Brasília - A produção brasileira de milho aumentou nada menos que 255% nos últimos 20 anos. É um crescimento maior do que a soja, que ainda hoje é a principal cultura no País em volume e em geração de divisas.

Um dos fatores que vem impulsionando o avanço acelerado do milho é a demanda crescente pelo etanol produzido a partir do cereal e o potencial de expandir lavouras no inverno (a chamada safrinha ou segunda safra), nas mesmas áreas onde se cultiva soja no verão. Sem contar que o grão já era cada vez mais necessário na produção de aves e suínos, que vem batendo recordes na exportação e precisa do insumo na ração animal.

Nesse cenário, os produtores de milho criariam seu próprio “evento anual”, onde reúnem políticos, pesquisadores, agricultores e empresas ligadas à cadeia para um dia inteiro de debates. É o Congresso da Abramilho, promovido pela Associação Brasileira de produtores de milho e realizado nesta quarta-feira, em Brasília.

Com boa parte da classe política ainda ausente em função da missão oficial à China, o governo federal foi representado na abertura do evento pelo presidente da República em exercício, Geraldo Alckmin.

Um dos temas em destaque foi o recente anúncio da abertura do mercado chinês para o DDG, um derivado do milho, altamente proteico e recomendado para a ração, gerado a partir da fabricação do etanol de milho.

“Foi uma boa notícia vinda da China, a abertura para o DDG, vai ser muito importante porque cresce muito o etanol de milho. O etanol é feito através do amido, sobra óleo, fibra e especialmente proteína e essa proteína é o DDG para ração animal e agora para a exportação”, ressaltou Alckmin.

A expectativa no setor é de um novo fôlego para os investimentos que vêm sendo realizados na produção do biocombustível, porém produtores e empresários concordam que a taxa de juros elevada e as incertezas quanto ao Plano Safra ainda deixam uma incógnita como como será o desempenho na próxima safra.

Perguntando sobre o que esperar do próximo Plano Safra, Alckmin respondeu que “nesse momento, ele (o plano) está sendo discutido, os dois últimos foram recordes e ele precisa ser ainda maior”, sem dar mais detalhes.

Apesar do otimismo de Alckmin, o secretário de política agrícola do Ministério da Agricultura (Mapa), Guilherme Campos, admitiu ao AgFeed que ainda há desafios por parte da equipe do Ministério da Fazenda para garantir o aumento de recurso para a safra 2025/2026.

“Estou recebendo todas as demandas das entidades em relação ao plano, mas temos que compatibilizar o desejo com o possível - e o possível quem diz é a Fazenda. A nossa dificuldade tem sido principalmente em relação à taxa de juros”, afirmou.

Segundo ele, quando o Plano Safra foi lançado no ano passado a expectativa em relação ao volume necessário para fazer a equalização dos juros – quando o governo cobre com recursos do Tesouro o subsídio da taxa mais baixa do crédito rural – era de R$ 6.5 bilhões, mas no mês passado “já estava em R$ 14 bilhões”.

Em função disso, o secretário admitiu a um grupo de jornalistas que “um juro mais alto”, no novo plano”, já seria algo “inevitável”.

Ferrogrão e armazenagem

Em conversa rápida com os jornalistas, o presidente em exercício destacou que a questão da armazenagem está relacionada à crédito, o que está “sendo estudado exatamente nesse momento para o plano safra que será anunciado”.

Ao AgFeed o presidente da Abramilho, Paulo Bertolini, afirmou que “finalmente o governo parece estar atento e disposto a uma solução” para a esse antigo gargalo do agronegócio brasileiro.

“Hoje chegamos a 120 milhões de toneladas de déficit, o que tem trazido prejuízo na cadeia como um todo”, ressaltou.

Nas conversas com o governo, o setor negocia não apenas o aumento no volume de recursos destinados às linhas para investimento em armazenagem, mas também “mudar a forma como ele é distribuído”.

Bertolini explica que o PCA grãos não está chegando a médios produtores, por isso o setor pede que o limite de 6 mil toneladas por projeto seja ampliado para 12 mil toneladas, o que incentivaria o agricultor a construir armazéns dentro das fazendas.

“O outro PCA não é só grãos, entram grandes corporações contratando direto com BNDES para aplicar em setores como açúcar, por exemplo, e a linha se esgota muito rápido. Produtores não conseguem acessar a tempo, é uma burocracia, alguns estados têm licença ambiental, tem que democratizar esse acesso”, reforçou.

No painel de abertura, Geraldo Alckmin foi aplaudido ao falar sobre logística.

“Temos que acelerar a Ferrogrão, vou trabalhar lá no Supremo Tribunal Federal para liberar, que a Ferrogrão é importantíssima para a logística. Integrar modais, ferrovia com hidrovia, integração de modais, crédito, plano safra”, afirmou.

Perguntado sobre quando sairia a licitação, Alckmin respondeu que o tema está com o STF, mas que o governo vai “procurar colaborar para uma boa solução”.

“Eu fiz a BR-163 de carro. É uma epopeia. Então, na realidade, é fundamental a Ferrogrão e a sua chegada até o porto de Miritituba. E aí, com hidrovia, e já ir pelo Arco Norte para o resto do mundo, você reduz muito o custo, você ganha competitividade e renda e ajuda o meio ambiente”, defendeu, ao lembrar que caminhão seria substituído por trem e que as ferrovias não induzem ocupação urbana.

Seguro Rural pode chegar a R$ 4 bi

O secretário de política agrícola do Mapa confirmou que o governo mais uma vez analisa a possibilidade de repassar recursos que hoje são aplicados no Proagro – uma espécie de seguro em dinheiro, paga a pequenos agricultores – para o PSR, Programa de Subvenção de Seguro Rural, o modelo mais amplo que envolve também as seguradoras privadas.

“O modelo do Proagro não está adequado, já hoje existe um sombreamento entre Proagro e seguro rural. Temos que colocar cada vez mais o seguro como um risco para a iniciativa privada, não o risco para o Tesouro”, disse ele.

A CNA solicitou que o Plano Safra garanta R$ 6 bilhões para o PSR. Campos disse que considera factível chegar a R$ 3,5 bi ou até R$ 4 bi, lembrando que o seguro rural (PSR) está em R$ 1 bi “há 10 anos”.

“A ideia é pegar parte do Proagro que é gasto de uma maneira menos produtiva e colocar no seguro rural”.

Entre as possibilidades que o governo estuda está vincular a liberação de crédito com juros controlados à contratação de seguro rural.

Resumo

  • No Congresso da Abramilho, produtores pedem mais crédito e mudanças no Plano Safra, mas o governo sinaliza juros mais altos devido à pressão fiscal
  • Geraldo Alckmin diz que Plano Safra precisa ser maior que o do ano passado e que vai trabalhar junto ao STF para acelerar processo da Ferrogrão
  • Governo estuda ampliar recursos para seguro rural, com possível migração de verbas do Proagro para o PSR