Para a FinPec, fintech criada em 2018 com foco em arbitragem de gado físico, os últimos anos têm sido uma montanha-russa. Depois de atravessar seu pior ano da história, em 2023, a companhia viu o mercado pecuário melhorar de forma tímida em 2024.
Agora, se vê no alto de uma onda para surfar um bom momento tanto em ciclo quanto em volatilidade.
Michel Torteli, sócio e cofundador da startup, explicou que a companhia atua da seguinte forma: capta dinheiro no mercado financeiro para investir em bois magros, que são enviados a mais de 50 confinamentos espalhados pelo País para o processo de engorda.
A companhia trava um preço de venda futuro com frigoríficos, se protegendo de oscilações, e após o abate, devolve o capital aos investidores com o rendimento obtido nesse processo de arbitragem.
Para esse ano, a projeção é abater 100 mil cabeças até dezembro. “Fechamos 2024 com 78 mil cabeças abatidas. Neste ano até maio foram abatidas 44 mil, mostrando um pouco a dimensão do nosso crescimento”, disse o executivo.
Torteli não citou valores, mas disse que o avanço operacional faz as captações acompanharem o ritmo. O faturamento em 2025 deve dobrar frente a 2024, segundo seus cálculos.
Nos “bois da FinPec”, uma pata está na Faria Lima e a outra está na terra, mas com uma cobertura. Do lado do mercado, a captação é feita via CPRs, CDCAs e CRAs, com foco em investidores institucionais, family offices e pessoas físicas.
Hoje, as captações são feitas principalmente com fundos institucionais e family offices. “Com a taxa de juros atual, os CRAs hoje não são mais um bom instrumento”, explica o executivo.
No passado, foram emitidos dois CRAs. O primeiro foi de R$ 38 milhões, numa emissão feita em parceria com o Banco Alfa em 2021, sendo o primeiro da história com bois em garantia. Já o segundo, emitido em 2024, foi de R$ 20 milhões. Hoje, os investidores compram CPRs.
Com o dinheiro em mãos, a companhia compra bois magros, que são alocados nos 52 confinamentos que hoje são parceiros da startup. “Fazemos parceria com o boi e o confinador entra com o trato e o operacional”.
Ao alocar o boi no confinamento, a empresa trava um contrato de venda previamente com frigoríficos, eliminando a variável preço da jogada. As operações têm prazos entre 90 e 120 dias, e o retorno ao investidor é pré-definido.
Após o abate, o capital é devolvido ao investidor com a rentabilidade acordada na hora da captação. O confinamento é remunerado por cabeça e por dia de trato, enquanto a FinPec ganha uma margem de gestão e performance.
Desde a fundação, em 2018, a empresa já originou R$ 1,5 bilhão em gado, e possui hoje mais de 3,5 mil clientes.
O aspecto operacional é o pulo do gato, ou melhor, do boi, para ancorar esse crescimento. “A margem começou a retornar em 2024, mesmo com a taxa de juros subindo. Esse ano o mercado está bom, com o preço futuro inclinado. Isso ajuda na composição dos custos de confinamento, que ainda observam o preço dos grãos mais baixo, que deve chegar nas empresas a partir de julho, considerando o carrego de estoque”, disse Torteli.
“Acho que os três ou quatro anos serão bons, com boa demanda. Ainda nos preocupa um pouco a reposição do boi magro, mas os confinamentos terão boas margens”, acrescentou.
Michel Torteli conversou com o AgFeed na última semana diretamente de um evento sobre pecuária realizado pela gestora BGC Liquidez, realizado em um hotel em São Paulo.
Por lá, duas palestras que trouxeram especialistas no ramo como Pedro Bordon, CEO do frigorífico Estrela e que acumula décadas no setor de frigoríficos, com passagens por JBS, Frigol, outros representantes de indústrias como Astra Foods e Barra Mansa Alimentos e agentes do mercado financeiro como Vagner Alves, da gestora Kinea, pertencente ao Itaú.
A percepção é quase unânime de que a demanda pelo boi brasileiro deve continuar elevada. Há meses, essa perspectiva já se reflete no preço da arroba, que segundo dados do Cepea/Esalq, é negociado acima dos R$ 300 desde outubro de 2024, com pico de quase R$ 340 em novembro. Hoje, a cotação está em R$ 312.
Carlos Thadeu, economista do BGC Liquidez, vê um ciclo do boi “agressivo” potencializado pelo clima seco, e cita um abate elevado no primeiro trimestre, mas que deve ir se acomodando ao longo do ano.
No primeiro trimestre de 2025, o Brasil registrou um abate recorde de bovinos, com 9,71 milhões de cabeças abatidas, segundo o IBGE. O número representa um aumento de 3,8% em comparação com o mesmo período de 2024.
Do lado do preço, Alves, da Kinea, vê uma demanda doméstica por carne bovina subindo entre 3% e 4% neste ano, acompanhada de uma demanda externa alta. “Mesmo que haja desaceleração da demanda, ainda vejo uma demanda forte com a taxa de desemprego que está rodando próximo das mínimas no Brasil”, citou.
“Trabalhei na indústria por 12 anos e nunca tinha visto um drive de demanda forte somado a um recorde de abate, recorde de produção e preço elevado. Isso mostra a força da demanda, e a virada do ciclo ainda está no início”, acrescentou Torteli, da FinPec.
Michel Torteli é um executivo que conhece o setor, com passagens por Minerva e LDC. Foi na segunda que conheceu seu sócio, Fernando Sartori, que hoje é o CEO.
Segundo ele, hoje os confinamentos operam com filas de espera, mesmo sem anúncios de novas plantas por parte dos frigoríficos. Torteli afirma que há um movimento de aumento de capacidade de abate em algumas plantas, mas que ainda não dão conta da demanda.
“Não vejo ninguém com viés ‘baixista' para o segundo semestre. Até onde pode ir a alta do boi?” indagou aos presentes no evento.
Resumo
- A FinPec prevê dobrar seu faturamento em 2025 e abater mais de 100 mil cabeças de gado no ano
- Empresa capta recursos por meio de CPRs e CDCAs, alocando bois magros em confinamentos e travando a venda futura com frigoríficos;; investidores recebem retorno com base na arbitragem de preço do gado.
- Para os executivos da FinPec, ciclo de alta dos preços do boi deve se manter, puxado pela elevada demanda pela carne brasileira