Foi-se o tempo em que as fabricantes de máquinas agrícolas se preocupavam apenas em vender somente tratores, colheitadeiras e outros equipamentos para o uso nas lavouras.

Com a multiplicação das tecnologias embarcadas nas frotas e das próprias necessidades de quem compra e maneja o maquinário no dia-a-dia da fazenda, a conectividade acaba sendo um elo indispensável a todas essas soluções.

Dessa forma, as principais montadoras do segmento se viram empurradas a ampliar a gama de serviços oferecidos e a apresentar aos clientes soluções que as colocam quase como operadoras de conectividade e telecomunicações, levando consigo parceiros especializados.

Maior fabricante nacional do setor, a Jacto Máquinas Agrícolas acaba de reforçar seus passos nessa trilha, por onde já correm também concorrentes multinacionais como John Deere, AGCO e CNH.

A companhia da família Nishimura, sediada em Pompeia (SP), deu os primeiros passos nessa direção em 2021, quando anunciou a criação de uma divisão de negócios chamada Jacto Next, focada na oferta de serviços de agricultura digital dentro das propriedades.

Mais recentemente, há um ano, a Jacto começou a idealizar um serviço de redes privativas 4G, que são exclusivas da propriedade rural, e, em agosto passado, começou a disponibilizá-lo aos primeiros clientes.

A companhia vinha tangenciando o negócio de conectividade há alguns anos, mas passou a avaliar com mais profundidade esse mercado a partir do momento em que estabeleceu parceria com a Nokia para a criação de uma rede 5G privada sem fio, em nível industrial, para sua nova planta industrial, localizada em Pompeia e inaugurada em dezembro de 2023.

“Fomos fazendo uma série de sucessivas aproximações com a tecnologia para entender que ela era o que a gente precisava”, afirma Guilherme Panes, head de agricultura digital da Jacto, ao AgFeed.

Como a Jacto não é – e nem quer ser, segundo Panes – uma telecom, a companhia escolheu a companhia gaúcha Virtueyes como parceira para avançar no negócio de redes privativas. A aproximação entre as empresas começou ainda no ano passado.

Há quase 20 anos no mercado, a Virtueyes tem sede em Novo Hamburgo (RS), possui diversas soluções de conectividade e também é uma operadora móvel virtual (MVNO, que significa, em inglês, Mobile Virtual Network Operator), com contratos como operadoras como Claro, Vivo, TIM e Algar.

“A Virtueyes faz o projeto, a estrutura, a ação física da torre. Nós vendemos, fazemos todo o processo de garantia e toda a verificação”, afirma Panes.

O executivo adianta também que a companhia também está prestes a assinar um contrato com uma operadora de telefonia para incluir também as rede públicas, que podem ser acessadas por qualquer pessoa, em seu serviço de conectividade.

Dessa forma, a Jacto poderá ofertar tanto redes privadas, que são específicas da fazenda, como também redes públicas, que podem ser acessadas por qualquer pessoa. "A gente quer dar para o produtor a melhor opção, e não apenas a opção que a gente tem", afirma Panes.

Ele salienta também que o cliente não precisa ter obrigatoriamente ter adquirido produtos da Jacto – cujas máquinas têm um modem capaz de receber o sinal 4G – para utilizar o serviço.

"Eu posso instrumentar todas as máquinas da John Deere, por exemplo. A conectividade pode estar lá sem você sequer ter uma máquina Jacto", afirma.

A incursão da Jacto nesse novo negócio, no entanto, ainda é tímida. Por enquanto, são apenas dois clientes usando o serviço, ainda em uma fase piloto.

A ideia da empresa da família Nishimura é lançar de fato a solução em fevereiro, durante a edição 2025 da Show Rural Coopavel, no Paraná, uma das maiores feiras de tecnologia agrícola do País, explica Panes.

"Quando eu chegar na Coopavel, já tenho volume de clientes, já tenho o serviço testado, experiência e todo o processo mais refinado. E aí posso falar: ‘Pode ir em frente, que a gente garante’", afirma ele.

