Há 25 anos o brasileiro Pedro Costa fundou a Ecosecurities, que chegou a ser líder na comercialização de créditos de carbono, com ações negociadas na Bolsa de Londres (começou com um sócio no Reino Unido). A empresa acabou sendo comprada pelo banco americano J.P Morgan, em 2009.
A história de ousadia (e persistência) do empresário não parou por aí. Em 2017, ele e o atual sócio Pablo Fernandez conseguiram retomar o controle da empresa. Atualmente 60% dos acionistas são brasileiros e 40%, britânicos.
Neste longo período muita coisa mudou. Os projetos no começo eram alinhados ao Protocolo de Kyoto, baseados no famoso MDL – Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.
"Fizemos o primeiro projeto de MDL no mundo, de aterro sanitário no Brasil, com a captura do metano gerado a partir dos resíduos e convertido em energia, lá em 1997", contou Pedro Carvalho, head de portfólio da empresa.
Desde então a Ecosecurities já desenvolveu mais de 700 projetos, em mais de 45 países, a maioria ligados a energia renovável, como eólica, solar e, mais recentemente, biogás.
"A empresa sempre esteve exposta ao humor do mercado de carbono, que passou por diversos momentos. Depois de 2015 o mercado mudou, incorporou novas tecnologias, principalmente aqueles baseados em natureza, os NBS (natured-based solutions), que são principalmente projetos de restauração florestal, mas também podem envolver práticas agrícolas", explica o executivo da Ecosecurities.
Historicamente, menos de 10% dos projetos desenvolvidos pela empresa tinham relação com o agro, de alguma forma, mas nos últimos três anos, segundo Carvalho, "com as iniciativas baseadas em natureza, já pode-se dizer que representam mais de 70%".
Hoje a Ecosecurities tem escritórios em 11 países, utilizando metodologias específicas para cada região. Já atendeu companhias como Vale, Raízen e Sumitomo, além de ter feito projetos para o Banco Mundial.
Foram até agora US$ 1 bilhão em investimentos para financiamento climático, com geração de 400 milhões de créditos de carbono. O faturamento em 2022 foi de R$ 50 milhões.
Na opinião de Pedro Carvalho, o agro ter ficado fora do projeto de lei aprovado no Congresso Nacional para regular o mercado de carbono no Brasil "é ótimo para o setor”.
O mercado regulado e as oportunidades para o agro
Até agora, os brasileiros só vinham acessando (e com certa raridade) o chamado mercado voluntário de carbono, aquele em que empresas investem para atingir as suas próprias metas ou obrigações de redução nas emissões de gases causadores do efeito estufa.
Quando o mercado de carbono do País estiver organizado - e não apenas aquele do ambiente das empresas – o próximo passo será regulamentar as exportações de crédito de carbono.
"Se o agro estivesse no projeto, ele teria a obrigação de descarbonizar e, por isso, ficaria impedido de gerar o crédito de carbono e vender ao setor", explicou o executivo.
Ele diz que no segmento de energia eólica, por exemplo, também se discute este problema. Os créditos gerados por estes agentes não podem ser vendidos para o setor elétrico, que tem suas obrigações.
A principal vantagem de se avançar no mercado regulado é a expectativa de que haja uma recuperação no preço que é pago pela tonelada de CO2 equivalente.
Carvalho lembrou que, na época dos projetos guiados pelo protocolo de Kyoto, europeus e japoneses compravam os créditos, majoritariamente, e a base era as licenças de poluição estabelecidas pelos países. "Se a licença era US$ 30 por tonelada, era possível vender o crédito por US$ 25", recorda.
No modelo atual, do mercado voluntário, a grande maioria dos projetos está na faixa de US$ 10 por tonelada de CO2 equivalente. “Só conheço um projeto que chegou a US$ 30, no Paquistão", ressalta Carvalho.
