A 3tentos tem motivos para estar orgulhosa. Enquanto outras empresas do setor de revendas sofreram com as dificuldades no campo, algumas até ficando pelo caminho, envoltas em dívidas e processos judiciais, a empresa da família Dumoncel seguiu registrando bons resultados ao longo de 2024.

Mas os números positivos vistos durante o ano - o mais recente deles foi um lucro líquido de R$ 318,4 milhões no terceiro trimestre de 2024, com expansão de 46% – não deixaram os gaúchos da 3tentos de nariz em pé. Muito pelo contrário.

"Acima de tudo, somos uma empresa humilde, no sentido de saber que tem muito o que melhorar sempre", resumiu João Marcelo Dumoncel, COO da empresa, no evento 3tentos Day, que reuniu analistas, investidores e jornalistas, nesta quinta-feira, em São Paulo.

Com diversas frentes de negócio, a 3tentos trabalha com a comercialização de grãos e de farelo de soja, vende insumos e também tem industrias de esmagamento da oleaginosa e de produção de biodiesel.

Nos próximos anos, a 3tentos tem planos para avançar “além da soja”, apostando no processamento de milho e de sorgo em Mato Grosso para a produção de etanol e da canola no Rio Grande do Sul para fabricar biodiesel.

A ideia é aproveitar dinâmicas parecidas nos dois estados. Apesar do clima diferente entre si, Rio Grande do Sul e Mato Grosso compartilham de um problema semelhante: os dois estados possuem áreas ociosas que podem ser ocupadas com o cultivo de culturas alternativas às mais tradicionais.

Dessa forma, a 3tentos otimiza seu processo produtivo, para que as plantas não fiquem dependentes de uma só matéria-prima.

“Estamos agregando dois novos cultivos na cadeia completa, estamos fazendo o fomento, trazer a tecnologia, fornecer insumos, receber a produção do agricultor e industrializar a produção”, disse João Marcelo Dumoncel, COO da empresa.

Os projetos fazem parte de um plano de R$ 2 bilhões anunciado em janeiro ano e com previsão de ser executado até 2030.

O principal aporte programado envolve a instalação de uma usina de etanol de milho e sorgo, que está sendo construída na cidade de Porto Alegre do Norte (MT), no Vale do Araguaia, e deve entrar em operação no início de 2026.

A planta terá capacidade de processar milho e sorgo, com capacidade de produção de 1.223 metros cúbicos de etanol por dia, 798 toneladas de DDGs – o subproduto da produção de etanol - por dia e 50 toneladas de óleo por dia.

Nesta semana, a 3tentos anunciou que iria elevar o custo do projeto dos R$ 1 bilhão orçados originalmente para R$ 1,16 bilhão, com o aumento da quantidade de milho a ser processada, passando de 2,1 mil toneladas por dia para 2,8 mil toneladas por dia.

A ideia é trabalhar com um blend de matérias-primas na produção de etanol, com 20% de sorgo e 80% de milho.

Luiz Osório Dumoncel, CEO da 3tentos, explica que o interesse da companhia em apostar no sorgo tem a ver com a janela de plantio mais apertada para os milhos de alta tecnologia na segunda safra.

“Com isso, entra o sorgo, que entra produzindo talvez menos, mas numa área que não seria plantada, não seria aproveitada”, afirma.

De grão em grão, o sorgo tem abocanhado fatias de terra no Brasil no período recente. No ano passado, foram produzidas 4,2 milhões de toneladas de sorgo, alta de 47,2% em relação a 2022, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com o avanço do sorgo, as indústrias de etanol começam a captar essa tendência. Além da 3tentos, a Inpasa anunciou, em setembro, que iria construir uma usina de etanol em Luís Eduardo Magalhães (BA), com capacidade de processar 1 milhão de toneladas de grãos como milho e sorgo.

Biomassa

Como a nova usina vai consumir 900 toneladas da matéria orgânica por dia, volume bem mais alto que o consumido pela usina de biodiesel da companhia localizada em Vera (MT), de 100 toneladas/dia, a 3tentos também está fazendo investimentos em biomassa.

"A biomassa é uma preocupação de primeira ordem - não só para nós, mas para toda a indústria de etanol de milho", afirma João Marcelo Dumoncel, COO da empresa.

