Sertãozinho (SP) - Como o mercado do etanol estará entre a virada e meados da próxima década? A questão pautou o debate do painel “Expansão global do etanol”, na tarde desta quarta-feira, na Fenasucro & Agrocana, em Sertãozinho (SP).
Na avaliação de especialistas e executivos do setor, o crescimento da produção brasileira é certo para entre 2030 e 2035 e ocorrerá a partir do processamento de milho. Do lado da demanda, o aumento ainda virá basicamente do mercado interno.
Antes de responder o que esperava para a próxima década, o presidente da SCA Brasil, Martinho Ono, disse que “olharia primeiro no retrovisor”, ou seja, para os dez anos passados.
“Ficamos estagnados na oferta de cana e de etanol de cana e tivemos um crescimento vertiginoso da do etanol de milho, que veio para ficar e tem competitividade”, resumiu.
Segundo ele, o milho vai ocupar cada vez mais o espaço na oferta do biocombustível, por agregar valor ao campo e à indústria. Já o setor sucroenergético de cana precisará extrair mais valor do etanol, na avaliação dele, com a produção de combustíveis sustentáveis para a aviação e o setor marítimo, além de ampliar a oferta de açúcar.
Estimativa da SCA aponta que a oferta de etanol brasileira pode saltar dos atuais 24 bilhões de litros para até 30 bilhões de litros na entrada da próxima década. Essa oferta deve vir basicamente do milho e em regiões não tradicionais para o biocombustível, como Sul do Brasil, Bahia e Maranhão.
Paralelamente, a reforma tributária, com a equalização das alíquotas sobre o etanol hidratado entre os estados, deve ajudar a ampliar a demanda nessas e em outras regiões de menor consumo do biocombustível, incluindo as novas produtoras.
“Vemos o etanol de milho entrando onde não tem produção, como Sul, Bahia e Maranhão. A fronteira do etanol sai da cana e esperamos que a reforma tributária traga equalização do modelo tributário até 2032”, afirmou Ono.
Para o CEO da Evolua Etanol, Pedro Paranhos, o etanol brasileiro “nunca deixará de crescer no mercado interno”, já que o País tem uma política pública consolidada e é pioneiro na redução de emissões por meio do biocombustível.
A trading projeta um aumento de 5 bilhões de litros de demanda interna para o biocombustível até a próxima década.
Além do mercado interno, a companhia vê potencial de crescimento na demanda global pelo etanol para a produção de combustíveis de aviação e marítimo, além do uso veicular em outros países, com um aumento total de 25 bilhões de litros na oferta.
A Evolua Etanol estima uma demanda de 8 bilhões de litros para o SAF a partir de 2030 e outros 3 bilhões de litros para o biobunker marítimo. No mercado externo, a Índia tem aumentado o uso mandatório de anidro na gasolina para 15% e tem objetivo de chegar a 20% e o Japão, que utiliza 2% de ETBE (produzido com etanol) e deve atingir 10%.
O diretor comercial da FS Fueling Sustainability, Paulo Trucco da Cunha, avaliou que a companhia, uma das pioneiras e maiores produtoras brasileiras de etanol de milho, acompanhará a expansão da produção e da oferta de etanol na próxima década. Assim como Ono, da SCA, na opinião do executivo a oferta virá em regiões menos tradicionais, o que ampliará, junto com a reforma tributária, a competitividade do etanol.
“Em outros países, o uso do etanol se torna cada vez mais comum, como no Japão, e a difusão do etanol no mundo vai ser realidade dentro das políticas de sustentabilidade e de redução do fóssil”, disse.
Do lado da demanda, o diretor de assuntos governamentais e regulatórios da Toyota, Rafael Ceconello, lembrou que a produção de etanol garante ao Brasil a independência energética e o fato de se tornar provedor do biocombustível e da tecnologia globalmente.
Pioneira na produção de veículos híbridos flex, há cinco anos, com dois modelos - Corolla Sedan e Corolla Cross - e outros dois a serem lançados em breve, a Toyota superou 100 mil unidades produzidas no Brasil. Para Ceconello, esses veículos trazem valor agregado aos clientes, pois têm pouca manutenção e mais economia de combustível.
Decano no painel e oriundo dos setor canavieiro nordestino, o presidente do Sindicato da Indústria de Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco (Sindaçucar-PE), Renato Cunha, concorda com os outros debatedores e avalia que o milho e o mercado interno devem balizar oferta e demanda de etanol no País.
Mas, na avaliação de Cunha, o mercado interno precisa ser mais trabalhado e ter mais “confluência” e “aderência” à indústria de petróleo. “O grande veio de crescimento ainda é o mercado interno, mas é preciso ter uma interface mais madura com a indústria petroleira”, afirmou.
Integrante da comitiva de políticos e empresários que esteve recentemente nos Estados Unidos para tentar negociar o tarifaço de 50% imposto por Donald Trump sobre produtos brasileiros, Cunha considerou a medida “inaceitável” e “proibitiva” para o mercado de açúcar nordestino.
O Nordeste se beneficia com 155 mil toneladas de uma cota de açúcar importada pelos Estados Unidos de 1,1 milhão de toneladas, sem tarifa de US$ 357 dólares por tonelada, o que tem sustentado a secular indústria local. A cota é anunciada sempre em setembro de cada ano, ou seja, no próximo mês, e vale a partir de outubro.
Além de inviabilizar a exportação do açúcar, Cunha teme que o Brasil seja excluído pelos Estados Unidos da próxima cota em represália. O presidente do Sindaçúcar-PE defende uma saída diplomática e negociada para o impasse, já que os Estados Unidos têm demanda maior que oferta pela commodity.
“Eles são deficitários de açúcar, importam 2,5 milhões a 2,7 milhões de toneladas, e vão ter de conversar com o Brasil. Paciência”, concluiu.
Resumo
- Especialistas projetam que o crescimento do etanol brasileiro até 2035 será impulsionado principalmente pelo milho
- Maior impulso na produção deve vir de novas regiões como Sul, Bahia e Maranhão
- A produção de etanol de cana está estagnada e deverá buscar maior valor agregado com foco em combustíveis sustentáveis para aviação e setor marítimo