Quase R$ 40 milhões levantados com investidores, 3,5 bilhões de dados do agro catalogados em um “DataOcean” e um foco em desbravar culturas de fibras, grãos e citrus.
Essa é a equação da agtech Smartbreeder para fazer seu faturamento sair de R$ 20 milhões anotados no ano passado e atingir cerca de R$ 125 milhões em 2030.
Fundada em 2007 por Éder Giglioti, experiente pesquisador com mais de três décadas atuando na cultura da cana-de-açúcar, a empresa desenvolve soluções baseadas em dados para modelar culturas e ajudar produtores a tomarem decisões assertivas.
Na prática, ajuda produtores a usar melhor as tecnologias disponíveis e otimizar o uso de insumos e defensivos, maximizando a produtividade.
Hoje a Smartbreeder afirma atua em 3 milhões de hectares espalhados em 25 mil propriedades e uma cartela de mais de 100 usinas, incluindo Atvos, Raízen, CMAA, BP Bunge, Cofco e Alta Mogiana.
Consolidada no setor sucroenergético, a empresa tem ampliado sua participação nos grãos e fibras, segmento em que começou a oferecer seus serviços há dois anos.
Na sua plataforma, o produtor pode “mergulhar” em um oceano de dados anônimos e, a partir deles, fazer comparações o desempenho do cultivo em duas diferentes áreas, na mesma região ou não. E, dessa forma, extrair conhecimento que pode ser aplicado na sua propriedade.
“Um produtor pode avaliar a eficiência de um produtor X para entender qual pacote tecnológico e qual manejo vai aumentar sua produtividade em um pedaço de terra”, afirma Giglioti.
Outro foco da Smartbreeder para os próximos meses é colocar todos os dados de sua base em uma espécie de Chat GPT do agro. O advento da IA generativa traz os dados de forma mais rápida, massiva e amigável, acredita Giglioti, que também atua como CEO.
“Temos mais de 70 milhões de hectares no Brasil para serem explorados”, diz.
Para aumentar sua exposição a outras culturas e também desenvolver novos serviços, a empresa captou, em abril deste ano, R$ 15 milhões do fundo norte-americano EcoEnterprises.
“Com o último recurso, queremos nos consolidar ainda mais em cana e estabelecer parcerias estratégicas para escalar em outras culturas, além de começar uma internacionalização nos EUA e América Central”, afirmou.
Segundo Giglioti, a empresa está prestes a fechar contrato com um grande grupo agrícola que atua com grãos e fibras. O potencial desse novo mercado é enorme para o CEO, que espera atingir, nos próximos cinco anos, receita superior aos R$ 100 milhões, com um mix de faturamento igualmente dividido entre cana e outras culturas.
No longo prazo, a cana pode até perder mais espaço na receita, projeta o empreendedor. Hoje, outras culturas representam 5% do faturamento. O executivo explica que, para além dos ainda poucos clientes, há muitos projetos pilotos em andamento, em que o preço cobrado não é “cheio”.
Até agora, Éder Giglioti estima que a Smartbreeder já captou entre R$ 30 milhões e R$ 40 milhões. No começo da trajetória, participou de diversos projetos de fomento a startups, com recursos a fundo perdido da Fapesp, Finep e CNPQ.
Em 2018, captou R$ 5 milhões com a KPTL, e em 2022, conseguiu um empréstimo com o banco Voiter, no estilo Venture Debt, um tipo de empréstimo pontual.
Da academia ao mercado
Formado em engenharia agronômica pela Esalq, Giglioti seguiu uma carreira acadêmica por muitos anos. “Tive uma carreira científica desde a metade do curso e, de forma natural, fiz mestrado e doutorado. Atuei por 10 anos na Ufscar (Universidade Federal de São Carlos) e lá tive orientadores com uma visão holística, algo difícil na academia”.
A experiência na universidade o fez criar, junto com outros pesquisadores, a CanaVialis, uma startup focada no melhoramento genético da cana.
A companhia, que tinha participação do Grupo Votorantim, foi vendida, no final dos anos 2000, para a Monsanto. “Foi um dos primeiros grandes cases de venture capital no agro, que foi vendida por mais de 15 vezes o valor investido”.
Ao deixar a CanaVialis, o CEO começou a pensar no futuro e quis apostar novamente no empreendedorismo. Nesse momento ele passou a ter contato com a bioinformática, área que unia a biologia, estatística, matemática e ciência da computação.
Com a ideia na cabeça, procurou uma usina de cana e firmou uma parceria para utilizar a companhia como laboratório. A ideia, na época, era gerar dados modelando a cultura e tentar prever o quanto uma variedade iria crescer, a incidência de doenças e pragas e até a quantidade de açúcar que poderia ser obtido.
“Tentamos modelar fenômenos biológicos, fisiológicos, ecológicos e epidemiológicos para entender a interação do ambiente com as plantas. O ambiente não é só temperatura umidade e chuva, também inclui tipo de solo e espaçamento”, conta.
Nesse momento, que marca o início da Smartbreeder, Giglioti percebeu que havia um oceano a sua frente quando o assunto eram dados no agro.
“Muitos falam que o agro não tem dados, mas na verdade o setor gera muita informação. A dificuldade é organizar, preparar e transformá-los para aplicar uma IA”. Na usina inicial, de 25 mil hectares, foram mais de 2 mil dados captados.
Hoje, a agtech possui 95 funcionários, sendo que são 40 cientistas de dados e 40 agrônomos. Para o CEO, o grande desafio da companhia é transformar as pessoas que tomam as decisões e trabalham na agricultura, dando um “upgrade na cognição humana via IA”.
Ele acredita que os agrônomos formados na universidade atuam como se fossem médicos generalistas, sem se aprofundar em nenhum tema do agro. A tecnologia e a base de dados da Smartbreeder podem, segundo o fundador, transformar esse agrônomo num expert.