A ideia é fomentar 27 mil hectares para silvicultura em um raio de 100 quilômetros a partir da usina de Porto Alegre do Norte.

Para obter esse montante, a 3tentos vai adotar diferentes estratégias, segundo Dumoncel.

A empresa poderá arrendar áreas de plantio de eucalipto, para executar diretamente ou terceirizar a operação, ou ainda incentivar os agricultores a plantarem eucalipto em áreas inadequadas ao plantio de soja e milho, onde há declive mais acentuado ou o solo mais arenoso, comprando matéria-prima antecipada.

Outra opção é trabalhar com fundos florestais que fazem toda a operação e entregam a biomassa pronta ao cliente. Essas três formas de obtenção vão caminhar paralelamente.

O plantio em áreas arrendadas já começou. Já o fomento aos agricultores deve iniciar no ano que vem e as negociações com fundos florestais ainda estão sendo fechadas

“O maior capex é o que a gente planta, o do agricultor é praticamente nenhum e o do fundo florestal não tem nada”, afirma Dumoncel.

Canola gaúcha

No Rio Grande do Sul, a 3tentos quer introduzir o processamento de canola em sua usina de biodiesel localizada em Ijuí a partir do ano que vem. Com isso, a produção dessa unidade vai passar de 850 mil litros/dia para 1,5 milhão de litros/dia ao longo de 2025.

A ideia da 3tentos é aproveitar o potencial de áreas ociosas no território gaúcho para diversificar a obtenção de matéria-primas no biodiesel.

No verão, os produtores gaúchos plantam soja – cuja produção, inclusive, deve ser recorde nesta safra, alcançando a marca de 20,34 milhões de toneladas, segundo o levantamento mais recente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Depois da colheita da oleaginosa, porém, os agricultores gaúchos ficam restritos às culturas de inverno, especialmente o trigo, e preferem não se arriscar diante dos desafios de produtividade e de escoamento do cereal.

A canola pode ser uma alternativa promissora para o produtor gaúcho, segundo Luiz Osório Dumoncel, CEO da 3tentos.

A companhia acredita que a cultura, cujo plantio ocorre entre abril e junho e a colheita em outubro, pode se tornar uma opção viável para os agricultores da região.

"A canola não se desenvolveu até hoje no Rio Grande do Sul porque não tinha uma planta como a da 3tentos que demandava esse óleo", afirmou ao AgFeed.

Com a canola, a 3tentos vai conseguir extrair mais óleo em comparação com a soja. "É um grão que vai nos trazer 43% de óleo na extração dele. Da soja se extrai, na média, 18% a 19%, e a 3tentos consegue 20% a 21%", explicou.

A conversão de processo produtivo é simples, com um investimento “não relevante”, segundo o CEO da companhia. “Precisa de apenas 24 horas para mudar de uma para outra cultura. É tipo limpar a linha para já estar produzindo com a outra cultura”, afirma.

A companhia já está fazendo contratos barter de canola para o plantio do próximo inverno, segundo Dumoncel. Ele acredita que o interesse do produtor em plantar a oleaginosa deve acontecer de forma natural.

"Ter um mercado se movimentando e nós talvez ajudando como liderança para implementar uma nova cultura, é uma renda que cai como uma luva para o agricultor”, afirma ele.

Ele salienta que a companhia está trabalhando no desenvolvimento de conhecimento sobre como trabalhar com a canola e com o sorgo. "Isso vai trazer para o agricultor informações sobre uma cultura relativamente nova", afirma Dumoncel.

O movimento da 3tentos chama a atenção pelo fato de a companhia preferir apostar na canola – e não no trigo para incrementar sua produção.

No Rio Grande do Sul, outras companhias como Be8 e CB Bioenergia estão erguendo fábricas para a produção de etanol a partir de culturas de inverno. “Achamos totalmente viável o trigo, mas na canola, vemos o desenvolvimento maior”, afirma Dumoncel.

A ideia da 3tentos não é incentivar uma redução de área do trigo em detrimento da canola, segundo o CEO da companhia gaúcha.

“Indicamos a canola como rotação. O trigo é positivo no primeiro, segundo ano, mas no terceiro ano já é mais afetada em termos de produtividade e de sensibilidade a doenças”, afirma.