Não deu tempo nem de o cafezinho esfriar. A jovem agfintech Bigtrade marcou o início de 2024 com sua estreia no mercado de capitais com o lançamento de um Fiagro, cujos recursos serão usados para financiar produtores de café. E ainda antes do ano acabar, a startup já planeja uma nova passada pela B3, para uma segunda emissão para aumentar o fundo.

Segundo adiantou o CEO da Bigtrade, Luiz Octavio Braga, ao AgFeed, a empresa deve voltar ao mercado até dezembro para uma nova série de investimentos.

“A Bigtrade é uma empresa que atualmente queima caixa. Fazemos uma rodada e já calculamos um tempo máximo para uma nova captação. Até o final do ano faremos uma nova rodada de captação de equity, para aumentar o tamanho do nosso fundo”, afirmou.

Antes mesmo da primeira batida de martelo na Bolsa para o CAFE11, sigla que identifica seu Fiagro, a empresa captou, ainda em 2023, de R$ 20 milhões em uma rodada do tipo seed.

O valor foi usado para aumentar a equipe e estruturar o fundo, que debutou na semana passada. Na Série A, a empresa ainda não sabe o quanto irá captar, mas o montante servirá para estruturar a nova captação.

Embora estreante, a empresa trouxe consigo na operação nomes já com currículo respeitado, tanto no mercado financeiro quanto no universo do café. Suno Asset Manegement e o grupo Montesanto Tavares, dono de uma das mais tradicionais tradings de café do País, alinharam-se com a fintech.

O Montesanto liderou o investimento seed e a Suno foi responsável pela estruturação do Fiagro, além de participar com 20% do invetsimento no Fiagro. A gestora ficará com o lote das chamadas cotas mezanino e a própria Bigtrade entra com outros 20%, destinados às cotas subordinadas.

Os outros 60% formam o capital a ser negociado na B3, em cotas sêniores a serem distribuídas a investidores qualificados e profissionais. A estrutura foi distribuída dessa forma para diluir riscos, oferecendo ao mercado as cotas com menor exposição.

Com a primeira emissão, o foco da Bigtrade é oferecer crédito a pelo menos 100 produtores com os R$ 50 milhões do fundo, o que traria um ticket médio de R$ 500 mil por cafeicultor.

O valor dessa nova emissão ainda não está definido. Segundo Braga, alguns fatores como a velocidade de alocação, performance do fundo e inadimplência da carteira irão influenciar no valor de mercado da empresa.

“O foco é manter a inadimplência abaixo de 1% com uma alocação pulverizada. Se entregarmos tudo isso, teremos um valor da rodada Serie A alto, mas vai depender desses fatores”, disse o CEO.

A nova captação de recursos também servirá para ampliar o time. Hoje, são pouco mais de 30 funcionários na startup, e a ideia é passar dos 50, com foco em expansão na parte de tecnologia, análise de crédito e time comercial, segundo o executivo.

A nova rodada, e consequente nova emissão do fundo, ainda deve se concentrar nos produtores de café. “O fundo é pequeno pro mercado, e ainda não iremos expandir para outras culturas”.

Para o futuro, em novas séries, Braga já vê grandes chances da Bigtrade ir além do café, e buscar, assim como foi com a Montesanto, um player estratégico de outra cultura.

“Um novo investidor que pode vir a entrar pode nos ajudar a ter novas estratégias de cultura. Mas ainda é cedo para saber se vamos, por exemplo, para a cana-de-açúcar ou para uma soja”, diz.

O mercado de crédito para café é avaliado em R$ 60 bilhões no país, um mar perto da pequena xícara que a Bigtrade atua por enquanto.

Do pré-seed ao CAFE11

Luiz Braga é um empreendedor. Antes de criar a Bigtrade em 2022, atuava em outro negócio que ele mesmo havia criado, a Seteloc, empresa que atuava com terceirização de frotas.

A ideia de empreender veio após alguns anos atuando como engenheiro-civil, área em que ele é formado, na Andrade Gutierrez. Na empreiteira, atuou em diversas obras no Tocantins e na Bahia em ferrovias. No Rio de Janeiro, ele supervisionou operações envolvendo o BRT, sistema de transportes da capital carioca.

Na Seteloc, onde atuou de forma ativa até meados de 2021, quando passou a integrar o conselho, começou a dar os primeiros passos no agro.

A empresa, que segundo ele, já fatura algo em torno de R$ 300 milhões por ano, tem filiais no Mato Grosso, e a atuação é primordial com agricultores. Na Seteloc ele também ficou responsável pela captação de recursos, e chegou a estruturar duas debêntures por lá.

As expertises ganhas ao longo da carreira - tech, agro e finanças, foram decisivas para começar a Bigtrade. Junto com Felipe Espanha e Vinicius Debian, ele deu start no negócio.

A escolha pelo café se deu por uma série de fatores. A primeira, segundo Braga, é regional. “Somos mineiros, e mais da metade da produção de café nacional está em Minas Gerais. Para todo lado que olhamos tem uma plantação”, diz.

Outra questão está relacionada ao risco. A cultura do café, por ser perene, não tem muitos novos entrantes, de acordo com o CEO. “Quem planta, já planta há gerações. Em comparação, a soja tem mais volatilidade, existe muito arrendatário. No café, quem planta tem a própria terra”, comentou.

Diante disso, a ideia também era trazer um sócio estratégico, que entendesse do mercado de café, para colocar a startup nos trilhos.

No começo de 2021, a empresa apresentou seu projeto para a Montesanto Tavares, dona de duas das maiores tradings de café do País, a Atlantica Coffee e da Cafebras, e que, enquanto grupo, tem um faturamento próximo aos R$ 2,5 bilhões.

Além de sócia, a Montesanto tem uma relação mais profunda com a startup. Na originação de produtores para receber o crédito do CAFE11, eles podem ser tanto parte da gama dos mais de 6 mil produtores que fornecem café para a empresa quanto de revendas de insumos. “A operação é triangulada. O produtor paga em café e teremos sempre a trading envolvida”.

O produtor pode ser originado via trading, uma vez que já tem um contrato futuro com ela. No caso do fornecedor de insumos, esse produtor já tem um contrato de uma operação de insumos com revendas a prazo. A Bigtrade paga à vista e ele liquida a operação no armazém da trading.

Entre revendas e indústrias, já são 15 parceiros. O valor que cada produtor pega de crédito pode ir, segundo Braga, 70% para custeio e 30% para capital de giro.

A Bigtrade também é a responsável pela análise de crédito, tanto do produtor quanto da propriedade.

Na startup, pela plataforma própria chamada Agrodesk, os cientistas de dados e a equipe de crédito conseguem analisar bancos de dados de tribunais e do Ibama, por exemplo, e classificam os produtores em um rating. Cada categoria delimita a quantidade de dinheiro a ser emprestada frente a alavancagem do produtor.

Com o crédito aprovado pela empresa, o produtor passa por um comitê, onde a Suno, que estruturou o Fiagro junto com a startup, também opina e pode vetar o crédito.

Além disso, Octaciano Neto, diretor de agronegócio da gestora, foi um dos responsáveis por juntar a Bigtrade com a Montesanto. “Desenvolvemos durante alguns anos a estruturação do CAFE11 e fizemos junto com a Suno após conversar com várias casas, gestoras e securitizadoras”, diz Braga.

Também cabe à Bigtrade monitorar, a cada 60 dias, os produtores, além de fazer as cobranças necessárias. “Toda jornada de crédito é digital e é feita por nós”, conclui.