No mercado de capitais, a queda nos números de arrecadação de uma empresa nem sempre é penalizada por analistas de corretoras e bancos. Algumas vezes, as ações de empresas até sobem, a despeito da redução da receita. Tudo depende, é claro, do ponto de vista.
Foi o que aconteceu, no segundo trimestre de 2023, com as três empresas do ramo de papel e celulose listadas na B3 - Irani, Klabin e Suzano. Elas acabaram vendendo seus produtos por um valor menor do que aconteceu no mesmo período do ano anterior.
Assim, seus balanços trimestrais, divulgados esta semana, apontaram queda nas receitas. Em contrapartida, os lucros vieram estáveis ou até melhores que em 2022, surpreendendo positivamente.
Na Irani, que divulgou seu balanço do período na segunda-feira, 31 de julho, enquanto o lucro ficou em R$ 228 milhões, 170% maior que no ano anterior, a receita líquida atingiu R$ 394,4 milhões, 8% menor que no mesmo período de 2022.
A Klabin, por sua vez, divulgou o balanço no dia seguinte, com cenário semelhante. A companhia fechou o segundo trimestre com um lucro líquido de R$ 971 milhões, estável na base anual. Já a receita, que foi de R$ 4,29 bilhões, veio 15% menor frente ao mesmo período do ano passado.
Por fim, a Suzano, maior empresa do segmento, revelou na quarta-feira que teve um aumento de 27 vezes no lucro e uma queda de 20% nas receitas. Em números, o lucro veio em R$ 5 bilhões e a receita, em R$ 9,1 bilhões.
As reduções das receitas das três companhias têm dois motivos principais. O primeiro está relacionado ao dólar. Se no segundo trimestre do ano passado o dólar ficou em R$ 5,15 na média, neste ano rodou os R$ 4,84.
Essa queda impacta as receitas das companhias diretamente, pois grande parte do volume produzido é exportado. Na Suzano, por exemplo, que tem a operação mais robusta das três, foram vendidas 2,3 milhões de toneladas de celulose para o mercado externo, e somente 172 mil toneladas no Brasil durante o período.
No caso da Klabin, outro ponto prejudicou a arrecadação. Gabriel Bassotto, analista-chefe de ações da casa de análise Simpla Club, relembrou que os resultados da Klabin nos segundos trimestres são historicamente menores que nos outros, por conta das paradas programadas para manutenção nas fábricas, que a empresa costuma fazer nesse momento do ano.
O preço da celulose no mercado externo também impactou as receitas. A Suzano, por exemplo, citou no seu balanço que o preço médio líquido de celulose no mercado externo foi de US$ 562 por tonelada, valor 23% menor que no mesmo período em 2022.
Números acima do esperado
Mas como o setor conseguiu diminuir a arrecadação sem afetar o lucro? O motivo de cada uma é distinto.
A Irani, por exemplo, diz em seu balanço que o crescimento do lucro “está relacionado principalmente ao reconhecimento de crédito de PIS e COFINS sobre aquisições de aparas, objeto de trânsito em julgado de decisão favorável à companhia, que reconheceu o direito ao crédito”.
O lucro operacional medido pelo Ebitda (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação), que é geralmente o indicador mais olhado pelo mercado, da Irani veio em R$ 117 milhões, 19% abaixo do que no ano anterior mas 17% acima do que esperava a XP.
Em relatório, o analista da corretora, Lucas Laghi, destacou uma resiliência dos preços de papel ondulado como ponto positivo dos números da Irani.
Já na Klabin, o momento pouco aquecido do mercado externo fez a empresa vender um pouco mais no mercado interno, algo que colaborou para o lucro não cair. No segundo trimestre de 2023, a participação nacional no volume de vendas foi de 59%, enquanto que no mesmo momento em 2022 foi de 53%.
“O resultado final ficou abaixo das expectativas do mercado, mas nada preocupante. Do lado positivo, vejo uma resiliência do modelo de negócio da companhia que aproveita quando o mercado está mais retraído. Enquanto a celulose teve queda, as embalagens tiveram saldo positivo”, destacou Bassoto, da Simpla Club.
Na Suzano,por sua vez, na mesma medida que a queda do dólar atrapalhou as vendas, acabou aliviando a dívida da empresa, que também está exposta na moeda americana.
Analista da Genial Investimentos, Igor Guedes pontuou em relatório que a política de hedge cambial da empresa ajudou o lucro líquido.
“Por conta de ações que a empresa tomou no mercado de capitais, comprando e vendendo posições, e uma dívida captada de cerca de 85% em dólar, a Suzano teve alguns efeitos positivos tramitando pelo resultado financeiro, e que ajudaram a anular parcialmente o efeito negativo da entrega operacional”, comentou Guedes.