Depois de três safras de preços em alta, a vida do agricultor brasileiro anda bem mais difícil nesta temporada, com atrasos na compra de insumos, na esperança de uma melhor relação de troca. O problema é que nem sempre isso vira realidade.

Os preços dos fertilizantes, por exemplo, que caíram de forma significativa ao longo do primeiro semestre, interromperam esta trajetória. Com isso, apesar da leve melhora nas cotações de soja e milho, a relação de troca vem piorando.

Dados da Argus Media, empresa internacional especializada em preços de commodities, mostram que a melhor relação de troca para quem produz milho em Rondonópolis (MT), por exemplo, ocorreu em 30 de março deste ano.

Naquele momento, eram necessárias 40,6 sacas de milho para comprar uma tonelada de ureia, fertilizante nitrogenado altamente consumido nas lavouras do grão.

Agora, na última semana de setembro, esta relação ficou em 64,3 sacas de milho por tonelada do fertilizante.

O preço do cereal até mostrou leve recuperação no último mês, já que o fundo do poço foi em agosto. Porém, a tonelada de ureia, que chegava nos portos brasileiros no fim de março a US$ 310, agora está em US$ 395.

"A tendência segue de preços firmes para a ureia ou até de leve alta, porque a Índia e o Brasil são os mercados que mais influenciam os preços do produto”, explicou a especialista em fertilizantes da Argus Media, Renata Cardarelli.

Do lado indiano, espera-se que nas próximas semanas seja lançado um leilão para a compra do fertilizante, o que costuma ser um balizador para os preços internacionais.

No último leilão que realizou, a Índia só conseguiu comprar 525 mil toneladas de um total esperado de quase 1,5 milhão de toneladas. Por isso, segundo Cardarelli, espera-se que a demanda ainda venha forte por parte dos indianos, um fator que pressiona para cima os preços.

Enquanto isso, do lado brasileiro o que influencia o preço dos fertilizantes é o ritmo lento nas vendas para o plantio da segunda safra de milho.

As encomendas não foram feitas no primeiro semestre e o resultado foi uma queda 12% nas importações brasileiras de ureia de janeiro a agosto, na comparação com o mesmo período do ao passado, segundo dados do Global Trade Tracker, fonte usada pela Argus em suas análises.

A exceção nesta queda das importações foram os fosfatados, fertilizantes mais usados na soja, que é plantada antes e que terá mais uma vez acréscimo na área cultivada em 2023/2024.

]O cenário de atraso nas vendas para a “safrinha” de milho preocupa grandes indústrias como mostrou o AgFeed em reportagens recentes com players como a Mosaic e a Galvani Fertilizantes. Além de pagar mais caro, o produto poderá chegar na fazenda em cima da hora do plantio.

A especialista da Argus confirma que há uma reação nas importações em setembro e prevê que, no mês outubro, o volume suba 45% em relação ao mesmo período do ano passado, chegando a 862.000 t, ante 595.516 t recebidas um ano antes, segundo dados de lineup.

Ela alerta, no entanto, que esta alta concentração nos últimos meses do ano traz outro fator de alta para os preços, que é custo logístico mais caro, tanto nos portos, que receberão mais produto de forma concentrada quanto no frete rodoviário, que leva o adubo até a lavoura.

Os números já mostram isso. O indicador da Argus para frete de adubos na rota Paranaguá-Rondonópolis ficou em R$318/t no fim de setembro, em meio à intensificação das entregas para a safra de soja 2023/2024. No início de junho estava em R$190/t, por conta da fraca demanda.

A expectativa dos analistas é de que o frete também se mantenha em preços firmes porque é um momento de disputa por caminhões para escoar a safra brasileira de grãos.

As vendas de nitrogenados para produtores de milho em Mato Grosso estão em 55%, segundo a analista, enquanto no ano passado, nesta mesma época do ano, 70% já havia sido comercializado.

Os analistas acreditam que o agricultor pode sim ter "perdido o bonde”, ou seja, que a melhor relação de troca para o milho já tenha ficado para trás.

O único fator que poderia mudar o jogo agora seria uma melhora nos preços do milho, que compensariam o fertilizante mais caro. Mas, por enquanto, as principais consultorias de mercado não vêm mostrando previsões de alta significativa para o cereal, que deve novamente ter uma safra cheia em 2023/2024.

Algumas previsões têm indicado leve queda para a área plantada de milho, o que, teoricamente, poderia reduzir a demanda pelo adubo e representar fator de baixa nos preços.

Mas a analista da Argus lembra que, de outro lado, a segunda safra de algodão deve crescer, uma cultura que demanda até mais nitrogenado do que o milho, o que ainda manteria o mercado equilibrado.