Pouco mais de seis meses depois de começar a estruturar e emitir títulos de dívida, a gestora Éxes, que também se tornou securitizadora, já soma um portfólio encorpado quando o assunto são CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio). Desde sua primeira emissão, realizada ainda em dezembro de 2024, a empresa já colocou na rua seis operações que somam cerca de R$ 360 milhões.
O avanço é considerável para quem ainda está no início da trajetória e, mais do que o volume, chama atenção o escopo: a casa estruturou papéis para diferentes perfis tomadores, como produtores rurais, grupos industriais do agro, empresas de insumos e laticínios.
O perfil variado de devedor, e por consequência de garantias e risco, mostra, segundo a gestão da empresa, uma ambição de crescer nesse mercado e de se adaptar em diferentes públicos do agro.
“Montamos a securitizadora e já começamos rodando operação. E o pipeline continua cheio”, contou Artur Carneiro, sócio da Éxes, em entrevista ao AgFeed.
Em dezembro passado, quando a gestora, que tem até um Fiagro listado na B3, resolveu apostar nesse braço securitizadora, Carneiro contou que a ideia era encurtar caminhos.
Acostumada a encarteirar CRAs originados por outras empresas em seus fundos, a Éxes percebeu que a expertise com o setor agro permitia uma originação direta, algo que, segundo o sócio, era importante para melhorar o nível de análise de crédito para a gestora.
"Queremos controlar esse ambiente como um todo, prestando o mesmo nível de serviço que prestamos na estruturação também no dia a dia da gestão e também com o investidor que acreditou na securitizadora", disse, na época.
A Éxes também trouxe para a operação Marina Queiroz, uma executiva com larga experiência no mercado com uma passagem de 10 anos no BTG Pactual, onde atuou com estruturação de crédito e conheceu os sócios da Éxes no passado.
A vivência de Marina no agro já é antiga e no banco de André Esteves, ela foi uma das responsáveis por criar a Engelhart, trading de commodities do banco.
Hoje, a executiva encabeça a vertical da securitizadora na Éxes. Segundo os sócios, o objetivo para os próximos meses é manter o ritmo de emissões, explorando oportunidades além dos parceiros tradicionais.
Alguns CRAs emitidos até agora nasceram de relações já antigas da gestora. “A Éxes já existe há sete anos, e isso nos proporciona uma recorrência. O próprio histórico e relacionamento construído gera operações que podem entrar na securitizadora. Temos muita prospecção direta, e a securitizadora tem chamado a atenção de terceiros, e isso proporcionou estruturarmos CRAs fora da nossa rede de relacionamento”, adiantou Carneiro.
A estreia, ainda no apagar das luzes de 2024, foi com um CRA de R$ 30 milhões para Carlos Alberto Mauro, produtor de cana-de-açúcar no Mato Grosso do Sul.
A operação foi resolvida em tempo recorde, aproveitando o fim do ano e uma janela de compras mais vantajosa, citaram os sócios. A remuneração do título de estreia foi de CDI + 5,5% ao ano, e os CRAs foram encarteirados pelos próprios fundos da Éxes.
Nas garantias, a Éxes conta com alienação fiduciária de imóveis, cessão dos recebíveis de cana e o aval da Orbi Química, que pertence à família do agricultor.
Na sequência, veio a segunda emissão: R$ 13,5 milhões para a Madre De Dios Agropecuária, grupo familiar de Maracaju (MS), com atuação em soja, milho e pecuária. O papel tem vencimento em 2031 e taxa de CDI + 7% ao ano.
“As emissões até então mostram como a Éxes tem se movimentado para não perder vínculo com operações menores. Ao mesmo tempo que apresentamos alguns produtores ao mercado de capitais, viabilizamos operações com bons perfis de dívida. Junto disso, buscamos empresas mais conhecidas do investidor geral e reconhecidas no mercado”, disse Marina Queiroz, sócia e diretora de securitização da Éxes.
Na terceira emissão, o montante mostrou um avanço frente aos demais, com R$ 70 milhões para a Hinove Agrociência. A devedora atua no segmento de fertilizantes especiais, conta com três plantas industriais entre São Paulo e Mato Grosso do Sul, com capacidade instalada de 2,5 milhões de toneladas e produção anual superior a 1 milhão de toneladas de produtos.
A empresa faturou cerca de R$ 845 milhões no ano passado e projeta ultrapassar R$ 1,1 bilhão neste ano. O mercado principal da Hinove são produtores de cana-de-açúcar nas regiões Centro-Oeste e Sul.
O CRA é verde e vence em junho de 2029, com uma remuneração atrelada ao CDI mais 4,2% ao ano. Nesse caso, a Éxes estruturou a operação junto ao Santander, que atua como coordenador líder.
