Na manhã desta quarta-feira, 7 de fevereiro, André Savino madrugou no estande da Syngenta no Show Rural Coopavel, uma das principais feiras de tecnologia agrícola do País, em Cascavel (PR).
Ali, durante todo o dia, ele tinha uma agenda repleta de reuniões e conversas com produtores rurais e dirigentes de empresas e cooperativas da região, além da equipe de campo da própria Syngenta.

Essa tem sido parte importante de sua rotina desde o início do ano, quando assumiu o posto de presidente do negócio de Proteção de Cultivos no Brasil. “Tenho rodado bastante, visitando feiras, falado com clientes”, disse Savino ao AgFeed em um de seus primeiros compromissos do dia.

Na entrevista, a primeira exclusiva que concedeu desde a promoção, o executivo deixou claro que será essa a marca de sua gestão. “Sou obcecado em ir para o campo e é isso que temos que fazer cada vez mais”, diz. “Quero todos os níveis no campo”

Agrônomo formado pela Unesp, ele fez carreira de 26 anos na multinacional de insumos controlada pela ChemChina “com a a bota no chão”, como costuma dizer.

Começou como assistente técnico, foi representante de vendas e escalou na hierarquia interna sempre em posições próximas ao campo. Seu jeito de falar é simples, de fácil compreensão, como convém para quem precisa dialogar com o produtor rural.

E é essa proximidade, acredita, que pode ajudar a Syngenta a superar um ano que, na sua visão, “não será fácil”.

“Vamos viver o rebote de 2023”, prevê Savino. “Não devemos ter ajustes tão severos, mas teremos um cenário de agricultores apertados e desafios climáticos, além de outros elementos externos que podem afetar os negócios agrícolas”.

Não é pequeno o desafio que Savino recebe. Assim como as outras indústrias de defensivos, a Syngenta viu sua receita encolher significativamente no ano passado, quando o mercado de distribuição foi pego por uma desaceleração nas vendas de insumos em um momento em que estava abarrotado de estoques.

Com isso, a retração foi inevitável. Segundo dados preliminares do painel das indústrias do setor, citados por Savino, o setor deve registrar um encolhimento de 25% nas vendas em 2023 quando comparado a 2022 – US$ 15 bilhões, contra US$ 20 bilhões no ano anterior.

A Syngenta, diz ele, sofreu o impacto “na primeira linha do balanço”, mas preparou-se desde o início do ano para fazer os ajustes que seria necessários para “passar pela turbulência”.

“Para nós não foi uma surpresa. Entramos em 2023 com uma agenda mais austera. Quando a gente vê que vai chover, corre para fechar a janela”.

Foi inevitável que algumas gotas de chuva manchassem o balanço da companhia. Em novembro passado, na divulgação dos resultados globais do terceiro trimestre de 2023, a retração dos negócios no Brasil foi citada diversas vezes para explicar a redução de vendas e de margens registradas no período.

Na ocasião, o comunicado que acompanhou o balanço dizia que a empresa foi “significativamente impactada pela piora dos mercados no Brasil, depois dos recordes registrados em 2022”. No balanço, as vendas globais no terceiro trimestre caíram 13%, para US$ 6,8 bilhões e o Ebitda fechou o período em US$ 300 milhões, ante US$ 1 bilhão no ano anterior.

Por isso, outra parte importante da rotina de Savino tem sido alinhar expectativas e diretrizes com o comando global. Experiente, ele diz que não se assusta com o solavanco do mercado e que já atravessou outros períodos difíceis, provocados por diferentes fatores, como crises cambiais e de suprimentos, além de movimentos cíclicos da agricultura.

Destaca, ainda, que os ajustes feitos ao longo do ano – como redução de custos em viagens internacionais e participação em eventos, além de adiamento de investimentos não essenciais – surtiram os efeitos desejados.

“Não tivemos nenhum movimento de downsizing, com cortes de equipes ou de projetos”, ressalta. “Tivemos, é claro, de fazer escolhas e adiar projetos, mas sem que isso trouxesse impacto no nosso foco no cliente”.

Segundo Savino, uma das prioridades do ano passado foi trabalhar junto à rede de distribuição de seus produtos para evitar, justamente, que houvesse algum problema no ponto de contato mais próximo do agricultor.

