguaia, como do município de Água Boa.
Hoje, a Rumo possui autorização para realizar a expansão da FMT até a cidade de Lucas do Rio Verde, num projeto mais ousado que contaria com outros terminais (um em Lucas e outro em Nova Mutum), além de uma extensão ferroviária até Cuiabá, capital do estado.
Se chegar em Lucas do Rio Verde, a ferrovia conseguirá atrair os grãos da maior região produtora de soja do País, que engloba os municípios de Sinop e Sorriso. A ideia da Rumo é que os caminhões trafeguem, no máximo, 200 quilômetros da fazenda até o local de descarga.
A Rumo ainda não definiu prazos nem Capex para o restante do projeto, que pode atingir 743 quilômetros de ferrovias uma vez finalizado.
“Temos autorização para o trecho até Lucas e é lá que miramos chegar. Essa é a rota que agrega custo logístico menor e tem operação perene o ano todo. É o corredor que faz sentido para o produtor e para o País”, diz Marcassa.
Rota de Santos
A operação da Rumo, contudo, não se restringe ao Mato Grosso. A companhia opera hoje 13,5 mil quilômetros de linhas, com mais de 33 mil vagões e 1,2 mil locomotivas.
São dez terminais intermodais e seis portuários integrados, do Mato Grosso a Santos (SP), em uma malha que conecta as principais regiões produtoras de soja, milho e farelo ao porto.
A estratégia inclui também a Malha Central, eixo que liga Goiás e o norte do Estado ao porto de Santos.
Desde que venceu a concessão da Ferrovia Norte-Sul, em 2020, a Rumo tem investido na implantação de novos terminais em Rio Verde, São Simão, Alvorada e, mais recentemente, em Gurupi (TO), onde iniciou operação de farelo em parceria com a Fazendão Agronegócio.
“É uma rota superimportante para nós, com potencial de crescimento enorme no norte de Goiás e no Matopiba”, diz a executiva.
Dentro do MT, mas “abaixo” do terminal de Rondonópolis no mapa, a companhia ainda possui um terminal em Alto Araguaia (MT), onde atende principalmente uma operação da Cargill, que movimenta cerca de 1 milhão de toneladas por ano.
Além do transporte de soja, milho e farelo de soja, a companhia ainda transporta açúcar e fertilizantes. Os adubos fazem o caminho inverso: vão de Santos até o interior do País.
Na operação de contêineres, tocada pela Brado, outra empresa do grupo Cosan, controlador da Rumo, são transportados combustíveis, madeira, papel, celulose, materiais de construção civil e de siderurgia e mineração.
Apesar disso, novas parcerias podem começar a acontecer no horizonte. Com o avanço das usinas de etanol de milho, um executivo que conhece o mercado de logística no Centro-Oeste pontuou que o transporte de farelo de milho e DDG via ferrovia já é uma demanda constante para as transportadoras.
Essas mudanças indicam que o futuro da logística agrícola será mais fragmentado, com diferentes produtos compartilhando o mesmo trilho.
Segundo a VP, a companhia segue de olho em novas concessões como a FICO e a FIOL, mas por ora mantém o foco em consolidar a malha do Centro-Oeste, onde o agro dita o ritmo da ferrovia.
“Nossa tese de investimento é esse corredor logístico até o Porto de Santos, que é a alternativa mais barata para escoar e a rota que agregamos em custo logístico. É uma rota perene o ano todo”, disse.
“Olhamos para a FICO como olhamos para todos os projetos de ferrovias, pois somos o maior player ferroviário e é nosso dever analisar a rentabilidade. Hoje, com certeza, o foco é a FMT”, acrescentou.
O jornalista viajou a convite da Rumo.
Resumo
- Terminal de Rondonópolis (MT) movimentou 6,8 milhões de TKU em outubro, recorde histórico da Rumo, com 5,6 milhões de TKU apenas de produtos agrícolas
- Mudança no perfil logístico do agro faz companhia adaptar operações: produtores seguram soja por mais tempo, e indústrias de etanol de milho retêm parte do cereal no estado
- Em expansão, a Rumo investe R$ 5 bilhões na primeira fase da FMT, que ligará Rondonópolis a Dom Aquino, e já estuda estender o traçado até Lucas do Rio Verde