Um Brasil que planta soja pelo calendário dos Estados Unidos, afinal está no Hemisfério Norte, acima da linha do Equador, e que fica muito perto, por exemplo, do Canal do Panamá.

Estamos falando do estado de Roraima, que promete receber R$ 5,6 bilhões em investimentos privados nos próximos 4 anos, principalmente no agronegócio.

Esta semana, empresários de diferentes setores do agro participaram de um encontro promovido pelo governo estadual em São Paulo, chamado de Roraima Day.

O governador Antonio Denarium, acompanhado do time de secretários, liderado por Aluizio Nascimento, da pasta de Atração de Investimentos, apresentaram detalhes sobre o crescimento acima da média nacional registrado recentemente e sobre questões cruciais na região – segurança jurídica e energética.

Na primeira fila, estavam executivos da gigante do setor de grãos Amaggi, que decidiu aumentar a aposta em Roraima. A empresa já é responsável por 60% da originação de grãos no estado – hoje estimada em 650 mil toneladas - e atua também na venda de insumos agrícolas aos produtores.

Agora, a Amaggi prepara mais um passo: testar uma nova rota logística, com investimentos previstos de até R$ 100 milhões no estado.

A produção adquirida dos agricultores de Roraima antes seguia via rodoviária até Manaus, para depois seguir por hidrovia. O trecho tem 750 km de estradas ruins, passando por reserva indígena. A ideia agora é construir um novo porto, na cidade de Caracaraí, em Roraima, onde a Amaggi já comprou um terreno.

“No Sul de Boa Vista é onde tem condição de chegar navegando e sair navegando. Vai pelo rio Branco, até Manaus, e pelo Amazonas até Itacoatiara”, explicou Ricardo Tomczyk, diretor de Relações Institucionais da Amaggi, em entrevista ao AgFeed.

O porto de Itacoatiara, no Amazonas, também foi no passado uma “ousadia logística” da Amaggi. Na época, em que a produção de Sapezal, em Mato Grosso, dependia de transporte rodoviário por mais de 2 mil km, estrada de terra, passando por reservas indígenas, para chegar ao Porto de Santos, a companhia arriscou o escoamento pelo Norte.

A empresa passou a levar por barcaças pelo rio Madeira, a partir de Rondônia, as cargas de grãos produzidos em Mato Grosso até um terminal privado, em Itacoatiara, que hoje é um porto que atende também outras tradings.

No estado de Roraima, a safra de soja ocorre no mesmo intervalo dos Estados Unidos (na entressafra das demais regiões do Brasil), de abril a setembro, já que a região está acima da linha do Equador.

Tomczyk confirmou que uma primeira operação piloto, para transportar entre 60 mil e 70 mil toneladas pelo rio Branco, deve ser feita nos próximos meses, com o início da colheita da soja em Roraima.

“Com o tempo, queremos substituir todo o fluxo por navegação, mas tem que começar e aprender ali ainda, porque é uma novidade”, ponderou.
Se der certo, a rota deverá ser usada também para subir com calcário e fertilizantes e abastecer os produtores da região.

“Para nós é uma alegria muito grande, porque a gente vai baixar o custo. E quando você baixa o custo, isso reverte para o produtor, ganhando um pouco mais, que lá no final das contas sobra 4 reais a mais por saca”, afirmou o secretário Aluizio Nascimento, em entrevista ao AgFeed.

Nos cálculos do secretário, a economia gerada ao levar grãos e fertilizantes por hidrovia será de R$ 80 por tonelada, em média. São valores expressivos que, segundo ele, já estão atraindo outras empresas interessadas em se posicionar na mesma região do projeto da Amaggi.

Óleo de soja, biodiesel e etanol

Outros projetos de agroindústria vêm avançando em Roraima. A Oleoplan, por meio de sua subsidiária Palmaplan Agroindustrial, atua no estado desde 2008, na produção de óleo de palma (dendê) e geração de energia renovável.

