Uma nova startup americana deve desembarcar no Brasil em um futuro próximo. E vai literalmente aterrissar por aqui.
Trata-se da agtech Funga, que atua na recuperação da biodiversidade fúngica de solos e acaba de ingressar no portfólio de investidas da Positive Ventures, empresa de venture capital com foco em startups de impacto.
A Positive participou da rodada seed da Funga, que levantou, no total, algo em torno de US$ 5 milhões. Além da empresa brasileira, a agtech recebeu investimentos da Trailhead, da Azolla Ventures e da recém-criada Superorganism.
Fábio Kestenbaum, sócio fundador da Positive Ventures, disse ao AgFeed que a empresa viu muito potencial para a Funga atuar por aqui e que, além do investimento, vai fazer a ponte da startup com players de restauração de florestas e grandes empresas interessadas.
“A startup olha para o Brasil como seu principal mercado no futuro, para atuar tanto na agricultura quanto na recuperação de florestas”, afirmou.
Segundo Kestenbaum, a Positive segue assim uma estratégia de investir não só em empresas brasileiras, mas também em startups de outros países que possuem, por aqui, um grande potencial de mercado e de impacto.
“O Brasil possui dois grandes mercados que chamam atenção de empreendedores lá fora, a agricultura e a biotecnologia. Como nosso país tem um potencial enorme para esse tipo de iniciativa, a Positive Ventures tem ganhado espaço nesse tipo de rodadas lá fora”, comentou.
A solução da Funga tem, de acordo com Kestenbaum, aplicabilidades diversas e pode auxiliar na restauração de ecossistemas, de florestas e até de solos agrícolas.
A estratégia para ganhar mercado aqui se inicia pela conversa com potenciais parceiros estratégicos, que podem ajudar a empresa a ganhar a escala esperada. Entre os primeiros contatos já realizados estão a ReGreen e a Belterra, ambas especializadas em processos de recuperação florestal, o que mostra que a empresa deve começar primeiro a atuar junto a esse mercado e apenas num segundo momento em culturas agrícolas.
A Positive Ventures deve ajudar a Funga a se conectar também com companhias brasileiras que possuem compromissos climáticos. Kestenbaum citou a Suzano, que possui milhões de hectares plantados de eucalipto.
“Uma solução que faça esse eucalipto crescer mais rápido ajuda até o core business. Esse tipo de empresa já fornece uma escala quase que instantânea”.
Recuperando o solo
A Funga foi criada em 2021 por Colin Averill, um pesquisador referência na temática de fungos e solos, que fez seu pós-doutorado na Crowther Lab da ETH Zurique, na Suíça, instituição famosa por ter formado Albert Einstein. O fundador atua também como CEO da startup.
A solução desenvolvida é baseada na pesquisa do próprio Averill, que, ao estudar solos e biotecnologia, percebeu que a maioria das iniciativas de recuperação de áreas degradadas enxergava apenas da superfície para a cima.
“Olhamos árvores cortadas e nos preocupamos com isso, mas ao mesmo tempo percebemos pouco o quanto isso prejudica o solo e sua fertilidade. Quando olhamos essa fertilidade, o principal componente da biodiversidade são os fungos”, afirmou Kestenbaum.
Averill pesquisou amostras de solos de diversos biomas ao redor do mundo e sequenciou o DNA dos solos. Com isso em mãos, montou uma grande base de dados e decidiu sair da academia para criar uma solução em cima dessa pesquisa. Foi aí que nasceu a Funga.
Kestenbaum explicou que a agtech vai até áreas degradadas, identifica o perfil de composição de fungos desse solo e, a partir daí, inocula as mudas de plantas com toda cadeia de fungos específicas do bioma inserido.
“A empresa cria um fertilizante natural muito potente e as plantas crescem mais rápido e capturam mais carbono nesse processo”, pontuou o sócio da Positive Ventures.
Segundo dados da própria Funga, as mudas inoculadas com a sua solução crescem 70% mais rápido se comparadas com plantas que não foram inoculadas.