A emissão está alinhada ao “Framework de Finanças Verdes” do banco, que prevê investimentos em produtos mais sustentáveis e eficientes.
“Essa operação tem um selo verde e uma casa forte ao nosso lado. Um ponto positivo desta emissão é que o selo contribuiu para uma conscientização da empresa, que entra não só no processo de governança, mas também na percepção de mercado”, comentou Marina Queiroz.
Na quarta emissão, a Éxes atuou junto à Bevap Bioenergia num CRA de R$ 100 milhões. A companhia mineira está há alguns anos em processo de reestruturação e alongamento de dívidas e já emitiu cerca de R$ 450 milhões em títulos do tipo nos últimos três anos.
Artur Carneiro cita que a empresa já possui emissões de dívida no mercado, em meio a um processo de reperfilamento do perfil da dívida. “A companhia tem se reestruturado em termos de governança e mantendo esse perfil de investimentos. A estrutura desse CRA foi interessante porque a própria operação motivou a revisão de um rating da Bevap”, contou o sócio da Éxes.
A operação tem um prazo de 5 anos, remuneração de CDI + 3% ao ano, e conta com garantia de cessão fiduciária de recebíveis e aval cruzado das empresas operacionais do grupo.
Fundada em 2007, a Bevap é uma empresa de cana verticalizada e, além de 32 mil hectares de cana totalmente irrigados, conta com uma usina produtora de açúcar, etanol anidro e etanol hidratado. A capacidade instalada para moagem é de, aproximadamente, 3,5 milhões de toneladas de cana.
A mudança no rating mencionada por Carneiro foi feita pelo S&P, que fez um upgrade de BBB para BBB+. A agência de classificação de risco ressaltou um aumento do colchão de liquidez e perfil mais longo da dívida como fatores que motivaram a decisão.
A quinta emissão é a maior até agora, com um CRA de R$ 130 milhões para a empresa de laticínios Deale, um dos maiores laticínios do País, com capacidade de processamento de 850 mil litros de leite por dia e que recentemente foi comprada pela Scala.
A oferta prevê um vencimento em 2030, com uma remuneração de CDI + 4% ao ano. A operação reforça uma parceria de alguns anos entre a Éxes e a Deale, já que a gestora encarteirou um CRA passado da companhia em seu Fiagro listado.
A nova emissão visa alongar o perfil do passivo e proporcionar injeção de liquidez para financiar o crescimento das operações.
O último CRA emitido até agora teve seu processo iniciado em junho deste ano e somou R$ 16,1 milhões para o produtor rural Nicodemos Ferreira Guimarães.
Sojicultor no Maranhão, Guimarães emitiu o título para custear sua atividade agrícola, e a CPR que lastreia o CRA cita a entrega futura de 147,2 mil sacas de soja in natura referentes às safras 2025/2026 e 2026/2027.
Queiroz e Carneiro contaram que, nas emissões menores, o capital foi 100% alocado pela própria Éxes, mas casos maiores, como da Bevap e Hinove, foram distribuídos ao mercado, mas também houve compras de cotas pela gestora.
Mesmo com o cenário de juros altos, que por natureza reduz margem e trava investimento, os sócios da Éxes projetam não só manter a cadência de emissões como também enxergam uma oportunidade.
A leitura da gestora é que o mercado de crédito segue ineficiente, com espaço de sobra para a atuação do mercado de capitais, especialmente no agro.
“Juros maiores certamente atrapalham. O resultado final da empresa fica apertado, a capacidade de novos investimentos exaurida. Os novos projetos acabam sendo engavetados porque não fecha a conta. O custo de capital embutido não compensa e a empresa pode preferir aplicar o dinheiro”, observou Carneiro. Ainda assim, a gestora diz ter encontrado oportunidades.
De um lado, vê espaço para atuar com empresas de porte médio que antes eram restritas aos bancos. Do outro, vê uma ineficiência do funding que antes era dado por revendas.
Com eventos como o da Agrogalaxy e mais recentemente da Lavoro, ele acredita que “abriu-se uma janela para o crédito direto”.
“Tem muito muito mato alto e as alternativas tradicionais estão ficando mais rarefeitas. O juros, sim, limita, investimentos, mas estamos minerando e buscando oportunidades ganha-ganha, que façam sentido para a empresa e para o investidor aplicar seu capital”, finalizou o sócio da Éxes.
Resumo
- Em pouco mais de seis meses, Éxes estruturou seis emissões de CRA, com tíquetes entre R$ 13 milhões e R$ 130 milhões. Na soma, cerca de R$ 360 milhões
- Perfil variado de devedores inclui desde produtores de soja e cana até empresas de laticínios e fertilizantes