Um dos maiores grupos do agronegócio argentino e maior produtor de soja e milho do país, o grupo Los Grobo anunciou em comunicado à Comissão Nacional de Valores (CNV) daquele país que não irá cumprir com o pagamento de notas de dívidas que irão vencer até 31 de março de 2025, em um total de US$ 10 milhões, o equivalente a R$ 61,9 milhões.

O anúncio foi feito na última sexta-feira, 27 de dezembro, em carta assinada por Julieta Gioia, executiva responsável pelas relações com o mercado do grupo. No texto, ela afirma que a Los Grobo Agropecuária, uma das empresas do grupo, não cumpriu com o pagamento de uma nota promissória no valor de US$ 100 mil (R$ 610 mil), vencida em 26 de dezembro.

Atualmente, a companhia tem 90% de seus negócios controlados pelo fundo Victoria Capital Partners (VCP) e 10% pelo empresário Gustavo Grobocopatel, ex-CEO e fundador da companhia que no passado foi considerado o "rei da soja” na Argentina.

Após o anúncio do calote, Grobocopatel, um dos mais influentes nomes do agro no continente, apressou-se em se distanciar da decisão da companhia. “Há oito anos sou sócio minoritário e estou fora da empresa", afirmou, em entrevista à imprensa argentina.

Os negócios do Grupo Los Grobo estão divididos em três frentes: produção de grãos, originação e comercialização de grãos e comercialização de insumos, este último feito pela Agrofina.

A companhia atribuiu a situação “à crescente falta de liquidez no mercado de papel comercial para emissores agrícolas, somada à impossibilidade de cobrança de certos créditos em favor da empresa e as dificuldades financeiras de uma companhia relacionada".

Outra nota com teor semelhante, também assinada por Gioia, foi enviada ao mercado no mesmo dia, desta vez para anunciar que a Agrofina S.A, da mesma forma, não conseguirá cumprir com o pagamento de notas dentro dos prazos de vencimento, especialmente uma fatura vencida no valor de 400.000.000 de pesos, o equivalente a R$ 2,4 milhões de reais.

Entre os fatores que contribuíram para o cenário, segundo a nota, estão “fatores financeiros e agronômicos, como a retração na venda de insumos, comprometendo o fluxo tanto dos fabricantes como dos distribuidores”.

O anúncio do Los Grobo acontece semanas depois de outro grande grupo do agronegócio argentino anunciar dificuldades para o cumprimento de seus pagamentos.

A Surcos, empresa produtora e distribuidora de insumos, que planejava entrar no mercado brasileiro, anunciou calote de mais de US$ 13 milhões a fornecedores.

Com o novo caso, aumentaram os temores de um contágio sistêmico no agronegócio argentino, que atravessou duas safras de perdas significativas por conta de questões climáticas, além de sofrer com os problemas da crise econômica no país.

Los Grobo queria ser gigante no Brasil

Em um passado nem tão distante, no final da primeira década desse século, o grupo Los Grobo chegou a ser o maior produtor de grãos da América do Sul, ultrapassando o grupo Maggi e a SLC Agrícola, mas esse período parece ter ficado para trás.

Atualmente a SLC cultiva cerca de 733 mil hectares, enquanto o grupo Amaggi possui mais de 362 mil hectares plantados, volume superior aos 260 mil hectares do grupo de Gustavo Grobocopatel.

A estratégia de negócios do grupo incluía um modelo de parceria com produtores, que poderiam atuar como arrendatários, fornecedores de grãos, clientes para compra de insumos ou até mesmo sócios. Com isso, Grobocopatel se tornou o rei da soja sem sequer possuir um hectare de terra.

Outra parte da estratégia incluía a expansão acelerada no mercado brasileiro. Para tanto, o grupo se associou à brasileira Vinci Partners para criar uma subsidiária. Em 2008, o grupo adquiriu participação na Selecta Sementes e na Ceagro, empresa produtora e comercializadora de grãos e sementes.

No ano safra 2011/12, a companhia chegou a anunciar que o faturamento do grupo ultrapassaria US$ 1 bilhão, boa parte graças aos negócios no Brasil, com 40% das vendas feitas no mercado brasileiro.

Em 2013, o grupo vendeu sua participação na Ceagro - atualmente Agrex do Brasil - para o grupo Mitsubishi e ficou apenas com o moinho Jundiaí, único empreendimento que ainda operava em solo brasileiro.

As menções ao negócio no interior de São Paulo ainda podem ser encontradas no website da companhia, mas ao buscar por mais detalhes, a página leva o visitante até um mapa onde consta a localização de um único moinho de farinha do grupo em Chivilcoy, na Argentina. Segundo o site da companhia, o grupo tem capacidade para processar 420 toneladas diárias de farinha.

Nos anos subsequentes, o lucro líquido da companhia no Brasil chegou a R$ 1,235 milhão, mas em 2014 os negócios registraram queda de 25% no lucro, chegando a R$ 919 milhões. Entre os fatores atribuídos pelo grupo para a queda no desempenho estavam os altos custos operacionais e tributários do mercado brasileiro.

De lá para cá, o grupo Los Grobo, que além do Brasil teve negócios no Paraguai e Uruguai, deixou esses países discretamente para concentrar seus negócios apenas na Argentina.

Atualmente a companhia tem 715 funcionários em 37 filiais, 28 armazéns de agroinsumos, 15 plantas de acondicionamento de grãos com 340 mil toneladas de capacidade e 6 fábricas para processamento de sementes.

Com 38 anos de existência, o Los Grobo armazena cerca de 2,2 milhões de toneladas de grãos ao ano em 15 plantas de acondicionamento de grãos. Em 2023 o faturamento foi de US$ 800 milhões, com uma dívida de US$ 150 milhões.