Há um movimento inédito em portos brasileiros – e não se trata de mais navios sendo carregados. Eles têm disputado a preferência de investidores e empresas para receberem polpudos investimentos na instalação de unidades de produção de hidrogênio verde, insumo fundamental para a obtenção de amônia verde, depois transformada, entre outras coisas, em fertilizantes.

Segundo um estudo divulgado recentemente pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), existem 20 investimentos já anunciados em projetos de hidrogênio a partir de fontes renováveis no País, totalizando R$ 188,7 bilhões.

Até o final do ano passado, de acordo com o estudo, foram identificados 66 projetos de hidrogênio de baixo carbono em diferentes estágios de desenvolvimento no País. Esses projetos, distribuídos por 13 estados, estão focados em aplicações que vão desde a exportação até o desenvolvimento de tecnologias para a redução de emissões em indústrias tradicionais.

Os dados revelam que o Nordeste, com 44 projetos espalhados por seis estados, é a região mais contemplada até o momento, respondendo por dois terços das iniciativas nacionais.

Ali, destaca-se o o Porto de Pecém, no Ceará, destaca-se como um dos principais destinos para os investimentos próximos anos, com aportes financeiros estimados em R$ 110,6 bilhões.

Ao AgFeed, o superintendente de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo, enfatizou que a localização favorável e o grande potencial de geração de energia renovável são as vantagens competitivas do Estado.

E ações para desenvolver um hub de H2 no Ceará estão sendo semeadas. “Até o momento, foram assinados 34 memorandos de entendimento que já evoluíram para quatro pré-contratos com empresas nacionais e internacionais, para a implantação de projetos”, afirma Bomtempo.

Considerado a “casa” do hidrogênio verde no país, o hub do Ceará foi lançado em fevereiro de 2021 pelo Governo Estadual, em parceria com a Federação das Indústrias do Ceará (FIEC), a Universidade Federal do Ceará (UFC) e o Complexo do Pecém.

Este complexo, por sua vez, é resultado de uma joint venture entre o Governo do Ceará e o Porto de Roterdã, o maior da Europa.

Vista como uma “área promissora”, no curto a médio prazo (3 a 5 anos), a produção de hidrogênio de baixo carbono no Brasil oferece oportunidades significativas de negócios e descarbonização para setores industriais, como os de fertilizantes.

Neste caso, o H2 é o composto principal para a produção de amônia, elemento essencial para a fabricação de fertilizantes. Para se ter uma ideia, anualmente no Brasil, a produção de amônia consome cerca de 145 mil toneladas de hidrogênio, destacando-o como um composto químico com papel crucial na agropecuária e, consequentemente, na garantia da segurança alimentar mundial, já que 70% de sua produção é direcionada para produção de fertilizantes nitrogenados.

“Como o Brasil ainda importa quantidades significativas de fertilizantes nitrogenados, o desenvolvimento da produção interna de amônia, a partir do fomento do mercado de hidrogênio de baixo carbono, pode ser uma oportunidade de o País gerenciar a balança comercial da commodity”, aponta o superintendente da CNI.

Neste movimento, haveria um alinhamento com as metas estabelecidas no Plano Nacional de Fertilizantes 2050, que visa reduzir a dependência de importação de fertilizantes.

Entretanto, há desafios que precisarão ser superados. A falta de um ecossistema robusto de fornecedores, capacitação técnica limitada e a ausência de incentivos fiscais, diferentemente dos subsídios oferecidos na Europa e nos EUA são alguns dos fatores que limitam a competitividade dos projetos brasileiros.

“Mesmo que o governo brasileiro venha a criar incentivos fiscais, dificilmente poderá disputar com os Estados Unidos e a Europa neste quesito”, diz Davi ressaltando a falta de apoio governamental ao mercado de hidrogênio, diferentemente do que aconteceu no lançamento dos mercados de energias eólica e solar.

Estes gargalos podem dificultar o avanço dos projetos no País. Além do porto de Pecém, também se destacam investimentos nos portos de Parnaíba (US$ 4 bilhões); Suape, em Cabo de Santo Agostinho, Pernambuco (US$ 3,8 bilhões); e do Açu, em São João da Barra, no Rio de Janeiro (US$ 3,2 bilhões).

Este último fechou recentemente o primeiro contrato de reserva de área local para a produção de hidrogênio verde. A parceria entre a Prumo Logística, empresa administradora do porto do Açu e a empresa norueguesa Fuella, especializada em energia renovável, visa a geração de cerca de 400 mil toneladas de amônia verde por ano. O destino inicial dessa produção também é a exportação.