São José do Rio Claro (MT) - Com 645 mil hectares, o grupo Bom Futuro tem a segunda maior área cultivada entre as empresas brasileiras de produção agrícola, chegando quase a um empate técnico com a líder nesse quesito, a SLC Agrícola, com declarados 654 mil.

Dessa imensidão plantada, a companhia liderada pela família do megaprodutor Eraí Maggi Scheffer colhe, por safra, uma média de 1,3 milhão de toneladas de soja e 300 mil toneladas de pluma de algodão.

Na cola da agricultura, porém, a Bom Futuro tem se consolidado também como a dona de um dos maiores projetos de pecuária do País. Quando se fala da produção no sistema de integração lavoura-pecuária (ILP), que começou há cerca de 20 anos, é referência global.

Hoje, são, em média, 42 mil hectares dedicados exclusivamente a esse modelo de produção, com capacidade estática para 150 mil bovinos e a comercialização anual entre 105 mil e 110 mil cabeças por ano.

É uma aposta que vem dando certo e que só não é maior por conta da falta de apetite dos compradores. “É o mercado quem vai dizer a escala de abate”, afirmou Nahzir Okde Junior, gerente administrativo parcerias agrícolas da Bom Futuro, ao AgFeed.

“No curto prazo, a estabilidade é necessária porque há algumas dificuldades no estado do Mato Grosso, como o número de plantas habilitadas para a exportação para o mercado europeu e a China. Não adiantaria aumentar os abates, já que a gente não receberia as cotas para exportação”.

Okde foi o anfitrião em uma visita feita por jornalistas na Fazenda Agromar, em São José do Rio Claro, no Mato Grosso, a 320 quilômetros de Cuiabá. Ali, enquanto espera o momento de ampliar a produção, a equipe da Bom Futuro tem uma missão.

Depois de produzir a primeira soja totalmente de forma rastreada do País, o objetivo é melhorar o desempenho por animal nas áreas de ILP, onde hoje a empresa já obtém índices de produtividade acima da média nacional.

Nas propriedades da empresa, o abate acontece entre 22 meses e 24 meses de vida do animal, cerca de metade do tempo médio registrado no País, que é de 48 meses.

A taxa de lotação, por sua vez, chega a 5,5 animais por hectare, contra 0,89 animal por hectare na média nacional. E a produtividade é de 23 arrobas por animal, ante 20 arrobas.

Além do ganho ambiental, uma vez que os animais acabam emitindo menos metano, também há um ganho financeiro: “Isso tudo vai gerar, no fim, receita a mais, melhorando o potencial produtivo da minha próxima cultura”, afirma

A produção é feita no sistema consorciado: primeiro, a soja é colhida entre janeiro e o começo de fevereiro, dando lugar ao milho, plantado junto com a braquiária, espécie forrageira que serve de alimento para o gado.

Os animais entram em cena quando o milho é colhido – e saem quando chega a época de plantio de soja, a partir de setembro, e o ciclo se completa.

“Quando o ciclo da soja é mais longo, de 120 dias, e não se consegue implantar o milho, já vai o capim logo depois da soja”, afirma Okde Junior.

Além de alimentar os animais, o plantio de cobertura serve também para nutrir a terra e diminuir a temperatura do solo.

Em um dia muito seco e quente, com temperatura acima dos 40ºC e fumaça vinda das queimadas no estado, o AgFeed esteve na Fazenda Agromar e pode ver como o sistema faz a diferença em condições climáticas hostis.

A reportagem fez (literalmente) o teste de fogo enquanto circulava pela fazenda: ao colocar a mão sobre o solo sem nenhum tipo de cobertura, a terra estava muito quente, enquanto que a faixa coberta com braquiária parecia mais amena.

“(Com isso), eu estou melhorando a minha estrutura de solo, vou gastar menos para produzir a minha próxima safra”, diz Okde Junior.

Volumes

Das 35 propriedades que Bom Futuro possui em Mato Grosso, 20 têm produção pecuária e estão distribuídas por todas as regiões do estado.

A Bom Futuro atua em todo o ciclo do sistema produtivo de gado, passando pela cria, recria e engorda.

