O nome Mallika Srinivasan talvez seja pouco familiar para o mercado brasileiro de máquinas agrícolas. Mas é importante prestar atenção nos próximos movimentos dessa executiva indiana de 65 anos.

Ela é neta do fundador e atual CEO da Tractors and Farm Equipment Ltd. (TAFE), a segunda maior fabricante de máquinas agrícolas da Índia – atrás apenas da Mahindra. Mais que isso, tem assento e voz no conselho de administração da montadora AGCO, dona das marcas Massey Ferguson, Valtra e Fendt, entre outras.

Somando suas ações pessoais com as da empresa que comanda, Mallika é hoje a maior acionista da AGCO, com mais de 16% de participação no capital da companhia americana. E, em rota de colisão com os atuais diretores da montadora, decidiu agir para substitui-los.

TAFE e AGCO têm uma relação longa e, nos últimos meses, turbulenta. A empresa indiana foi criada em 1960 por S. Anantharamakrishnan, avô de Mallika e, então, um dos mais prósperos empresários do país asiático.

Ele percebeu, então, que uma transformação começava a acontecer nos campos indianos, até então desprovidos de tecnificação e produtividade. Começava ali um processo de concentração de terras nas mãos de produtores mais dispostos a investir em maquinários e tecnologia e o empreendedor viu uma oportunidade de participar dessa revolução.

Procurou, então, um parceiro para desenvolver uma indústria local de tratores e encontrou a AGCO, que também buscava um caminho para se instalar na Índia. Juntos, formaram a TAFE, que passou a produzir no país os tratores vermelhos com a marca Massey Ferguson.

A parceria envolvia a troca de participações e, assim, a AGCO era sócia da TAFE (ainda possui 21% da empresa) e a TAFE, da AGCO. E prosperou fornecendo ao mercado sobretudo tratores de menor potência, mais adequados ao mercado local – hoje crescendo a uma taxa de 15% ao ano e estimado em mais de 700 mil máquinas anuais, girando mais de U$ 12 bilhões.

As duas empresas fizeram planos juntas, usando a Índia como plataforma para a expansão da Massey para outros países da região e também no continente africano. Atualmente, a TAFE vende mais de 10 mil máquinas por mês.

Mallika assumiu o posto de CEO em 2011, após a morte do pai, Anantharamakrishnan Sivasailam, que havia sucedido o avô. Desde então, era presença certa e destacada nas reuniões do conselho da AGCO, embora nem sempre concordasse com as decisões tomadas lá.

Quatro anos atrás, por exemplo, ela passou a questionar a governança corporativa da AGCO, insistindo, entre outras coisas, que os diretores fossem rotacionados de forma mais regular.

Anos antes, os conselheiros haviam votado uma norma que procurava limitar em 12% a participação da TAFE na companhia. Ao final, as partes chegaram a um acordo, cujas bases não foram reveladas, e Mallika conseguiu atingir os 16% atuais.

Na reunião deste ano, no final de abril, as duas partes celebraram a renovação, por mais um ano, de um acordo de cooperação, no "espírito de investimento estratégico e parceria de longo prazo", que já durava uma década.

Apenas dois dias depois, entretanto, a CEO da TAFE foi surpreendida com um comunicado da AGCO informando o encerramento de uma série de contratos comerciais com a TAFE, inclusive o que permitia à empresa indiana o uso da marca Massey Ferguson em seu país.

Trator da TAFE: a semelhança com a Massey não é mera coincidência

Mallika não hesitou. Imediatamente recorreu a um tribunal indiano, que em três dias lhe deu ganho de causa e suspendeu essa restrição.

Na semana passada, a executiva partiu para o ataque. Protocolou na SEC, a comissão de valores mobiliários americana, um documento – conhecido como formulário 13D – em que informa que atuará, usando um mecanismo chamado “solicitação de consentimento” para reformular o conselho. Disse também que vai explorar opções para a substituições dos diretores da AGCO.

No documento, a TAFE alega que a gestão da montadora, com uma mentalidade focada em aquisições, trouxe prejuízos para as operações e os resultados da empresa.

Entre os negócios vistos com “sérias preocupações” estão a recente venda da área de grãos e proteínas. No ano passado, a AGCO realizou uma das maiores aquisições de sua história, ao adquirir a divisão agrícola da companhia de tecnologia Trimble por US$ 2 bilhões.

O movimento da TAFE gerou uma série de especulações. Isso porque o uso do formulário 13D é uma exigência do mercado para casos em que um investidor fez uma aquisição de ações superior a 5% do capital de uma empresa.

Isso poderia indicar uma tentativa de Mallika de ampliar sua participação ou até fazer uma aquisição hostil da AGCO, segundo especulou o site britânico Agriland, especializado na cobertura do segmento.

Mais provável, entretanto, é que a executiva tenha buscado dar visibilidade à sua posição de maior acionista descontente com a desvalorização de 33% no valor de sua participação em apenas um ano.

Hoje, as ações em seu poder são avaliadas em US$ 1 bilhão, com o valor de mercado da AGCO estimado em US$ 6,5 bilhões.

Na AGCO, a ação de Mallika foi recebida como uma retaliação à decisão tomada pela companhia em abril, de suspender os acordos comerciais entre as duas empresas.

“É decepcionante que pareça que a TAFE agora tenha escolhido responder a uma decisão comercial ameaçando o uso do processo de solicitação de consentimento em uma tentativa de pressionar a AGCO”, afirmou a AGCO em comunicado.

“Substituir os diretores independentes da AGCO por indicados cuidadosamente selecionados pela TAFE serviria apenas para ajudar a priorizar os interesses da TAFE e suas operações acima dos interesses dos outros acionistas da AGCO”.

A novela corporativa, aparentemente, apenas começou. E Mallika Srinivasan quer ser a protagonista.