Com o avanço das discussões mundialmente, que reforçam a compensação de inventário por país e não por companhia, o fundador da Ecosecurities diz que tem visto “um grande potencial de escalar este mercado, com preços mais interessantes, acima de US$ 20 e quem sabe chegará aos US$ 100".
Na visão do executivo, portanto, as maiores oportunidades daqui para frente tendem a vir de novos projetos alinhados com metas domésticas, as NDCs, metas do Brasil dentro do Acordo de Paris.
Outro ponto levantado por Pedro Carvalho é que, no mercado voluntário, o projeto precisa ter toda uma narrativa, com ganhos evidentes em temas como biodiversidade e impactos sociais na comunidade, para que alcance preços acima da média. "Lá quem decide são as áreas de marketing e sustentabilidade”, diz.
Já quando o regulado estiver operando, será uma decisão do departamento financeiro, porque vai se tratar também de uma questão de oportunidade econômica.
"A grande oportunidade virá nos regulados, inclusive para o agro, mas trabalhar desde agora é importante porque houver o tiro de partida da corrida, você já tem que estar aquecido para vencer a maratona”, destacou Carvalho.
Custo ainda é desafio
No cenário atual, projetos que envolvem a mudança de práticas agrícolas, que tragam menor emissão de carbono, por exemplo, os compradores atuais pagam entre US$ 10 e US$ 12 por tonelada de carbono, segundo a Ecosecurities.
Enquanto isso, se considerado todo o trabalho de registro, auditoria e, principalmente, monitoramento das áreas, o custo estimado fica entre US$ 25 e US$ 30.
"Claro que já temos conversado com empresas de tecnologia, é possível usar laser e drones para monitorar, mas ainda é muito caro. Outra alternativa é amostra de solo para medir o carbono, mas também demanda muitas análises, o que fica caro", afirmou Carvalho.
O executivo, porém, garante que está otimista com os próximos 5 anos. "O agro brasileiro nessa cadeira de potencialmente fornecedor de crédito vai ajudar a escalar o mercado, assim o custo da tecnologia baixa e fica viável."
A expectativa é de que também haja uma recuperação gradual dos preços quando o mercado ganhar mais volume e viabilidade. Isso porque com o mercado doméstico regulado, haverá a possibilidade de exportar créditos de carbono, o que vai interferir nos preços, em função da decisão do custo e oportunidade. “Alguns países até limitam a exportação de créditos", explicou.
Metas agro da Ecosecurities
Uma das principais metas da Ecosecurities no mercado brasileiro é viabilizar o reflorestamento de 56 mil hectares até 2030. Um projeto piloto, de 500 hectares, já foi iniciado no estado de Mato Grosso, com a participação de investidores.
Em paralelo, deverá ampliar uma iniciativa já feita com cooperativas do Paraná para produzir biogás a partir dos dejetos de suínos e uso de biodigestores.
O projeto chamado Kuré começou por Toledo, no oeste do estado, em que a Ambicoop, cooperativa de produtores rurais será detentora da maior parte dos créditos de carbono.
A previsão é de que esta unidade possa tratar 345 mil metros cúbicos de dejetos, sendo evitada a liberação de mais de 7,5 milhões de metros cúbicos de metano para o ambiente. Com isso, seriam gerados cerca de 50 mil créditos de carbono por ano.
"Nosso objetivo era de que 4% do rebanho brasileiro tivesse de alguma forma utilizando biogás como fonte de energia, até 2027, mas ainda estamos revisando esta meta, porque estamos percebendo o mercado está um passo atrás, muitos ainda nem conhecem o biogás”, afirmou Barbara Muniz Soares, responsável pela área comercial da Ecosecurities no Brasil.
Outro plano para o Brasil é replicar por aqui um projeto que a Ecosecurities está desenvolvendo na Argentina e no Paraguai, chamado "Carbono Rural”. A base é o pastejo rotacionado que gera retenção de carbono ao adotar determinados tratamentos e fazer crescer o capim.