“Nossos distribuidores continuam fortes, não tiveram as dificuldades que outras redes apresentaram”, garante.

A Syngenta distribui seus produtos através de um modelo diferente de outras indústrias químicas. Nos últimos anos, através de aquisições, montou uma rede própria, hoje com cerca de 80 lojas, reunidas em torno da unidade de negócios Synap.

Outros 200 distribuidores independentes atuam de forma “semi-exclusiva”, dando preferência aos produtos da companhia. “Eles representam a Syngenta no campo, tem a nossa marca na prateleira mais alta”, diz Savino.

E, não menos importante, as cooperativas, com enorme poder de relacionamento com dezenas de milhares de agricultores.

Na entrevista, Savino ressaltou várias vezes a importância do relacionamento com os canais externos, assumindo um discurso mais flexível do que o head de proteção de cultivos para a América do Sul, Juan Pablo Llobet, usou em entrevista ao AgFeed em maio passado.

Na ocasião, Llobet, que então acumulava a posição de presidente no Brasil, foi enfático na defesa do modelo de investimento em canais próprios. “Operamos de forma completa, não precisamos de plataformas adicionais”, disse, na época.

Savino, que liderava a Synap até sua nomeação para o comando de toda a área de proteção de cultivos, defende uma estratégia mais equilibrada, vendo importância na rede própria – “para ocupar bolsões em que não tínhamos distribuição ou havia gaps de acesso” – , mas também valorizando outras revendas e as cooperativas.

Segundo uma fonte do setor ouvida pelo AgFeed, a estratégia de “voo solo” que vinha sendo implementada chegou a provocar algumas reações de cooperativas parceiras junto à direção da empresa.

O novo presidente também não acredita em processo de consolidação no mercado de distribuição. Para ele, a formação de grandes grupos nesse segmento é uma realidade, mas dificilmente terão grande concentração do mercado nas mãos.

“O mercado é muito grande e muito complexo. Exige muita escala e as cooperativas têm papel muito forte e capilaridade, entendem muito bem o produtor”, diz. “Elas responderam às transformações do setor com crescimento verticalizado nos negócios e expansão geográfica”.

Assim, Savino afirma que a Syngenta não tem, no momento, “agenda de aquisições” no setor, a não ser que apareça alguma oportunidade “muito pontual”.

Eficiência e lançamentos

O executivo prefere falar em “estratégia de ecossistema” e diz que a ideia é crescer “de forma harmoniosa” com outros canais. Na formação desse ecossistema, a Syngenta também já havia dado passos em outras direções, como a de soluções financeiras, com a criação da Syde, uma agfintech voltada a levar serviços de crédito a produtores, em que atuam instituições parceiras, e a Cropwise, plataforma global da Syngenta que promove ferramentas de agricultura digital.

Savino diz que vai manter esse direcionamento, mas que o foco principal nos próximos meses será aumentar a eficiência das operações atuais. “Vai ganhar o jogo que fizer o básico perfeito”.

Em algumas áreas, como o lançamento de produtos, a ordem é até “acelerar”. “Este ano vamos lançar mais tecnologias disruptivas do que em qualquer outro anterior”, prometeu.

Segundo ele, a Syngenta costuma apresentar cinco novos produtos por ano. No Show Rural Coopavel, por exemplo, a empresa está demonstrando pelas novas classes de químicos mais avançados, como inseticidas derivados do princípio ativo Plinazolin, além de novos produtos ainda em fase de registro, como o Tymirium, molécula fungicida e nematicida que está em fase de registro e é destinada ao tratamento de sementes e aplicação no solo, e Rizoliq inoculante líquido de longa vida para o pré-tratamento de sementes da soja do mercado brasileiro.

Para a empresa, as novas tecnologias, anunciadas como mais modernas, eficientes e sustentáveis para o produtor, que permitem também obter melhores margens e manter o posicionamento de líder da empresa no mercado brasileiro.

De acordo com Savino, números preliminares da indústria de insumos indicam que a empresa tem hoje entre 23,5% e 24% de market share, colocando-a a mais de 8 pontos percentuais à frente do segundo colocado.