Engenheiro elétrico de formação, Paulo Sérgio Rangel Filho tem boa parte de sua trajetória vinculada ao agronegócio. Mais particularmente ao etanol de milho.
Ao longo da última década, ele esteve à frente de projetos emblemáticos do setor, sempre associado a alguns grandes nomes do setor. Como diretor de Novos Negócios da Ethanol Holding, liderada pelo agropecuarista Otaviano Pivetta – um dos pesos pesados do setor e atual vice-governador do Mato Grosso – Rangel atuou na implantação de uma das primeiras usinas para a produção do biocombustível, em Nova Mutum, posteriormente vendida para a Inpasa. E, mais recentemente, em outra planta em Porto Alegre do Norte, também no Mato Grosso.
Nos últimos meses, Rangel tem se dedicado a um passo mais ousado, agora mais ao Sul, no estado de Goiás, e como sócio da empreitada. Ele é o executivo encarregado de colocar de pé duas novas usinas de etanol de milho, que terão a bandeira da Planalto Bioenergia, empresa que tem como acionistas grandes produtores rurais do Centro-Oeste, entre eles Marcos da Rosa, ex-presidente da Aprosoja Brasil.
Os projetos devem receber investimentos de R$ 1,8 bilhão, somando as plantas a serem erguidas nos municípios de Formosa e Cristalina, dois dos principais polos goianos na produção de grãos.
Ambos já têm licenças prévias e a expectativaestão em fase final de licenciamento e devem, segundo Rangel, correr em paralelo, com previsão de operação em 2026.
Com licenças prévias nas mãos, o grupo já começou a trabalhar na preparação dos dois locais escolhidos. A expectativa de Rangel é de que as licenças definitivas saiam ainda neste semestre, permitindo o início das obras em 2025.
“Estimamos um prazo de 18 meses para que fiquem prontas”, revela Rangel ao AgFeed. “Pode ser até um pouco menos, essa é uma estimativa conservadora. Em Nova Mutum, por exemplo, foram 11 meses, tudo muito rápido”.
Foram quase três anos de espera para poder dar essa notícia. A Planalto Bioenergia vem estruturando seus projetos desde 2021 e chegou, nesse período, a analisar 10 possíveis locais para a implantação de usinas.
Nesse período, os sócios chegaram a conversar com potenciais investidores para voos mais ousados, com mais plantas, mas acabou se concentrando, em uma primeira fase, em duas frentes.
“O grupo optou pelos dois melhores sites”, diz Rangel. “Então iniciamos o desenvolvimento dos projetos, com e projeto básico de engenharia e licenciamentos ambiental e regulatório”.
“As duas plantas estão sendo licenciadas com prazo pequeno de diferença entre elas, então a ideia é que uma acabe sendo ‘startada’ em sequência da outra”.
Cada unidade deve ter, segundo o executivo, capacidade para moer, em uma primeira fase, 1,5 mil toneladas diárias de milho, que resultaria na produção anual de 200 milhões de litros etanol e 140 mil toneladas de DDGS, concentrado sólido de proteína vegetal utilizado em nutrição animal e hoje um produto valorizado tanto no mercado nacional quanto para exportação.
Além disso, permitiria a extração de 9 mil toneladas anuais de óleo de milho e a geração de 36,8 mil megawatts/hora ao ano de energia.
Segundo Rangel, as usinas já são projetadas com a perspectiva de ter a sua produção dobrada em poucos anos, Além disso, a tecnologia empregada permitirá a moagem de sorgo, grão que vem ganhando espaço nas lavouras brasileiras nos últimos anos.
“Essa é uma decisão estratégica. A prioridade é o milho, porque a gente ainda tem que entender o quão consistente a cultura do sorgo vai estar no futuro para garantir a operação”, afirma Rangel.
Localização estratégica
Na escolha das duas localizações pesaram fatores como a oferta de grãos e biomassa – as usinas dependem de energia, geralmente obtida através da queima de eucalipto plantado especificamente para esse fim – e dos incentivos estaduais para a instalação de projetos como esse.