No modelo de negócio, a empresa é dona da propriedade intelectual do inoculante e aciona parceiros regionais para a produção. A Funga é essencialmente uma empresa de tecnologia e, como possui uma base de dados global, pode atuar em qualquer região.
Segundo Kestenbaum, a empresa possui o maior banco de amostras de fungos do planeta. Ele explicou que a empresa tem atuado fazendo testes em algumas culturas e biomas, coletando amostras pequenas para inocular só uma parte das mudas e provar que a solução entrega o crescimento da planta e a captura de carbono mais rápida.
Atualmente, de acordo com Kestenbaum, a Funga tem atuado com produtores de pinus nos Estados Unidos. Mesmo sem cobrar nada no começo da parceria, a startup já assina um termo para dividir a receita dos créditos de carbono gerados com o crescimento das novas árvores.
“No ciclo seguinte, esse produtor já pode contratar a Funga como fornecedor de biofertilizante”, afirmou Fábio Kestenbaum.
Os fundos da Positive Ventures
Kestenbaum afirmou que o negócio da Funga se encaixa perfeitamente no mandato do segundo fundo da Positive. O veículo foi criado em 2022 e finalizou a captação de R$ 125 milhões no ano passado.
A ideia é colocar de 25 a 30 ativos no portfólio, todos voltados para a tese social e climática. Nesse modelo, empresas que atuam com o clima possuem uma atenção especial. “Biodiversidade, carbono, metano, tudo voltado para o clima”, comentou o sócio.
Metade do dinheiro do fundo deve ir para esses ativos e a ideia é que a outra metade seja aportada em empresas que já foram investidas antes. Kestenbaum já vislumbra, inclusive, que a Positive Ventures pode participar da série A da própria Funga, algo que, segundo ele, deve acontecer ainda em 2024.
Até agora, o fundo tem 10 empresas investidas, sendo sete iniciativas voltadas para questões climáticas, uma healthtech, uma edtech e outra voltada para empregabilidade.
“Queremos ser o primeiro cheque institucional de empresas incríveis que combinam bons times, escala, tecnologia de impacto e retorno econômico”, afirmou.
No primeiro fundo, foram R$ 70 milhões aportados em nove empresas, com destaque para a Pachama, startup que usa tecnologia aplicada para geração e monitoramento de créditos de carbono florestais.
A empresa recebeu investimentos da Positive Ventures pela primeira vez em 2021. O fundo repetiu a dose no começo deste ano, quando participou de uma extensão da rodada Série B. Desde a fundação, a Pachama já recebeu US$ 90 milhões em aportes de investidores, que incluem até a Breakthrough Ventures, de Bill Gates.
Antes do primeiro fundo, a Positive fazia investimentos pontuais. Desse período, Kestenbaum destaca a Eureciclo como uma das investidas. A empresa foi uma das pioneiras no mercado de crédito de reciclagem no País e no Chile.
“Como fundo de impacto, estamos preocupados com os mercados de carbono e de restauração de sistemas”.
Andrea Oliveira, também sócia fundadora e que atua como CEO da Positive Ventures, pontuou que a empresa vê na vertical de clima uma possibilidade de associar questões sociais com climáticas.
Ela explica que as investidas voltadas para educação e saúde são de empresas nacionais, pois os empreendedores compreendem melhor a situação desses mercados por aqui.
Já as startups que atuam com mudanças climáticas, geralmente são estrangeiras. “O clima não tem região e o Brasil é o lugar perfeito para dar tração a esse tipo de investimento”, disse ao AgFeed.
Oliveira ainda comentou que tem notado que o posicionamento da Positive Ventures tem gerado um engajamento forte dos investidores. “Eles possuem acesso a grupos de grandes empresas e isso tem ajudado a nossa tese de abrir mercados para startups de fora”, comentou.
Fábio Kestenbaum mencionou que a empresa tem um “grupo especial de investidores”, e garante que eles estão preocupados não apenas com o retorno econômico, e sim com as causas apoiadas pelas startups.
Quando criou o primeiro fundo, por exemplo, a Positive Ventures atraiu investidores como Candido Bracher, ex-CEO do Itaú, e de Luis Stuhlberger, CEO do Verde Asset.