Crucial para a produção agropecuária, a previsão do tempo com antecedência precisão desafia a ciência há séculos. Mesmo com investimentos pesados e aportes de novas tecnologias, os avanços costumam ser lentos e a dificuldade de se olhar mais longe, para o futuro, e com níveis satisfatórios de acerto permanecem.

Ainda hoje, mesmo com a multiplicação de recursos nas áreas de sensores, satélites e supercomputadores, cientistas do clima não conseguiram desenvolver modelos suficientemente confiáveis para prever eventos em intervalos superiores a uma semana.

Por esse motivo, a DeepMind, empresa do Google que desenvolve tecnologias baseadas em Inteligência Artificial, fez um grande alarde, nesta quarta-feira, 4 de dezembro, em torno de um artigo veiculado pela revista Nature, uma das mais respeitadas publicações científicas do mundo.

Batizada de GenCast, a ferramenta foi saudada pelos autores do artigo como uma conquista que “ajuda a abrir o próximo capítulo na previsão do tempo operacional”.

Líder do grupo, o pesquisador sênior da DeepMind, Ilan Price, afirmou que o modelo desenvolvido é muito mais rápido do que os métodos tradicionais. “E é mais preciso”, ele acrescentou.

Essa precisão foi apurada com uma comparação de previsões feitas pela GenCast com alguns dos mais avançados centros meteorológicos do mundo. Para fazer isso, a equipe da DeepMind alimentou a GenCast com um enorme volume de informações meteorológicas de um período de 40 anos, entre 1979 e 2018.

Esses dados foram selecionados com a curadoria do Centro Europeu de Previsões Meteorológicas de Médio Prazo, considerado o líder mundial em previsão atmosférica.

Depois, a ferramenta foi treinada com modelos de IA generativa, que imita como os humanos aprendem e identificando padrões em grandes volumes de montanhas de dados.

Então, os cientistas pediram que ela fizesse a previsão do clima para 2019. E desafiaram , com seu novo programa de IA, o Ensemble Prediction System do centro — serviço utilizado por 35 países para produzir suas próprias previsões meteorológicas.

A equipe comparou como as previsões de 15 dias de ambos os sistemas se saíram na previsão de um conjunto de 1.320 variáveis como velocidades de vento globais, temperaturas e outras características atmosféricas.

Os resultados foram considerados excepcionais por especialistas do mundo todo. Segundo o artigo publicado na Nature, a GenCast superou o “concorrente” em 97,2% por cento das vezes.

Também teve desempenho melhor que outra ferramenta que a DeepMinda havia anunciado no ano passado, que havia conseguido previsões confiáveis para um prazo de 10 dias.

“Estou um pouco relutante em dizer isso, mas é como se tivéssemos feito décadas de melhorias em um ano”, disse Rémi Lam , o cientista que havia liderado o projeto anterior e que é um dos 12 doze coautores do artigo. “Estamos vendo um progresso muito, muito rápido.”

“É um importante passo à frente”, concordou Kerry Emanuel , professor emérito de ciência atmosférica no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), em entrevista ao The New York Times.

Além de conseguir avançar na capacidade de antecipar as previsões confiáveis, outro impacto da tecnologia da GenCast pode ser na redução significativa nos investimentos para se fazer essas previsões.

Atualmente, os principais centros meteorológicos necessitam de supercomputadores, com imensa capacidade de processamento, para rodar modelos matemáticos avançados para análise dos dados climáticos.

O Brasil, por exemplo, está aportando cerca de R$ 200 milhões de reais para colocar em operação. O edital para a aquisição foi lançado em julho passado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que espera substituir os ultrapassados equipamentos atuais por um novo supercomputador com capacidade cinco veses maior.

A abordagem de IA da Gencast, por sua vez, adota uma abordagem radicalmente diferente. A ferramenta da DeepMind roda em máquinas menores e utiliza a capacidade de processamento já existente nos grandes datacenters já existentes para estudar os padrões atmosféricos do passado e, assim, aprender a dinâmica do clima e prever o futuro.