A exemplo do que acontece com outros grãos, o feijão passa por um momento complicado nesta virada de 2023 para 2024. Os preços subiram e os produtores enfrentam quebras de safra por conta da oscilação entre ondas de calor intenso e fortes chuvas.

Esse cenário afeta diretamente a Kicaldo, uma das maiores cerealistas do País e única empresa processadora de feijão que tem atuação nacional. Por isso, seu fundador e CEO, Mauro Bortolanza, afirmou ao AgFeed que tem colocado em prática novas estratégias para manter o ritmo de crescimento, dependendo cada vez menos do seu principal produto.

“Hoje, o feijão responde por cerca de 90% das nossas vendas. Temos uma meta de dobrar a participação dos outros produtos nesse total, chegando a 20%”, diz Bortolanza, que fundou a empresa há mais de 25 anos, com a primeira fábrica localizada em São Paulo.

A decisão, afirma, leva em conta o maior valor agregado destes outros produtos, mas também uma questão logística. “Nós já temos que levar o feijão até os varejistas. Então, podemos “pegar uma carona” para levar outros itens”.

A estrutura de logística da Kicaldo é praticamente toda própria. “Só usamos serviços de terceiros eventualmente, quando há uma demanda muito grande”, diz.

Ele ressalta que a ideia não é diminuir o volume de venda de feijão, mas aumentar “o tamanho da pizza e dividir melhor entre os produtos que temos”.

Em seu portfólio, a Kicaldo tem feijões de vários tipos, farinha de mandioca, tapioca, derivados do milho, inclusive para pipoca, e outros grãos como lentilha, ervilha e grão-de-bico.

“Nós vamos lançar pelo menos um novo produto este ano. Essa é uma outra meta que temos, realizar pelo menos um lançamento por ano”, diz Bortolanza.

A Kicaldo fechou o ano passado com um crescimento de 10% no volume de vendas e faturamento de R$ 1,2 bilhão. A expectativa é de aumento de 8% nas vendas para 2024.

Para ajudar nesse objetivo, a empresa anunciou recentemente um investimento de R$ 45 milhões em um nova fábrica localizada em Feira de Santana, na Bahia.

“Já temos uma unidade lá, que tem mais de 20 anos de funcionamento. Ela será desativada, e a nova unidade vai operar no mesmo espaço”, diz o CEO da companhia. O início da operação da nova fábrica está previsto para o segundo semestre deste ano.

Feijão “reformado”

Para Bortolanza, o grande problema provocado pelas instabilidades climáticas é a queda de qualidade dos grãos de feijão que chegam para serem processados.

“Com uma qualidade menor, temos que utilizar mais as máquinas para que o consumidor final tenha acesso a um bom produto. Isso acaba elevando nossos custos de processamento”, diz o executivo.

Ele afirma que não consegue estabelecer de forma precisa qual o nível de quebra de safra de feijão. “Nós temos uma noção porque estamos sempre conversando com os produtores. Mas não consigo dizer um número”.

Segundo o Instituto Brasileiro de Feijões e Pulses (Ibrafe), a quebra na primeira safra – cuja colheita ocorre entre os meses de dezembro e fevereiro – pode chegar a 25% em relação ao mesmo período no anterior, com uma produção inferior a 800 mil toneladas para uma demanda superior a 875 mil.

Com isso, os preços, que já estavam em alta no segundo semestre de 2023, vêm o movimento de alta se intensificando neste começo de 2024. “Devemos sair de um patamar de R$ 6 o quilo, no final do ano passado, para algo entre R$ 9 e R$ 10 nesse primeiro semestre”, projeta Bortolanza.

Mesmo com essa elevação, o CEO da Kicaldo afirma que o feijão continua sendo um item muito barato entre aqueles mais básicos da alimentação do brasileiro. “O pior momento foi em 2016, quando o quilo chegou a custar até R$ 16”, lembra.

O feijão do tipo carioca tem um ciclo curto de produção, de 90 dias. Em contrapartida, segundo explica Bortolanza, é um grão que não suporta muito tempo de estocagem. Por isso, o preço para o consumidor é muito sensível às condições de produção.

A Kicaldo também importa feijão, principalmente o preto, também bastante popular entre os consumidores brasileiros.

“No segundo semestre, compramos feijão preto da Argentina. Nesse caso, não estamos enfrentando problemas. Durante o primeiro semestre, compramos de produtores da Região Sul”.

No longo prazo, reduzir a tendência do produto também pode ser uma necessidade em função da mudança de hábitos dos brasileiros. Segundo o relatório Projeções para o Agronegócio, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), a tendência é de queda de 3,4% no consumo do grão na próxima década.

O IBGE já vinha identificando essa tendência há algum tempo e apontou, em outro relatório, uma queda de 18% nas vendas de feijão no país nos últimos dez anos.