Por enquanto são apenas três pessoas. Um time pequeno para o tamanho da ambição da New Holland, uma das gigantes do mercado global de máquinas agrícolas. Mas adequado para dar o primeiro passo em um plano sem precedentes na indústria.
Os três engenheiros formam a ponta de lança de um projeto da marca, pertencente ao grupo CNH, para ir além de vender tratores, colheitadeiras e outros equipamentos.
“Estamos atuando agora em segmentos para que o próprio agricultor produza seu próprio combustível e com tenha completa independência energética”, afirmou, ao AgFeed, Eduardo Kerbauy, vice-presidente da New Holland Agriculture para a América Latina.
Cabe ao trio ficar cara a cara com os produtores identificados como potenciais compradores da ideia e do que vem junto com ela: trocar as máquinas a diesel por novas, movidas a biocombustíveis produzidas na sua própria fazenda.
“Agora em julho eles começam as visitas, para entender o que o produtor precisa fazer para estar tecnicamente pronto para o próximo passo”, diz Kerbauy.
Antes de a equipe entrar em campo no Brasil, no entanto, um esforço global movimentou equipes em várias áreas da New Holland.
A estratégia foi pensada para ser a vitrine de um novo posicionamento da empresa. “Queremos ser identificados como uma marca dedicada à energia limpa. E isso não é de hoje. Temos uma história por trás e seguimos cada vez mais fortes”, afirma o executivo.
Prova disso foi a aquisição, em março passado, do controle da companhia inglesa Bennamann, especializada em soluções para a captura, redirecionamento e armazenamento de emissões de metano para uso energético. Em outras palavras, projetos para a produção de biometano nas propriedades rurais.
Não por acaso, menos de dois meses depois, durante a Agrishow, a New Holland anunciou a venda do primeiro trator movido a biometano no Brasil, o modelo T6 Methane Power.
Aparentemente isolada, a ação deu a ignição para a máquina da empresa se movesse. Além de atender à demanda surgida na feira, os times comerciais da marca iniciaram um trabalho ativo de rastrear os produtores que já estão mais próximos da migração dos combustíveis fósseis para novas fontes, sobretudo com biodigestores para transformar resíduos da produção agrícola em biometano.
“Temos identificado quais são os produtores que têm a instalação pronta”, conta Kerbauy. “E também temos de identificar aqueles produtores que faltam só um pulinho para chegar lá”.
O time de ataque entra em cena quando esse produtor demonstra interesse. São eles os responsáveis pela análise técnica dos equipamentos que o produtor já possui e do investimento ainda necessário para se tornar autossuficiente em biocombustível.
É papel deles também mostrar que produzir biogás não é coisa só para grandes produtores. Hoje, de fato, a maior parte dos investimentos nessa área estão concentrados em produção em escala industrial.
Nesse ponto, a New Holland pensa pequeno. “O que a gente quer é popularizar, mostrar que não precisa de milhões para entrar nesse jogo”, afirma Kerbauy.
Em alguns casos, as estruturas já estão montadas, mas o grau de pureza do gás obtido no biodigestor é impróprio para o uso nas máquinas. Em outras, falta apenas um equipamento específico para o abastecimento.
“A gente tem que buscar uma tecnologia aqui para um pequeno e médio produtor através do seu biodigestor, que não precisa ser gigante, para que ele consiga ter estrutura de armazenamento, na escala certa para a propriedade dele”.
A Bennamann atua exatamente nessa frente. Além dela, a New Holland tem buscado firmar parcerias com empresas especializadas na instalação de sistemas de produção de biogás, através da Abiogás, associação do setor.
Os 225 concessionários da marca no Brasil também foram incluídos na estratégia. Como a venda é essencialmente técnica, eles farão apenas o primeiro contato, encaminhando o cliente interessado ao time de engenheiros da New Holland.
A novidade foi apresentada nas últimas semanas também na Argentina. A empresa enxerga potencial no país vizinho, onde o uso de biodigestores também tem se popularizado nos últimos anos.
Aposta da marca, o novo trator movido a biometano foi a estrela da New Holland na AgroActiva, uma das principais feiras agropecuárias do país, realizada em Santa Fé, e depois apresentado a produtores e jornalistas locais em um evento em Rosário.
A venda da primeira unidade no Brasil foi destacada lá como “um marco na nossa história”, diz o vice-presidente da empresa. “A gente ainda não se deu conta de como isso é revolucionário. Talvez não seja a coisa mais fashion que tem por aí. O pessoal gosta muito de falar de elétrico, não é? A gente fala muito de crédito de carbono, do hidrogênio verde, e às vezes está esquecendo ali daquelas coisas que estão bem perto da gente”.
Mercado estacionado
Enquanto o novo projeto começa a rodar, a máquina convencional da New Holland opera em um terreno mais acidentado do que o de anos anteriores.
Eduardo Kerbauy afirma que mantém um olhar positivo para as vendas, apesar do soluço sentido pelo setor no primeiro semestre, como consequência da queda do valor das principais commodities agrícolas.
“Quando você olha as contas para a próxima safra, aquilo que começar a ser plantado agora em setembro, vê que as contas fecham”, afirma. “Então isso é um mal estar temporário e a gente espera terminar o ano com um nível igual a lei de 2022”.
O ponto animador vem do anúncio, pelo governo federal, dos recursos disponíveis para o Plano Safra 2023/2024. Para ele, o programa que baliza o crédito rural no País veio “em linha com a nossa expectativa, dá um alento em termos de previsibilidade”.
Kerbauy destacou sobretudo a inclusão de parte dos recursos para uma linha de crédito em dólar e, sobretudo, o incentivo maior ao financiamento de pequenos e médios agricultores.
A New Holland tem máquinas para todos os segmentos e portes de propriedades rurais, mas um dos seus mercados mais forte é nos tratores de baixa potência, até 100 cavalos, que atendem justamente a esse perfil.
“É uma oportunidade a mais que a gente tem para explorar esse mercado de tratores aqui no mercado brasileiro”, afirma. “Agora, se me pergunta se isso é o suficiente para termos um recorde de vendas, vou te dizer uma maneira bem transparente que não. Mas é necessário”.
A New Holland não divulga números locais, seja de receita ou de faturamento, mas como todas as outras grandes fabricantes tem o Brasil como um de seus três principais mercados. Um terço das 8 mil colheitadeiras fabricadas anualmente fica aqui. E mais de 10% dos 150 mil tratores são produzidos no Brasil.
Com três fábricas no País, Kerbauy afirma que a empresa está preparada para absorver novos ciclos de crescimento, assim como o ritmo de lançamentos previstos para os próximos anos. “Serão 50, globalmente, até 2025”, diz.
Nem todos eles chegarão à América Latina. Na região, explica, o foco maior estará justamente em tecnologias acessíveis a produtores de menor porte. “Vamos falar mais da inclusão digital do produtor rural”, afirma. “Trazer, por exemplo, mais tecnologia para tratores de uma calagem mais baixa”.