Menos de 10% da atividade está destinada à cria. “A fase de cria é pequeninha dentro do nosso negócio. A recria e a engorda são efetivamente as grandes partes”, diz Okde Junior.

O tamanho do rebanho vem crescendo nos últimos anos. Hoje, são 151.312 cabeças de gado, volume que havia recuado, na pandemia, a 116.494 cabeças em 2020.

O abate também diminuiu no período da pandemia, passando de 97.501 em 2020 para 80.592 cabeças em 2022, mas apresentou recuperação no ano passado, quando saltou para 103.827 cabeças de gado. Até agosto deste ano, haviam sido abatidas 75.419 cabeças.

A média anual tem sido de 104 mil cabeças abatidas anualmente. “Como o abate de 2024 ainda para terminar, provavelmente esse número vai ser maior”, diz Okde Junior.

Investimentos em bem-estar animal também têm sido feitos. Na Agromar, a Bom Futuro está aportando R$ 3,8 milhões em uma estrutura de confinamento coberta, adaptando o modelo de confinamento do gado leiteiro para a produção dos bovinos de corte, que deve ficar pronta em breve.

“É um “hotel cinco estrelas” para o gado”, define Okde Junior.

A Bom Futuro conta com sete fábricas espalhadas por suas propriedades, que produzem 780 toneladas/dias de ração. Somente de milho, são 35 mil hectares cultivados para atender a demanda dos animais, segundo Okde Júnior, além de subprodutos da produção de algodão, como a torta e o caroço.

“O animal que está com a gestão de bem-estar animal adequada vai ser mais produtivo, vai ter uma entrega melhor”, afirma Okde Junior. “Isso inclui sombreamento, água potável e em abundância, estruturas de curral, com modelos antiestresse, ração adequada e em qualidade”, lista ele.

Rastreio da produção

Com dez fazendas de engorda habilitadas para vender à Europa – e a entrada em vigor da Lei Antidesmatamento se aproximando cada vez mais – há pouco mais de um ano e meio, em fevereiro do ano passado a Bom Futuro começou a fazer o rastreamento de suas cabeças de gado.

Antes de a compra ser feita, os produtores que fornecem bezerros à empresa passam por uma série de análises feitas pelo departamento de meio ambiente da empresa.

Utilizando ferramentas digitais de verificação, a Bom Futuro cruza dados de diferentes fontes para aferir se o gado não veio de áreas desmatadas ou de propriedades com problemas sociais.

A lista de fontes é longa: Cadastro Ambiental Rural, o CAR, Guia de Trânsito Animal, listagens de áreas embargadas feitas pelo governo federal e de secretarias estaduais de Mato Grosso e Rondônia, bases de dados sobre desmatamento como o Prodes e o Mapbiomas, a Lista Suja de Trabalho Escravo, a Moratória da Soja, o Protocolo Verde de Grãos e o projeto Amazônia Protege, do MPF.

“Hoje para fazer qualquer negócio com a Bom Futuro, o CAR é submetido à análise. Se deu a conformidade do CAR, conferimos o perímetro da propriedade, fechamos com os dados do faturamento da nota fiscal e da GTA, e o negócio é amarrado – ou nem sempre”, explica Okde Júnior.

Assim que entra na propriedade, o animal recebe um brinco do Sistema Brasileiro de Identificação Individual de Bovinos e Búfalos (Sisbov). "Ou seja, nós vamos conseguir ver a origem externa dele e, dentro da estrutura da Bom Futuro, vamos ver por onde ele passou no rastro de vida dele, até ir para o frigorífico", afirma Okde Júnior.

A necessidade de verificação traz duas realidades, na avaliação do gerente de parcerias da Bom Futuro.

“Por um lado, isso é bom porque você vai forçar o outro a se legalizar. Mas, por outro lado, também é ruim, porque você vai abrir um mercado em que quem não está correto vai comprar – e você não vai conseguir competir com ele lá na ponta, depois. Mas entendemos que tudo isso vai se equalizar.”

O repórter viajou a convite da JBS.