Com isso, a Jacto almeja chegar a 100 antenas já implantadas, com foco em atender médios produtores rurais. Cada torre consegue cobrir 5 mil hectares e custa uma média de R$ 127 mil, de acordo com Panes.

O valor dos projetos deve variar em cada propriedade, variando confome a quantidade de hectares. “Nesse negócio, não dá para delimitar o preço sem fazer projeto”, afirma Panes.

O executivo salienta que a divisão, no momento, está mais voltada a validar a tecnologia do que escalar comercialmente o serviço – bem ao estilo da Jacto, que prefere conduzir seus negócios com parcimônia.

“Nós temos uma preocupação muito grande com a marca. A Jacto é muito forte como marca de qualidade”, afirma ele.

"A gente está preocupado em agregar valor ao produtor. Não estou preocupado em fazer 300 antenas neste ano. Às vezes, o pessoal se preocupa muito com o volume. A gente se preocupa com volume e qualidade", acrescenta.

Conectividade ainda é um desafio

Um estudo da consultoria KPMG e da Sociedade de Engenheiros da Mobilidade (SAE BRASIL), realizado no ano passado, apontou que apenas 15% das propriedades rurais no Brasil têm internet de alta qualidade em toda a propriedade e 24% têm bom sinal apenas na sede da fazenda.

A ideia de entrar no negócio das redes privativas veio a partir do entendimento de que a falta de conectividade no campo era um limitador para a Jacto fazer a sua área de soluções digitais crescer, segundo Guilherme Panes.

"Hoje, o cara tem um cabo, uma fibra que fornece internet na fazenda, mas não tem o 4G espalhado para a fazenda. Se ele tivesse o 4G, mesmo que numa condição precária, ele já estaria com conectividade", afirma Panes.

Apesar do sinal ainda engatinhar no meio rural, Panes acredita que o mercado da conectividade está se desenvolvendo somente agora e, por isso, ainda precisa convencer sua relevância par o produtor.

“Você vai em um cara grande, explica e ele diz: ‘Pode fazer’. Quando você explica para o produtor médio, ele fala: ‘Mas o que eu vou ganhar com isso?’”

Por isso, o discurso da Jacto em defesa da conectividade se move pela economia de recursos mais à frente.

“A gente tem certeza que uma administração ativa dos dados pode gerar payback em pouco tempo, porque o produtor economiza combustível, tira problemas de produtividade como, por exemplo, pulverizar duas vezes o mesmo talhão ou ainda pulverizar o talhão errado”, afirma.

As redes privativas não serão o principal negócio da Jacto Next, salienta Panes. A divisão oferece várias soluções como ferramentas digitais que monitoram pragas em tempo real, estações meteorológicas em cada talhão, aplicação localizada de insumos via drone e uma plataforma de gestão on-line das operações das máquinas.

“Só que, sem a conectividade, eu não faço as outras coisas, não consigo seguir evoluindo com o portfólio. Não consigo fazer a armadilha para pragas tirar uma foto e mandar para uma inteligência artificial nossa processar se eu não tiver conectividade, por exemplo”, afirma Panes.

O movimento da Jacto chama a atenção porque a companhia foi uma das criadoras da ConectarAgro, iniciativa de conectividade no campo que virou uma associação, criada em 2020.

Entre os associados, estão a AGCO, dona de marcas como Massey Ferguson, Valtra e Vendt, CNH, fabricante de Case e New Holland, as empresas de tecnologia AWS, da Amazon, e Solinftec, e Nokia e Tim representando o setor de telecomunicações.

A Jacto deixou a ConectarAgro no ano passado. “Nós sempre fomos um grande incentivador do movimento e entendemos que a ConectarAgro é importante ainda. Só que achamos que a nossa contribuição na ConectarAgro terminou, por isso saímos”, afirma Panes.

“Quando a gente saiu, nós falamos: ‘Precisamos fazer alguma coisa. Conectividade é um limitador para a gente para crescer na solução’”, acrescenta.