Segundo o executivo, os dois municípios, além de estarem em regiões que ainda não possuem empreendimentos para a produção de etanol de milho, atendem a ambas as condições.
“Ali há vocação para criar novos ciclos de biomassa. E tem a experiência de produtores que acabaram investindo no passado. E o segundo ponto, o milho, sem dúvida, já que o estado é grande produtor”.
Rangel afirma que os benefícios fiscais oferecidos para a cadeia de biocombustíveis foram decisivos. “O estado de Goiás é muito moderno nessa área”, avalia.
“Então, a gente fechou um tripé, além de ter uma logística muito boa, já que estamos literalmente no centro do País, com opção, por exemplo, para atender Arco Norte, de exportação saindo pelo Nordeste, pelo Norte, enquanto Cristalina está olhando um pouco mais para o centro de consumo pesado, que é o Sudeste”.
Quando as obras efetivamente começarem, as primeiras instalações devem ser dedicadas à armazenagem. Segundo Rangel, essas estruturas são fundamentais para que a empresa comece a originar os grãos que serão moídos quando a indústria estiver efetivamente concluída.
Em paralelo a essa fase inicial, Rangel e os sócios da Planalto devem avançar na estruturação financeira que dará suporte ao projeto. “A gente está, nesse momento, avaliando algumas opções de financiamento, que é sempre dependente de termos as licenças definitivas”, afirma. “Apesar de a gente iniciar a negociação agora, o ok vem sempre com a emissão da licença de instalação”.
Rangel diz já ter conversas avançadas para a composição de garantias e de seguros para apresentação de garantias, além de orçamentos com empresas para a execução das obras. “Algumas dessas empresas já trazem junto os financiamentos”, diz.
De olho no combustível do futuro
O plano de negócios da Planalto prevê a diversificação de fontes de receita. “O segredo do negócio do etanol de milho é o equilíbrio que o DDGS e o óleo fazem. Então eles não são subprodutos, eu considero produtos mesmo”, diz Rangel.
Segundo o executivo, esse equilíbrio se dá com a compensação, por parte do DDGS e do óleo, das possíveis variações de preços do etanol, commodity com cotações mais voláteis.
Ele aposta em uma abertura cada vez maior de mercados externos para esses produtos, que já possuem demanda interna forte, com maior consumo pelo rebanho bovino, mas também pela avicultura e a suinocultura. O mercado de DDG, afirma, vem crescendo acima de 20% ao ano no país.
Rangel também avalia que o timing de lançamento do projeto deve ajudar, coincidindo com a aprovação pelo Congresso do projeto de lei do “Combustível do Futuro”, de incentivo à produção dos biocombustíveis.
“Será um ponto de inflexão para o mercado de etanol como um todo”, diz. “E particularmente para o etanol de milho, por ser sustentável, de baixo carbono, de baixo impacto”, analisa.
A Planalto está atenta, por exemplo, às oportunidades no fornecimento de etanol para a produção de combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês).
“Tudo está bem detalhado com relação à tecnologia que a gente vai adotar para literalmente ter uma elegibilidade que atenda os padrões para produzir etanol de baixo carbono para ser reprocessado em SAF”.
Nessa área está, segundo Rangel, um dos principais diferenciais que a Planalto pretende introduzir no segmento, que é a associação da energia fotovoltaica às usinas de etanol, de milho. A tecnologia que a empresa pretende adotar é chamada de CSP (Concentrated Solar Power), que utiliza uma torre central cercada de espelhos.
A tecnologia já é usada em grandes projetos nos Estados Unidos, na Espanha e na China, mas é inédita no Brasil, segundo Rangel, e seria utilizada em uma segunda fase do empreendimento, como forma de gerar economia no uso de biomassa para geração de energia e, assim, reduzir a pegada de carbono da operação.