Segundo Nascimento, agora a empresa vai investir R$ 200 milhões em uma fábrica de biodiesel. A produção deve ser de 100 mil toneladas de biodiesel ao ano, ele diz.

A intenção é fazer o blend com o diesel dentro do estado de Roraima. O secretário citou o interesse de empresas petrolíferas, com refinarias, que atuam na região Norte.

“A gasolina A e o diesel A do Norte do Brasil, 75% vem de Denver nos EUA. Queremos gerar produção de biodiesel para trazer o diesel A, blendar em Roraima com frete positivo e voltando com frete de biodiesel para Manaus, que é um grande consumidor”, explicou o secretário.

Durante discurso no evento, o governador de Roraima também reforçou a “oportunidade” para quem quiser investir em etanol de milho no estado. O objetivo seria também já misturar na gasolina. Duas empresas já estariam em fase de estudo para ter usinas de etanol.

Ao produzir o biocombustível, o plano é incentivar ainda o uso do DDG para piscicultura, bovinos e aves.

Roraima está na fronteira com a Venezuela e também com a Guiana que, segundo Nascimento, “é o país que mais cresce no mundo, acima de 34%”, graças à exploração de petróleo.

Saindo de Boa Vista até Georgetown, na Guiana, são 680km para acessar o Oceano Atlântico. O secretário diz que dali são apenas 4 dias de navio até o Canal do Panamá.

Além de corredor logístico, o país vizinho, assim como a América Central e Caribe, é consumidor de peixe e frango, o que reforça o apelo para que as indústrias do setor se instalem no estado.

Outro destaque no Roraima Invest Day foi o trabalho do grupo Serra Verde, que pertence aos integrantes da família Falavinha, maiores produtores de soja do estado.

A empresa está produzindo óleo de soja em garrafa pet – o governador mostrou no evento – e também teria planos futuros para o etanol de milho.

“Nós vamos ter 200 mil unidades de 900 ml de óleo refinado, que é da esmagadora privada da Serra Verde. Com isso a gente deixa de mandar dinheiro bom para outros estados”, disse Nascimento.

Segurança energética

Há alguns anos, Roraima enfrentou dificuldades em relação ao abastecimento de energia elétrica porque não recebia energia das grandes hidrelétricas brasileiras e era altamente dependente de usinas termelétricas a óleo diesel e gás.

Houve uma mobilização de governos e setor privado para conectar o estado ao Sistema Interligado Nacional (SIN), o que poderá ocorrer ainda este ano, já que as obras do Linhão de Tucuruí, que ligará Manaus (AM) a Boa Vista (RR), estão em fase avançada.

“Com a vinda do linhão nós vamos partir de 3,4 mil hectares irrigados hoje, via pivô central, para algo perto de 23 mil hectares irrigados”, contou Nascimento. O estado depende de energia principalmente para as lavouras de arroz.

Conversas também vêm ocorrendo com empresários do setor de celulose, que estiveram presentes ao evento em São Paulo.

A área plantada das principais culturas avançou 11% na última safra, menos do que vinha avançando nos últimos anos, quando estava acima de 20%. Com as melhorias logísticas e a chegada da Amaggi, a expectativa é estimular os produtores a retomar o ritmo anterior.

O estado também alcançou recentemente a autossuficiência na produção de ovos, que antes eram importados. Uma empresa do setor seria uma das interessadas em expandir projetos de avicultura na região.

Por todos estes fatores, o secretário calcula que se considerados os investimentos em energia, infraestrutura e agroindústrias, o total dos aportes deverá chegar a R$ 5,6 bilhões até 2029.

Resumo

  • Para atrair investimentos no estado, governo realizou o Roraima Invest Day em São Paulo, reunindo grupos para prospecção de negócios
  • No evento, Amaggi confirmou intenção de instalar terminal portuário a 140 km da capital, em um investimento que pode chegar a R$ 100 milhões
  • Governo estadual também diz ter empresas interessadaas em implantar usinas de biodiesel, etanol de milho e unidade de processamento de frangos